Coluna Café por Convidados Especiais

Do campo à xícara, profissionais convidados refletem sobre o setor

A Covid-19 e o café

O termo “novo normal” tem sido utilizado com frequência para descrever o mundo que emergirá da pandemia de Covid-19. Trata-se de uma expressão que, embora inspirada por uma ambição de abarcar um sem número de transformações, falha ao fazê-lo. Afinal, o “normal” nunca é estável. São tantas as possíveis fontes de perturbação do “normal” – ciclos econômicos, realinhamentos geopolíticos, mudanças ambientais, emergência de novas preferências – que a transformação não chega a ser uma exceção, mas sim a regra.

Isso não significa que qualquer mudança derive dos mesmos mecanismos ou gere consequências de magnitude idêntica. Eventos como a pandemia de Covid-19 possuem um alto potencial disruptivo. Em outras palavras, podem afetar uma série de aspectos de nossa vida em um curto período. Ainda assim, o principal desafio diante de qualquer analista é separar mudanças circunstanciais daquelas transformações de longo prazo. É provável que muito do que imaginamos sobre o mundo pós-Covid se mostre impreciso. Afinal, tendemos a imaginar eventuais mudanças tomando como base a esperança de que outras tantas variáveis seguirão constantes. Podemos formular hipóteses sobre a importância crescente do home office nos próximos anos, mas provavelmente o faremos assumindo o efeito de apenas uma variável – a duração da pandemia – sobre o comportamento. Não é isso o que ocorre no mundo real, entretanto. Ao afetar todas as variáveis ligadas à vida em sociedade, a Covid-19 acabará por revelar novos caminhos e explicitar atuais limitações de maneiras surpreendentes.

Por isso mesmo, nossa capacidade de lidar com a atual crise dependerá mais das perguntas que formularemos nos próximos meses do que de quaisquer conclusões apressadas. A vantagem da dúvida é a sua abertura à incorporação de novas variáveis e a flexibilidade para o estabelecimento de cenários alternativos. A pressa pela determinação de um desfecho – algo tão comum no mundo dinâmico do século XXI – acaba resultando em um empobrecimento da análise, algo preocupante em momentos como o atual.

Isso posto, são diversas as dúvidas que rondam o cafeicultor. Questão importante diz respeito ao impacto da Covid-19 sobre os hábitos de consumo de café ao redor do mundo. Mais especificamente leia mais…

TEXTO Bruno Varella, professor assistente do Insper e Doutor em Economia Aplicada pela Universidade de Missour • FOTO Tabitha Turner

Café, a mais resiliente das bebidas

O Brasil é um destaque no mercado mundial de café por vários motivos, seja como o principal produtor, exportador ou como maior consumidor. Neste período de combate à pandemia não seria diferente. No entanto, pela primeira vez em mais de 10 anos, vimos cair o consumo de café no Brasil, em uma queda de 7,5% em volume devido ao fechamento de cafeterias. Porém, mesmo com a retração, o Brasil deve manter a posição de líder mundial de consumo de café para esse ano.

Em 2019, as cafeterias representaram 32% do volume consumido, ao passo que em 2020, espera-se que essa performance caia para 26%. O cenário não parece deixar brecha para otimismo, mas o consumidor brasileiro continuou buscando o café através do varejo, com destaque para os supermercados e mercados de bairro, seguindo tendências globais de diminuição do deslocamento e priorização para pontos de vendas próximos de suas casas.

Apesar das perdas, café é a bebida que mais resiste entre as preferidas dos brasileiros

Diferente de outros produtos, o consumo do café em casa faz parte, em muitos casos, de um ritual matinal, além de oferecer a dose de cafeína essencial para que muitos consigam despertar. Isso permite que parte do que antes era consumido fora de casa migre para o lar de maneira espontânea, diferente do que ocorre em outros produtos, como a cerveja, por exemplo, que também é uma bebida favorita dos brasileiros.

Para essa categoria de bebidas alcoólicas, espera-se em 2020 uma queda de 1,6% em valores constantes de 2019 no varejo, enquanto no café a expectativa é de crescimento de leia mais…

TEXTO Rodrigo Mattos, analista de bebidas da Euromonitor International • FOTO Annie Spratt

Solucionando o mistério da umidade no café verde

A quantidade de água em grãos de café verde é um dos principais indicadores de qualidade – grãos com umidade muito baixa ficam frágeis, envelhecem mais rápido e dificultam a torra; por outro lado, um café com água demais corre o sério risco de ser contaminado por ocratoxina. A porcentagem de umidade ideal adotada pela indústria fica entre 11% e 11,5%.

Embora o produtor tome todos os cuidados para que seu café chegue ao cliente nas melhores condições, muitos compradores têm reclamado de grãos com baixa umidade. Essa situação tem deixado muitos produtores confusos. Eles desconfiam de problemas no transporte e estão até mesmo investindo em novos aparelhos de medição de umidade.

A fazenda Daterra, de Patrocínio (MG), passou por esse impasse no final de 2017: vários clientes reclamavam que, ao medir a umidade dos grãos, as leituras apresentavam números entre 8% e 9%, enquanto as leituras na fazenda mostravam 11% de umidade. Para deixar tudo mais estranho, os clientes diziam que, apesar disso, o sabor do café e o comportamento na torra estavam ótimos.

Para solucionar o mistério foi necessário comparar todas as marcas de aparelhos de medição de umidade: algumas apresentam resultados idênticos, outras variam completamente. Isso acontece porque existem mais de 35 metodologias para medir a umidade de grãos e, ao estudá-las, a equipe de pesquisa da fazenda encontrou a resposta: cada equipamento utiliza uma metodologia diferente e, consequentemente, apresenta resultados diferentes.

É muito comum que as análises de umidade sejam feitas sob uma metodologia chamada Café ou Cafi, baseada na extração da umidade total do grão. Nesse método, o intervalo ideal gira em torno de 11% a 11,5% de umidade. O problema é que muitos dos novos medidores eletrônicos agora são indexados à norma ISO 6673, que exibe resultados leia mais…

TEXTO João Carlos Seixas Reis • ILUSTRAÇÃO Eduardo Nunes

Quanto vale o seu café?

Nada mais prazeroso do que tomar uma xícara quentinha de café, certo? Mas você sabia que, ao comprar seu café, você contribui para uma longa cadeia produtiva que perpassa diversas questões sociais, ambientais e econômicas?

Para o café chegar a sua xícara, ele passa por um complexo sistema que envolve o impacto ambiental relativo à preparação do solo, ao plantio e à colheita dos grãos, bem como o impacto social relacionado às condições dos trabalhadores rurais. Além desses impactos, há todo o processo comercial e industrial para o café chegar até você, que tem o poder de contribuir para que essa cadeia produtiva seja mais justa e sustentável a cada compra que  faz, optando por adquirir cafés certificados e com selo de sustentabilidade.

A Rainforest Alliance, organização internacional sem fins lucrativos, com mais de 30 anos de experiência, atua em mais de 80 países ao redor do mundo para ajudar a proteger o meio ambiente, conservar a biodiversidade e promover os direitos e o bem-estar dos trabalhadores, suas famílias e comunidades e possui uma das certificações para café mais reconhecidas do mercado. Os produtos que levam o seu selo estão comprometidos a mitigar o impacto negativo da produção agrícola ao meio ambiente e fomentar melhores condições e direitos para os trabalhadores do campo.

Quais são os benefícios do café certificado pela Rainforest Alliance?

Os consumidores de café estão cada vez mais em busca de transparência e sustentabilidade ao comprarem o produto. Eles querem mais informações sobre a qualidade e a origem dos grãos, as condições de trabalho no campo e sobre os impactos ambientais e sociais envolvidos do plantio à embalagem do café. Por isso, quando um leia mais…

TEXTO Giovanna Escoura Garcia, Gerente de Mercados na Rainforest Alliance • FOTO Café Editora

A maioridade de uma vida dedicada aos cafés especiais

Em 7 de junho de 2002, nasceu, no bairro Batel, em Curitiba (PR), a marca Lucca Cafés Especiais. Fruto do amor pelo café do casal Georgia Franco e Luiz Otávio Franco Souza, o nome é uma homenagem ao sobrenome do avô materno do marido, João Pedro Lucca, que foi produtor de café no Norte do Paraná.

Desde o primórdio voltada ao nicho de especialidade, a loja abriu com uma máquina de torra dentro do estabelecimento, oferecendo cinco cafés provenientes das regiões mais conhecidas, à época, como produtoras de cafés especiais. A aceitação da ideia foi tão fantástica por parte dos clientes que, atualmente, a Lucca ampliou seu portfólio para 40 rótulos disponíveis na cafeteria e em seu e-commerce.

O começo

Essa história, contudo, teve início mais para trás, na infância de Georgia, quando descobriu sua paixão pelo café nas terras de seu avô. “Já conhecia a rotina de uma fazenda e o cheiro de café”, lembra.

Seu primeiro caminho profissional, no entanto, conduziu-a para uma área bem diferente: engenharia e informática. Após anos na frente das telas de computadores, Georgia resolveu mudar de profissão. No ano 2000, entrou em um curso de gastronomia em uma escola de culinária em Nimes, na França.

Ao concluir o curso, retornou ao Brasil, quando foi convidada pelo grupo Ferroni, uma grande fazenda paranaense produtora de café especial, para desenvolver os blends dos grãos para exportação. Aceitou de prontidão.

Frutificava, assim, a primeira semente de café plantada em sua infância. “Essa foi uma chance que vi para levar o meu talento gourmet a uma área que estava leia mais…

TEXTO Georgia Franco • FOTO Divulgação

Viva a pesquisa nacional!

Estima-se que o Brasil tenha hoje “só” 4 bilhões de pés de café, e 90% deles vêm da mesma casa: Instituto Agronômico de Campinas. Se você não consegue nem imaginar como seria a nossa cafeicultura sem adubação, sem café no Cerrado e sem variedades como mundo novo e catuaí, então precisa conhecer a história desse instituto de pesquisa que modernizou o Brasil.

No fim da era colonial, a agricultura era a principal atividade econômica do Brasil e o café já tinha papel significativo. O problema era que, até então, a cultura do café era nômade, ou seja, o cafezal ia para onde houvesse solos férteis, e, esgotada a vitalidade do mesmo, a plantação mudava para outro lugar. Esse jeito de cultivar café pode parecer impensável nos dias de hoje, mas era muito comum na época, e especialistas já apontavam a necessidade de modernizar o modelo. Para fazer isso, foi criada, por ninguém menos que dom Pedro II, em junho de 1887, a Imperial Estação Agronômica. Em 1892, o instituto ganhou o nome de Instituto Agronômico de Campinas.

No começo, o propósito do instituto ainda era debatido: alguns acreditavam que ele devia se dedicar exclusivamente à pesquisa; outros achavam que ele deveria funcionar também como um centro de ensino, já que a comunidade exigia uma escola de Agronomia. Para organizar a casa, veio da Áustria o químico Franz Dafert que se tornou o primeiro diretor do Instituto. Na opinião de Dafert, o instituto devia leia mais…

TEXTO Juliana Sorati • ILUSTRAÇÃO Eduardo Nunes

A era romântica do café especial

A indústria do café foi marcada por turbulências e significativas mudanças nas últimas décadas, tanto para os produtores quanto para torradores e compradores. Há dois momentos nessa história que, para mim, marcam o início da era romântica do café especial no Brasil: em 2001, Paulinho Almeida, do Sítio Santa Terezinha, ganha, pela primeira vez, o Cup of Excellence, com a participação de seu café orgânico, e, em 2002, Isabela Raposeiras é coroada a primeira campeã barista do Campeonato Brasileiro, honras entregues por ninguém menos que o renomado chef Alex Atala.

Os dois campeões — o primeiro, um pequeno produtor focado em sustentabilidade e que vai marcar a “descoberta” e o reconhecimento de pequenos produtores no País; a segunda, mulher, empreendedora, e que se tornaria a grande condutora das formas como o café brasileiro é visto no próprio País e no mundo — ditariam o ritmo e o tom de uma série de inovações e iniciariam uma era de questionamento sobre tradições e status quo.

O contexto histórico do País era o seguinte: o Brasil vinha de uma longa ditadura militar, que se estendeu por grande parte do século XX. No final da década de 1980, mesmo findado esse regime, ainda se sentia a sua ressaca. Isso se traduziu em exportações de café, que iniciaram na década de 1990 e que, embora feitas por grandes empresas, tinham uma identidade menos institucionalizada. Nasciam, na mesma época, as associações de cafés, ainda que com caráter não tão inclusivo. Os anos entre 1999 e 2001 foram leia mais…

TEXTO Felipe Croce • ILUSTRAÇÃO Eduardo Nunes

Café onipresente: otimismo no mercado brasileiro pós-crise

Foto: Érico Hiller

Embora existam diferentes opiniões acerca da atual classificação do mercado brasileiro de café no modelo mundial das “ondas” – há quem diga que o país se encontra na segunda, por conta da importância das cafeterias, e há também quem defenda a já completa transição para a terceira, por conta da inovação cada vez mais relevante – um fato é certo: desde 2014 o Brasil ocupa a posição de líder mundial em volume total de vendas de café como bebida quente, de acordo com a pesquisa da Euromonitor International, empresa global em pesquisa de mercado.

Esta conquista teve, de fato, uma pequena ajuda do mercado norte-americano, que desde 2014 apresenta queda constante no volume de vendas no varejo, já que a maior parte dos consumidores tem concentrado seu consumo fora dos lares. No entanto, o principal fator não apenas para colocar o Brasil nesta posição de liderança, mas também para manter-nos lá deste então, é o crescimento consistente das vendas no país, independente da crise econômica.

A expectativa para 2019 é que seja vendido 1,2 milhão de toneladas de café, um crescimento de 4% em relação a 2018. O que pode parecer um crescimento tímido se comparado a outras categorias emergentes, na verdade é bastante expressivo – a diferença entre os anos 2018 e 2019 é equivalente ao leia mais…

TEXTO Angelica Salado, Gerente de Pesquisa da Euromonitor International

O futuro das cápsulas no Brasil: recuperação econômica e novo modelo de negócios

Entra crise, sai crise e um dos produtos mais resilientes da cesta de compras dos brasileiros continua sendo o café. Mesmo em 2016, no pior ano de consumo durante a recessão, o item continuou registrando aumento de 3% em volume total de vendas, acima do crescimento médio mundial. Engana-se, no entanto, quem acha que só aumentam as vendas dos cafés com baixa penetração: mesmo o tradicional café torrado e moído, comum em quase todos os lares brasileiros, segue em crescimento – foram 2% de aumento em 2018. Mas e as cápsulas?

Se no mercado de café como um todo, o Brasil ocupa posições de liderança, quando o assunto são as cápsulas, o cenário é outro. O país é o nono maior mercado do mundo em volume total de vendas em 2018, mas apenas o 24° em consumo por lares – atrás não apenas de potências como os Estados Unidos, mas também mercados mais tímidos, como a Nova Zelândia.

Que existe interesse pelo produto, isso é inegável. Aspectos como conveniência, praticidade e até a percepção de status são fatores chave para aumentar, cada vez mais, a base de interesse pelas cápsulas nos lares brasileiros. Enquanto as máquinas de café em cápsula devem continuar crescendo a uma taxa média anual de 12% e presentes em até 15% dos domicílios brasileiros até 2023, o grande desafio para a manutenção das vendas na categoria de cafés parece estar justamente no modelo de venda do produto. Muitos fabricantes e varejistas independentes optam por oferecer a máquina a preços muito baixos – especialmente em datas comemorativas como Dia das Mães, Black Friday e Natal – e ainda complementando com um grande volume de cápsulas de brinde na compra, buscando aumentar a experimentação. Sendo as cápsulas um tipo de café complementar ao já tradicional torrado e moído dentro dos lares, os consumidores geralmente levam um longo tempo até acabarem com seus estoques e precisarem fazer a recompra.

Eis o problema: fidelização – não de marcas, mas de produto. Pouco ou nenhum laço de longo prazo é criado com o consumidor, para grande parte dos fabricantes. Não existe relacionamento ativo, é baixo o nível de leia mais…

TEXTO Angelica Salado, Consultora, Euromonitor International • FOTO Beatriz Cardoso

Qual é o segredo?

O café brasileiro está em momento interessante no cenário internacional: depois de muitos anos sendo esnobado por torrefações de cafés especiais graças à fama de ter baixa qualidade, os profissionais gringos agora veem o café brasileiro como uma aventura a ser explorada, e estão em busca de verdadeiros tesouros.

Esse fenômeno tem mais de um motivo: em primeiro lugar, os esforços dos produtores em melhorias genéticas e processos de pós-colheita geraram um grande avanço na qualidade do café. Um segundo motivo – ou seria uma consequência? – é a presença mais frequente de cafés brasileiros nos campeonatos de barista. Nessas competições os melhores profissionais apresentam os melhores cafés do mundo e, por muitos anos, os palcos foram dominados por cafés de Panamá, Colômbia e Etiópia. Nos últimos anos já ficou mais comum encontrar cafés made in Brazil nas competições e, às vezes, até no primeiro lugar do pódio.

Uma das fazendas brasileiras mais procuradas por baristas em busca de cafés para competição é a Daterra, no Cerrado Mineiro. Em 2018 e 2019 dezenas de competidores usaram os cafés da fazenda em regionais, e três deles nos mundiais sediados em Boston, Estados Unidos. Ao longo da história, três competidores foram campeões mundiais com cafés da Daterra.

Em 2005, o dinamarquês Troels Poulsen levou um café da Daterra ao 1º lugar do mundial de Barista. Em 2006, o também dinamarquês Klaus Thomsen tornou-se o barista campeão com um blend que continha cafés do Brasil e leia mais…

TEXTO Juliana Sorati • ILUSTRAÇÃO Eduardo Nunes