Coluna Café por Convidados Especiais

Do campo à xícara, profissionais convidados refletem sobre o setor

Inovação e tecnologia e a sustentabilidade

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Quem nunca, ao visitar uma fazenda de café, procurou encontrar maquinário histórico ou ver sacas de juta com marcas antigas? Quem nunca, ao visitar uma vinícola, preferiu tirar fotos dos barris de carvalho em vez dos tonéis de aço inox?

Reconectar-se com o passado é confortante, reforça nossa cultura e nossa história e, de certa forma, nos dá a sensação de um tempo mais calmo. Voltamos à origem. Porém, o presente nos impõe um grande desafio: garantir a produção com volume e qualidade para atender aos mercados, gerar valor econômico e preservar o planeta.

Impossível garantir volume e qualidade com técnicas antigas, mas também é insustentável expandir áreas ou abusar de defensivos. A saída é melhorar a eficiência, produzir mais e melhor com a mesma área e aprimorar e evoluir com técnicas que contribuam para a preservação dos ecossistemas.

No Cerrado, grande parte das fazendas faz colheita mecanizada. Além disso, na Daterra, temos um sistema de irrigação por gotejamento e nossos sistemas de seleção de café por via úmida e seca usam equipamentos de última geração.

Essa escolha pela tecnologia e inovação contínua passa muitas vezes a imagem oposta: que todo esse processo torna o nosso café distante da origem.

É exatamente o contrário. Na Daterra investimos continuamente para replicar em uma escala perfeita a mesma precisão com que se processa uma amostra de café, minimizando ao máximo o impacto ambiental. Mas, para isso, ampliar a curiosidade, quebrar paradigmas e pesquisar são atitudes essenciais para inovar.

Não é preciso ser um grande produtor ou um pequeno orgânico. A saída é um blend equilibrado entre os objetivos e as necessidades econômicas do produtor, equacionado com as possibilidades agrícolas. Ter um tablet no campo consolidando as informações em tempo real sobre solo, água e, consequentemente, mostrando a real necessidade de um nutriente é tão inovador e relevante quanto aprender com a cultura orgânica a melhor compostagem para equilibrar o solo.

Dessa forma, ser sustentável atualmente vai muito além dos critérios de uma certificação. Deve ser acima de tudo uma adequação das possibilidades de cada produtor com o objetivo comum de produzir sem gerar impacto negativo no meio ambiente.

*Isabela Pascoal é diretora executiva da Fundação Educar DPaschoal e responsável pelo desenvolvimento sustentável da Daterra Coffee. Fale com a colunista pelo e-mail colunacafe@cafeeditora.com.br

(Texto originalmente publicado na edição impressa da Revista Espresso – única publicação brasileira especializada em café. Receba em casa. Para saber como assinar, clique aqui).

ILUSTRAÇÃO Eduardo Nunes

Banco de Germoplasma do IAC está em perigo

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Produtores e torrefadores ao redor do mundo estão familiarizados com as variedades de café mundo novo e catuaí. E quanto a icatu, obatã, tupi, caturra vermelho, caturra amarelo e bourbon amarelo? Todas são brasileiras e cada uma deve sua existência ao Instituto Agronômico de Campinas. O IAC foi fundado há 128 anos pelo imperador português D. Pedro II, em 1887. E, entre seus maiores tesouros, está um banco de germoplasma de café datado de 1929.

“Inicialmente, diferentes variedades de arábica foram coletadas de diversas regiões do Brasil. Naquela época, elas eram: típica, amarelo de botucatu, bourbon vermelho, sumatra, maragogipe e caturra. A partir dessas plantas, muitas variações/mutações foram encontradas nos campos e trazidas para Campinas”, explica o pesquisador do IAC, Gerson Giomo.

Um programa de melhoramento genético foi iniciado em 1932, quando centenas de pés de café de outros países chegaram para estudo. Os resultados de 80 anos de pesquisa representam um enorme legado científico, útil no Brasil e em outros lugares.

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“Catuaí vermelho e caturra vermelho, por exemplo, são variedades muito cultivadas na América Central. E obatã está em processo de implementação na Costa Rica”, explica Giomo. “Estima-se que 90% dos 4,3 bilhões de pés de café brasileiros são derivados de cultivares desenvolvidas pelo IAC”, disse.

No século passado, o Instituto desenvolveu 66 cultivares comerciais de café arábica e uma cultivar de robusta. O IAC supervisiona o maior e mais ativo banco de germoplasma do Brasil, com 16 espécies, uma diversidade de formas botânicas, mutações, e variedades exóticas originadas pela diversificação de Coffea arabica e Coffea canephora. Um total de 5.451 acessos e 30.000 plantas estão sob os cuidados do Estado de São Paulo.

“É importante ressaltar que todas as pesquisas de melhoramento genético foram financiadas pelo governos Federal e Estadual. A nossa instituição não lucra com o conhecimento produzido”, explica Giomo. Por esta razão, a maioria de sua tecnologia é livre para outros usarem.

Infelizmente, a atual crise econômica e política coloca o banco de germoplasma em perigo. Um déficit financeiro nos últimos cinco anos limitou a manutenção, culminando na atual situação precária para essa coleção insubstituível.

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Pesquisadores já fizeram o seu melhor para cuidar das plantas, mas aposentadorias e a pouca mão de obra forçaram o conselho administrativo do IAC a procurar fundos financeiros para evitar erosão e o fim dessa base genética, que é essencial para a pesquisa científica e tecnológica. “Estamos procurando uma parceria público-privada em diversos setores que, direta e indiretamente, se beneficiaram com a tecnologia produzida pelo IAC”, explica Giomo.

*Kelly Stein é jornalista e correspondente da revista STIR Tea&Coffee. Fale com a colunista pelo e-mail colunacafe@cafeeditora.com.br ou kellyrstein@gmail.com

(Artigo originalmente publicado na revista tailandesa STIR Tea&Coffee)

TEXTO Kelly Stein • FOTO Paula Rúpolo/Café Editora

Brazil. The Coffee Nation

Mostrar ao mundo a verdadeira nação do café, indo muito além das limitações geográficas de um país cafeeiro. Esse é o start do novo posicionamento de branding ‘Brazil. The Coffee Nation’ que a Brazil Specialty Coffee Association (BSCA) utilizará na promoção dos cafés especiais brasileiros em todo o mundo.

Após um detalhado estudo, identificamos cenários para agregação de valor à nossa oferta para toda a cadeia de stakeholders do café e para a estruturação do setor a fim de que os associados sejam players globais, exportadores de valor agregado, melhorando a percepção atual sobre o produto brasileiro.

E é com a ideia de mostrarmos ao mundo que uma nação é não apenas um território geográfico delimitado por suas fronteiras, mas um lugar que tem cultura própria e única, além de ser composta de um povo que partilha os mesmos interesses, propósitos, valores e paixões, entre elas o café, que a BSCA e seus parceiros levarão ao mundo a vanguarda do Brasil no segmento de grãos especiais, revelando que o nosso produto vai além do despertar matinal. Ele representa o aroma e o aconchego de nossas casas, traz o carinho da família e é uma forma de socializar com amigos, fechar negócios e coroar nossas refeições.

O posicionamento também apresentará a responsabilidade sustentável de nossa produção, focada no respeito ao meio ambiente e aos aspectos sociais e econômicos, demonstrando que seguimos a legislação mais rígida do mundo para termos um posicionamento muito além do posto de maior produtor e exportador. Queremos fortalecer a imagem do Brasil como País de origem de produtos high end, que estão presentes nos mais sofisticados e exigentes centros de consumo mundiais.

A definição do conceito “Brazil. The Coffee Nation” se deu após pesquisas que identificaram “autenticidade”, “conveniência” e “gourmetização” como aspectos valorizados pelos consumidores. São reflexos exatos do mercado de cafés especiais, cujos atores devem exercer o conceito de sustentabilidade em todos os seus trâmites, demonstrando que os cafés brasileiros especiais são voltados para pessoas também especiais.

Assim, nossas ações promocionais apresentarão a cultura e a história de sucesso do País no café, revelando a paixão, a história e a tradição de sustentabilidade, além do sucesso do Brasil como produtor, industrial e exportador, o que traz à tona profissionalismo, conhecimento, diversidade e comprometimento com os compradores.

Através do exposto, traçamos um norte, que é passar de grande exportador, base de blends e de dúvidas em relação à qualidade – por culpa de nosso passado – para, já em 2020, o maior e melhor produtor de cafés, e deixar a imagem de confiança, respeitabilidade, “premium”, além de eliminar todas as dúvidas sobre nossa qualidade.

O mundo demanda produtos únicos e o Brasil é a fonte para que isso seja suprido. Somos o paraíso dos “coffee hunters”, que aqui encontram os grãos que possibilitam bebidas fantásticas que encantarão pessoas em todos os cantos do mundo. Por tudo isso, o Brasil é “the coffee nation”.

Para entender um pouco mais do assunto, a dica é pesquisar o vídeo institucional “Brazil. The Coffee Nation” no YouTube, disponibilizado no canal da BSCA.

Vanusia Nogueira é diretora executiva da Brazil Specialty Coffee Association (BSCA). Fale com a colunista pelo e-mail colunacafe@cafeeditora.com.br

ILUSTRAÇÃO Eduardo Nunes

Rause Café na Estrada: Fazenda Cachoeira – Santo Antonio do Amparo (MG)

Imagina uma fazenda com uma visão tão atual de produção que escolheu focar em lavouras de café orgânico ser também uma fazenda tão antiga que ainda tem resquícios e lembranças do período do Brasil colônia.

Essa é a Fazenda Cachoeira, em Santo Antonio do Amparo (MG). Quem nos recebeu desta vez foram três guardiões mais festivos que perigosos (o Jake, a Íris e a Bela). Chegamos a noite e os quartos, do que até três meses atrás era um hotel fazenda, já estavam arrumados e a janta nos aguardava no fogão. É incrível como o povo mineiro consegue ser receptivo mesmo sem estar lá pra te receber pessoalmente. Depois de algumas horas de descanso para o corpo, nos encontramos com o Roger e uma mesa posta com delícias mais que deliciosas preparadas pela Márcia.

Passamos o dia passeando pela Fazenda Cachoeira com o Roger, que além de se dedicar apaixonadamente pelo cultivo e preparo de cafés especiais, também é músico. Então o Roger, baterista e produtor, montou um pequeno, mas muito funcional, home studio na fazenda. E é de lá que ele faz suas trilhas sonoras, mas sempre acompanhado de um bom café.

A Fazenda tem algumas parcerias de pesquisa. Uma adaptação de uma espécie africana, experiência com fermentação, entre outras.

Era chegada a hora de mostrar para os trabalhadores da Cachoeira como era esse tal café espresso especial. Muita estranheza no começo, mas acredito que todos gostaram da experiência. Não tanto quanto eu, ao poder mostrar o resultado final de tanto trabalho deles embaixo do sol. O café que servimos era um acaiá Cerrado, natural, de coleta seletiva (quando os cafés são colhidos fruto por fruto).

Não poderíamos deixar de conhecer o motivo de a fazenda ter o nome que tem. O clima não estava quente, então foi preciso muuuuita coragem pra chegar perto da queda d’água. Mas, mesmo assim, foi uma bela recarregada nas energias!

Aproveitamos a hospitalidade e o cenário bucólico por mais uma noite e claro, só partimos depois do café da manhã.

Infelizmente, não pudemos conhecer a Miriam, também proprietária da fazenda e esposa do Roger. Ela tem um trabalho junto ao IWCA-Brasil (International Women Coffee Association, capítulo Brasil). Teria sido bom conversar um pouco com ela a respeito. Ficou pra próxima.

Saímos de lá já com saudades e um enorme sentimento de gratidão.

Obrigado a todos da Fazenda Cachoeira por nos receber tão bem e pelo trabalho que vêm fazendo pela melhoria na qualidade do café no Brasil.

Ficou curioso? Venha provar esse e os outros cafés do Rause Café na Estrada na Semana Internacional do Café que acontecerá em BH entre os dias 24 e 26 de setembro. Acompanhe também nossa viagem por terras mineiras pelo Facebook ou no Instagram @rausecafenaestrada.

Um abraço e até a próxima parada!

*Juca Esmanhoto é proprietário do Rause Café + Vinho, em Curitiba (PR), ao lado de sua sócia Hida Lambros, e criador do projeto Rause Café na Estrada. Conheça mais sobre o trabalho, clicando aqui.

FOTO Rause Café na Estrada/Divulgação

Rause Café na Estrada: Fazenda Portal da Serra – Ibiraci (MG)

O caminho pelas estradas de Minas Gerais continua chuvoso. Já aprimoramos bastante a nossa técnica de envelopamento da carga, assim nossa bagagem está bem mais segura.

Chegamos na cidade de Ibiraci ainda na noite do dia 11. Paramos no que parecia ser um dos poucos lugares abertos para comer uma pizza e esperar pelo nosso anfitrião, Hugo Wolff. Para a minha surpresa, estava com ele o Paulo, um dos sócios da cafeteria King of the Fork (KOF) de São Paulo. Coincidentemente, foi nesta cafeteria que apresentei o Rause Café na Estrada pela primeira vez para o pessoal da Revista Espresso.

Chegamos na casa onde ficaríamos hospedados e fomos recebidos pelos guardiões da fazenda: o Taurus, o Áthos, o Brutos e o Lobinho. Os dois primeiros da raça Canicorso, um Pit-bull e um Pastor Alemão. Certamente, não arriscaríamos descer da caminhonete se não fosse a presença do Hugo.

Na manhã seguinte conhecemos a família toda. O Umberto, pai do Hugo, a mãe Elisa e a avó Dona Madalena.

Após o café da manhã reforçado fomos passear pela lavoura de café e conhecer um pouco do trabalho da família. Há alguns anos o Hugo abandonou a carreira de oficial da Marinha para se dedicar ao cultivo do café. Paramos em um ponto onde está sendo planejado um mirante, para admirar a linda vista que se tem a 1.235 m de altitude.

Após um almoço muito saboroso preparado no fogão à lenha pela avó do Hugo, na plenitude dos seus 83 anos de idade, montamos a nossa máquina de espresso na mesa do almoço e pudemos ver nos olhos da família o orgulho que eles têm do ex-marujo.

O café servido veio de dois talhões (áreas) diferentes da Fazenda Portal da Serra. Eles são catuaís vermelhos processados naturalmente (quando o café seca ainda dentro da casca).

Ficou curioso? Venha provar esse e os outros cafés do Rause Café na Estrada na Semana Internacional do Café que acontecerá em BH entre os dias 24 e 26 de setembro. Acompanhe também nossa viagem por terras mineiras pelo Facebook ou no Instagram @rausecafenaestrada.

Um abraço e até a próxima parada!

*Juca Esmanhoto é proprietário do Rause Café + Vinho, em Curitiba (PR), ao lado de sua sócia Hida Lambros, e criador do projeto Rause Café na Estrada. Conheça mais sobre o trabalho, clicando aqui.

FOTO Rause Café na Estrada/Divulgação

Rause Café na Estrada: Daterra – Fazenda Boa Vista

A chegada em Patrocínio foi, mais uma vez, embaixo de chuva torrencial. Mais uma vez, mesmo com uma lona adicional cedida pelo pessoal da AC Café em Araxá, nossa bagagem sofreu com a água. A chuva já está começando a atrapalhar demais nossos planos.

Mais uma vez, sem expectativa de termos uma iluminação natural diferente do cinza no céu, seguimos para a Fazenda Boa Vista, sede da Daterra.

Desde o momento que entramos na fazenda deu para perceber que a qualidade é o foco desta empresa que investe pesado em pesquisa e melhorias ano a ano, safra a safra.

Quem nos recebeu foi o engenheiro agrônomo e gerente técnico da fazenda Gustavo Guimarães. Ele nos contou como surgiu a fazenda que, diferente das outras, já nasceu focada em produzir cafés de alta qualidade em larga escala e com um projeto já desenhado e estudado para fazer da Daterra uma das principais produtoras de café do país.

Com cerca de 60% da lavoura de café pontuando acima de 80 pontos, os cafés são embalados em um sistema chamado PentaSystem, que foi desenvolvido por eles mesmos. Neste novo sistema de embalagem do café verde, a saca de juta deu lugar a modernas caixas de papelão, que tem no seu interior dois pacotes de 12,1kg de café embalados a vácuo com injeção de alguns gases que promovem um aumento da vida útil do café além facilitarem muito a armazenagem e transporte do grão verde.

Ainda antes da pausa para o almoço fomos conhecer a estrutura de beneficiamento dos cafés da série chamada de Masterpieces. Nesta estrutura são selecionados cafés muito específicos, com o grau de maturação e dimensões desejadas. Isso permite um direcionamento muito acertivo para a produção de cafés exóticos e incríveis.

Após o almoço, retornamos ao laboratório e servimos cerca de cinquenta funcionários da Daterra em uma linda La Marzocco FB80 vermelha, que mostrou todo o potencial do café, um Gaurani natural. Muitos nunca haviam provado aquele café intenso e encorpado extraído sob pressão. Nos copos, adesivos levavam os nomes das pessoas que nos ajudaram a realizar o projeto através do financiamento coletivo.

Ficou curioso? Venha provar esse e os outros cafés do Rause Café Na Estrada na Semana Internacional do Café que acontecerá em BH entre os dias 24 e 26 de setembro. Acompanhe também nossa viagem por terras mineiras pelo Facebook ou no Instagram @rausecafenaestrada.

Um abraço e até a próxima parada!

*Juca Esmanhoto é proprietário do Rause Café + Vinho, em Curitiba (PR), ao lado de sua sócia Hida Lambros, e criador do projeto Rause Café na Estrada. Conheça mais sobre o trabalho, clicando aqui.

FOTO Rause Café na Estrada

Rause Café na Estrada: muita chuva e alguns espressos pelo caminho

Depois de muitas horas (muito mais do que esperávamos) de viagem, embaixo de chuva forte, chegamos em Araxá (MG) perto das 5h da manhã. No hotel que tinham nos indicado, o sistema estava fora do ar e era impossível liberar as chaves magnéticas. No segundo que paramos, a recepção estava vazia e mesmo depois de algumas ligações minhas para o telefone que estava no balcão a minha frente, ninguém apareceu. Já estávamos irritados e absurdamente cansados até que, enfim, na terceira tentativa, conseguimos fazer o check-in.

Obviamente, a ideia de chegar na fazenda pela manhã cedo tinha, literalmente, ido por água abaixo. Porém, ao chegarmos ao escritório da AC Café, encontramos o Carlos e a Andreza, uma das pessoas que apoiou muito o Rause Café na Estrada.

Após um almoço delicioso, quando conversamos um pouco a respeito da história da fazenda, fomos até o laboratório onde, depois de três dias de viagem, conseguimos colocar a nossa La Marzocco GS3 para funcionar. E ah… Como ela funciona!

Servimos lindos espressos (21g/60 ml) para os funcionários da fazenda. Como era de se esperar, apesar da tentativa de disfarçar, alguns deixaram escapar uma careta de estranhamento. O café no moinho era o campeão de 2014 do concurso de qualidade da região do Cerrado Mineiro (a única região cafeeira com denominação de origem controlada do país). Sem dúvida, o café da Fazenda Santa Lucia, pontuado com 89,12 pelos juízes do concurso, ficou fantástico!

Ficou curioso? Venha provar esse e os outros cafés do Rause Café na Estrada na Semana Internacional do Café que acontecerá em Belo Horizonte entre os dias 24 e 26 de setembro. Acompanhe também nossa viagem por terras mineiras pelo Facebook ou no Instagram @rausecafenaestrada

Um abraço e até a próxima parada!

*Juca Esmanhoto é proprietário do Rause Café + Vinho, em Curitiba (PR), ao lado de sua sócia Hida Lambros, e criador do projeto Rause Café na Estrada. Conheça mais sobre o trabalho, clicando aqui.

FOTO Rause Café na Estrada

Rause Café na Estrada: primeira parada

Juca, o produtor Paulo Almeida e Hida Lambros na Fazenda Santa Terezinha, no Sul de Minas Gerais

A primeira parada em solos mineiros foi Paraisópolis, cidade da região do Sul de Minas Gerais. Infelizmente (para nós), a chuva atrapalhou os planos e não conseguimos servir os espressos na praça da cidade. Porém, para Paulo Almeida, também conhecido como Paulinho, da Fazenda Santa Terezinha, a chuva é sempre muito bem-vinda.

Depois de dois anos seguidos de muitas perdas com as secas que castigaram o Estado, esse ano ele está esperançoso. Praticamente, todas as 20 mil mudas que ele plantou, estão dando sinal que serão muito saudáveis daqui pra frente.

O Paulinho é um dos poucos produtores no Brasil que conseguem fazer um café orgânico de altíssima qualidade. Toda a sua safra é colhida de maneira seletiva (quando os frutos são colhidos um a um). Na safra 2015, ele apostou na fermentação de seus cafés e está muito satisfeito com os resultados que vem obtendo.

O café que o Paulinho forneceu para o projeto é um café da variedade mundo novo, orgânico e sombreado, de um talhão chamado Guatambú. Foi deste mesmo talhão que, em 2001, o Paulinho participou do Cup of Excellence pela primeira vez. Naquele ano, ele não só ficou em primeiro lugar, como foi o primeiro café orgânico a ganhar o concurso. Detalhe: a pontuação do café é maior até hoje em todos os concursos Cup of Excellence do mundo (97,53 pontos).

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Florada na Fazenda Santa Terezinha

Ficou curioso? Venha provar esse e os outros cafés do Rause Café Na Estrada na Semana Internacional do Café que acontecerá em BH entre os dias 24 e 26 de setembro. Acompanhe também nossa viagem por terras mineiras pelo Facebook, ou no Instagram @rausecafenaestrada.

Um abraço, e até a próxima parada!

*Juca Esmanhoto é proprietário do Rause Café + Vinho, em Curitiba (PR), ao lado de sua sócia Hida Lambros, e criador do projeto Rause Café na Estrada. Conheça mais sobre o trabalho, clicando aqui.

FOTO Rause Café na Estrada/Divulgação

A tendência da fermentação natural

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Trabalhando com cafés de qualidade há 15 anos, cada vez mais acredito e me surpreendo com o potencial dos grãos do Brasil. Com isso, uma tendência se tornou real: voltar a usar a fermentação nos processos dos cafés por via úmida, os cafés “lavados”, como conhecemos. Um processo antigo, mas que vem sendo trabalhado e aprimorado atualmente, por profissionais envolvidos no setor. Consiste em retirar a mucilagem do café que foi descascado, deixando-o submerso na água por determinado período. É um processo muito difundido nos países da América Central, além de Colômbia, Quênia, entre outros.

Aqui nas fazendas Dona Nenem e São João Grande, localizadas na região do Cerrado Mineiro, o trabalho é cada vez mais intenso. A fermentação em tanques iniciou-se nas propriedades em 2010 e, durante esses anos, tive o privilégio de me surpreender inúmeras vezes com os resultados obtidos.

Seleção, essa seria a palavra chave para o sucesso nos processos. De acordo com suas características, os frutos são selecionados e direcionados para cada processo. Por exemplo, cafés com características marcantes em acidez não são colocados em tanques, pois isso poderia causar um desequilíbrio nessa característica de sabor. A retirada das amostras na lavoura, a fim de mapear a qualidade antes da colheita, faz com que nós possamos acertar o processo indicado para cada lote. É como a previsão do tempo, se amanhã vai chover, prepare o guarda chuva.

A meta é traçar o perfil sensorial desejável para cada setor das propriedades. O café vai nos dizer, na xícara, se ele aceita ser natural, descascado, desmucilado mecanicamente ou fermentado em tanque. Parece engraçado? Pois é a pura verdade… É como se ele falasse mesmo.

É necessário estar atento a todas as variáveis que influenciam as alterações físicas e sensoriais nestes cafés fermentados. As alterações físicas inconfundíveis são a uniformidade dos grãos, bem como a cor mais azulada, a torra, e a bebida na xícara, onde brotam as características sensoriais, a isenção de amargor, a doçura acentuada, o sabor de caramelo e ervas e, claro, a acidez, que sofre tantas alterações que em alguns lotes causa até uma sensação de borbulhas na boca, como nos espumantes.

Porém, não devemos pensar apenas em cafés fermentados, mas sim em cafés fermentados diferenciados e adicionados com uma qualidade jamais vista. Para isso, não basta apenas colocar “de molho” e pronto.

O mercado não aceita bem os cafés que possuem uma acidez acética, desagradável (como vinagre). Este processo, se bem acompanhado, trará uma acidez agradável e cítrica, prazerosa, exótica e que chame a atenção dos grandes apreciadores de cafés especiais do Brasil e de fora.

O processo de fermentação natural depende muito do monitoramento do ph da água, que deve ser feito constantemente. Gerenciar as mudanças no decorrer deste processo é uma necessidade, bem como monitorar a temperatura da água de hora em hora, levando em consideração os horários, a umidade relativa, entre tantos outros fatores. Nesse processo, as maiores mudanças acontecem após as primeiras 24 horas de imersão. A partir deste momento, o aroma e o sabor da água começam a ter suas maiores alterações. O gerenciamento, juntamente com o pHmetro, são as ferramentas de definição para retirada de cada lote, que podem variar de 28 a 40 horas, dependendo de cada lote, pois cada café é único e tem sua história. Outro fator relevante e que pode ser um influenciador é o horário em que o café é colocado no tanque, se na noite fria ou na tarde durante um sol forte, por exemplo. Um trabalho que deu certo aqui e que nos rendeu bons negócios foi a infusão de ervas. Em um destes testes, usamos o capim-cidreira, acompanhando o tempo de contato do café com a erva e a quantidade desta.

Para os cafés lavados, não posso ter medo do diferente. A busca pelo sabor completo é que me encoraja a fazer novos testes, começando em pequenas escalas e aumentando conforme a resposta que o café me dá. Outros testes serão feitos ainda nesta safra.

*Renato Souza é degustador de café Q-Grader licenciado e coordenador administrativo e de qualidade nas fazendas São João Grande e Dona Nenem, em Presidente Olegário (MG), Cerrado Mineiro. Fale com o colunista pelo e-mail colunacafe@cafeeditora.com.br

O texto deste colunista não reflete necessariamente a opinião da revista

ILUSTRAÇÃO Eduardo Nunes

Café levado a sério

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Como profissional de café, me parece estranho que, na maioria dos melhores restaurantes do mundo, se sirva uma xícara de café medíocre. Acho difícil aceitar que um dos melhores restaurantes de São Paulo, que se orgulha de servir ingredientes de origem local, serve um café de baixa qualidade que se pode achar no supermercado. Mesmo quando em pequenas fazendas, a apenas algumas horas de distância, se produzam os melhores cafés do Brasil. Cafés que muitas pessoas – eu me incluo entre elas – viajam por todo o mundo para encontrar.

Então, por que o café ainda não é levado a sério nesses restaurantes? Eu suspeito que isso tenha a ver com dinheiro. As grandes empresas de café dão máquinas e, em alguns casos, dinheiro aos restaurantes, a fim de que sirvam o seu produto. É uma forma barata de comercialização como algo superior apenas por ser associado a um grande chef. Há também a tradição de usar o café como uma maneira de os restaurantes fazerem um bom dinheiro. Eles compram o café mais barato e o vendem caro.

Felizmente, existem chefs que estão começando a mudar essa visão. Tenho a sorte de poder ajudar um deles, o chef René Redzepi, a desenvolver um novo programa de café em seu restaurante, o Noma, em Copenhague, que é considerado o melhor restaurante do mundo. Há dois anos, fui contatado por René e seu sommelier para ajudá-los a melhorar o serviço de café no lugar. Eles perceberam que não estavam dando tanta atenção ao grão do jeito que se importavam com os outros ingredientes e queriam que ele atingisse o mesmo padrão de todos os outros ítens oferecidos no restaurante. Um ano mais tarde, depois de horas de treinamento e degustação, foi lançado o novo serviço de café do Restaurante Noma.

Decidimos concentrar nossas energias a fim de buscar o melhor café que pudesse chegar a nossas mãos e prepará-lo com um simples filtro de papel manual, o Hario V60. Muito similar ao preparo da maioria dos cafés escandinavos. Nós recebemos muitas críticas dos profissionais do setor. Para eles, o método era muito simples e poderíamos ter escolhido um caminho mais espetacular de fazer café, por exemplo, usando o sifão ou pelo menos preparando o grão ao lado das mesas para que os convidados pudessem ter uma apresentação adequada.

A meu ver, esse é um dos motivos pelos quais não há mais restaurantes que servem um café de excelente qualidade. Nós, profissionais do café, dificultamos muito a compreensão tanto dos chefs como dos clientes. O serviço simplista no Noma foi muito bem pensado. Queríamos que os clientes experimentassem o café em si, e não todo o burburinho em torno dele.

No entanto, ainda temos desafios, e um dos maiores é mudar a percepção dos clientes. Mesmo em minha própria cafeteria, ainda precisamos educar as pessoas sobre o sabor da bebida, que a maioria, normalmente, acredita ser amargo e forte. Mas um ótimo café não necessariamente é assim. Para mim, um café delicioso pode ter gosto de chá, tangerina, jasmim, etc. Com certeza não é muito amargo e é naturalmente doce. Mas nem todos os clientes serão capazes de entender que o café não é apenas café. A formação de sommeliers para apresentar a bebida é, portanto, fundamental.

Logicamente, a preparação exige um pouco de atenção, mas com treino e bons sistemas no local, fazer um café saboroso não será um problema. Encontrar os ingredientes certos pode ser um tanto desafiador. Por isso, é indispensável para um restaurante trabalhar junto com um bom torrador, que selecione os melhores grãos de pequenos produtores e que possa ajudar com treinamentos e sistemas de preparação.

Acredito que os restaurantes brasileiros deveriam liderar o mundo servindo o melhor café. Afinal, eles têm as fazendas em seu quintal e a bebida faz parte da cultura e da história do Brasil. Isso é algo que deve deixar os chefs e sommeliers brasileiros orgulhosos. É também um jeito fácil de fazer com que os visitantes saiam com um sorriso no rosto em vez de partir com um gosto amargo na boca.

* Tim Wendelboe é torrador e consultor de cafés especiais, proprietário do Tim Wendelboe Espresso Bar, em Oslo, na Noruega.

ILUSTRAÇÃO Eduardo Nunes