Barista

Intertorra abre inscrições para sua 6ª edição

Evento acontece de 12 a 14 de setembro em Poços de Caldas (MG), e reúne profissionais do setor em uma programação teórica e prática sobre torra de cafés

A 6ª edição do Intertorra (Encontro de Torrefadores), evento itinerante dedicado a profissionais da torra do café, acontece de 12 a 14 de setembro, na Região Vulcânica, em Poços de Caldas, no campus da IFSul de Minas. As inscrições estão abertas e podem ser feitas aqui.

Criado pelo mestre de torra Matheus Tinoco e co-realizado pela Espresso&CO, a edição deste ano tem oapoio da Associação dos Produtores da Região Vulcânica e da Prefeitura de Poços de Caldas, o Intertorra é uma imersão técnica para mestres de torra, baristas, produtores, donos de cafeterias e traders.

A programação inclui aulas práticas sobre como operar máquinas de diferentes fabricantes, com orientação de especialistas; visitas técnicas a cafezal, estações de processamento e torrefação local; sessões de harmonização; palestras e workshops sobre torra, perfis sensoriais, tecnologia e mercado; além de oportunidade de network entre especialistas.

Os conteúdos serão ministrados por importantes nomes do setor, escolhidos como Embaixadores da edição. São eles Isabela Raposeiras (Coffee Lab – SP), Eduardo Santos (Fazenda São José – MG), Leonardo Custódio (Território do Café 33 – MG), Marcio Santos (Muy Café – DF), Igor Almeida (Roast Cafés – BH), Luis Paulo (Roast Cafés – BH), Ivan Santana (Café Goulard/Fazenda Jangada – MG), Donieverson Santos (Bourbon Specialty Coffees – MG), Hugo Rocco (Moka Clube – PR) e Alex Lima (Torra Fresca Cafés – SP).

O objetivo do Intertorra é reforçar o aprimoramento no segmento de torra brasileiro, conectando conhecimento técnico, terroir e mercado.

Intertorra 2025
Quando: 12 a 14 de setembro de 2025
Onde: Campus da IFSul de Minas – Poços de Caldas (MG), Região Vulcânica
Quanto: ingressos a R$ 1.200 (inclui alimentação nos 3 dias do evento e certificado de participação)
Atividades: Torra, visitas técnicas, palestras, workshops, harmonizações e networking
Inscrições: https://evento.intertorra.com.br/2025

TEXTO Redação • FOTO Intertorra

Mercado

Café Girondino (SP) comemora 150 anos com lançamento de microlote

Este ano, o Café Girondino, um dos pontos icônicos da cidade de São Paulo, completa 150 anos e celebra a data com o lançamento de um microlote. A novidade é composta por grãos arábica da variedade bourbon amarelo, cultivados pelo produtor Mariano Martins na Fazenda Santa Margarida, em Serra da Cuesta, Oeste Paulista. No pós-colheita, passaram por dupla fermentação com maceração carbônica.

Foto: Equipe Espresso

A Espresso recebeu o novo microlote. Preparamos a bebida no método chemex, que resultou em notas de melaço e frutas amarelas na xícara. “A escolha do bourbon amarelo e da produção em pequena escala refletem nosso compromisso em oferecer experiências únicas, valorizando o processo do cultivo à xícara”, conta Elena Boscato, especialista em cafés e gerente de operações do Girondino. “O lançamento deste microlote é uma forma de celebrarmos não apenas os 150 anos do Girondino, mas também a riqueza e a diversidade dos cafés brasileiros”, destaca.

Os pacotes de 250 g (R$ 60) estão disponíveis para compra apenas no Café Girondino (rua Boa Vista, 365 – Centro), enquanto durarem os estoques.

Sobre o Girondino

Inaugurado em 1875, no Centro Histórico, o Café Girondino surgiu em meio à urbanização da capital e logo se tornou um ponto de encontro da sociedade paulistana. Após décadas de operação, acompanhando as transformações da cidade, o estabelecimento quase fechou as portas em junho de 2024, devido aos impactos da pandemia.

A notícia causou comoção entre frequentadores e admiradores, e chegou até à Fábrica de Bares, hub de desenvolvimento, gestão e operação de estabelecimentos, que assumiu a gestão do Girondino e reabriu o local em novembro do mesmo ano.

Modernização do espaço e do cardápio estão entre os planos dessa nova etapa do Girondino. Já é possível, por exemplo, pedir espressos, coados, bebidas com leite (animal ou vegetal), cold brew e espresso tônica, além de matcha latte, chocolate quente ou gelado e opções de chás e infusões. “Para os próximos anos, queremos ampliar o trabalho com produtos parceiros, trazer mais edições especiais e seguir fortalecendo o Girondino como um espaço que une tradições, hospitalidade e a cultura do café no centro de São Paulo”, finaliza Elena.

TEXTO Redação • FOTO Divulgação

Mercado

Mercado de café funcional movimenta US$ 4,5 bilhões e segue em alta

Crescimento é impulsionado por consumidores que buscam benefícios à saúde além da cafeína

O mercado global de café funcional já movimenta US$ 4,48 bilhões, e cresce a uma taxa média anual de 11,45%, de acordo com dados da Mordor Intelligence. O avanço no setor é motivado pela busca por bebidas que aliam a cafeína a benefícios para a saúde. “Ingredientes adaptogênicos, incluindo ashwagandha [erva usada na medicina ayurvédica, para melhorar resistência ao estresse, qualidade do sono e energia] e cogumelos reishi e juba-de-leão, estão se tornando adições comuns às formulações de café”, informou a empresa de pesquisa de mercado. 

O destaque são as bebidas prontas para beber (ready to drink ou RTD), que respondem por quase 69% das vendas, com taxa de crescimento anual de 12%. Entre as tendências, também ganham força cafés enriquecidos com vitaminas, probióticos e até proteínas, além do aproveitamento da cereja do café. 

A América do Norte lidera o consumo de café funcional (69%), mas é na Ásia-Pacífico que é registrada a alta mais acelerada (+13,5% ao ano). Apesar do custo elevado de produção, os consumidores demonstram disposição para pagar mais por produtos que entregam benefícios funcionais.

TEXTO Redação / Fonte: FoodNavigator Europe • FOTO Wade Austin Ellis

Cafezal

Gesha da La Esmeralda é vendido a R$ 163 mil o quilo, novo recorde

Um lote de gesha lavado da renomada Hacienda La Esmeralda, no Panamá, foi arrematado por US$ 604.080 (cerca de R$ 3,26 milhões) em leilão realizado na quinta (7), durante a 29ª edição do Best of Panama, principal competição de cafés especiais do país.

Com apenas 20 quilos, o lote alcançou o preço de US$ 30.204 por quilo (aproximadamente R$ 163 mil), estabelecendo um novo recorde mundial para vendas de café em leilão. O comprador foi a Julith Coffee, empresa sediada em Dubai.

Além do valor inédito, o lote recebeu 98 pontos na avaliação sensorial — a maior pontuação já registrada na história do Best of Panama. O resultado foi obtido por 22 juízes internacionais durante provas realizadas no Boquete Coffee Festival, em junho.

O evento, criado em 2004 e organizado pela Associação de Cafés Especiais do Panamá (SCAP), também consagrou outros cafés da família Peterson, proprietária da Hacienda La Esmeralda. Entre eles, um geisha natural, com 97 pontos, e um varietal que atingiu 92 pontos.

No total, foram vendidos 50 lotes de cafés no leilão (20 de gesha lavado, 20 de gesha natural e 10 de outras variedades), arrecadando US$ 2,86 milhões — o dobro do recorde anterior, em 2024. Segundo a SCAP, 30 lotes superaram a marca de US$ 1.000 por quilo, consolidando o Panamá como referência mundial na produção de cafés raros e de alto valor.

TEXTO Redação / Fontes: Coffee Magazine, Global Coffee Report e El País Costa Rica

Cafeteria & Afins

Caffè Tommaseo – Trieste (Itália)

Situada numa das áreas mais nobres de Trieste, perto da famosa praça Unità, a história do Caffè Tommaseo se confunde com a da cidade, que por muito tempo pertenceu ao Império Austro-Húngaro, apesar da maioria de sua população ser italiana. Fundado em 1830, o local se tornou ponto de encontro de intelectuais que lutavam pela liberdade italiana e de escritores, como o irlandês James Joyce e o poeta italiano Umberto Saba.

Mais antigo de Trieste, o Caffè Tommaseo tem arquitetura vienense e paredes decoradas com grandes e luxuosos espelhos belgas. É parada obrigatória para quem faz o “tour dos cafés”. Sim, Trieste é conhecida como a cidade dos cafés, com dezenas de cafeterias e dez torrefações, entre elas, a illycaffè, o que atrai centenas de turistas interessados em fazer uma imersão no universo cafeeiro.

Os triestinos são vidrados na bebida. Enquanto no Brasil o consumo per capita é de cinco quilos de café torrado e moído por cidadão ao ano, lá é o dobro. A paixão é tão grande que eles rebatizaram clássicos como espresso, que recebeu o nome de nero, enquanto o cappuccino é chamado de capo. Por sinal, em Trieste, o espresso reina soberano, os estabelecimentos não têm café filtrado e, quando você pergunta por ele, os italianos torcem o nariz.

Os grãos utilizados no blend do espresso da casa são provenientes de várias origens: Brasil, América Central, África e Ásia. O cardápio de café da manhã é servido das 9h ao meio-dia. Pedimos à garçonete dois combos “oferta especial”. No primeiro, veio um cappuccino, uma água e uma omelete de queijo com fatias de pão. No segundo, um espresso, uma água e um crepe de chocolate com frutas vermelhas. Detalhe: em lugar de um copinho com água com gás, como servido no Brasil, os pedidos vieram acompanhados de um copinho de chocolate 70%, servido em temperatura ambiente, que, segundo a atendente, é preparado pelo chocolatier da casa, um dos melhores da região.

O cappuccino e a omelete eram corretos, mas nada que mereça destaque. No capo, faltou a cremosidade, característica dos cappuccinos preparados com leites mais ricos em gordura. No entanto, o espresso acompanhado de crepe de chocolate com morango, mirtilo e groselha estava sensacional. No primeiro gole, o nero chamou atenção pela torra intensa, porém ainda distante da torra escura típica de Nápoles. Combinado à sobremesa, provocou uma explosão de sabores – a acidez da groselha, a doçura e o amargor do chocolate, tudo se equilibrava com o espresso.

Para fechar, pedimos duas bebidas especiais: o peratoner, feito com creme de avelã e cacau, espresso e nata batida, e o tommaseo coffee, bebida preparada com rum escuro, licor Morlacco, chocolate Peratoner, espresso, creme de leite fresco e xarope de baunilha (Peratoner é uma renomada confeitaria e chocolateria italiana, de Pordenone). A primeira está mais para uma sobremesa do que para bebida. É preciso comê-la de colher, degustando com calma, para apreciar as notas do creme de avelã e cacau, que não é nada doce e casa superbem com a nata batida e a acidez do espresso.

O tommaseo coffee é um desaforo de tão bom. O drinque desperta todas as papilas gustativas com sua combinação de bebidas alcoólicas, espresso, chocolate e xarope. É difícil pensar que tantos ingredientes juntos possam ter um resultado tão surpreendente e, de tão inusitado, é difícil descrever, mas vale (muito) a pedida.

Ao longo dos anos, o Caffè Tommaseo mudou de dono e, hoje, pertence ao mesmo grupo que comanda o Caffè degli Specchi e a confeitaria La Bomboniera, que fornece as guloseimas do local. Não por acaso, em qualquer horário de funcionamento, o visitante pode pedir um café ao lado de um doce de pasticceria, que combina bem com a temperatura amena da cidade, sempre visitada pelo Bora, um vento frio e forte característico de Trieste.

Nossa conta: € 31,50 (R$ 193,7) + taxa de serviço
Oferta especial 1 – combo de cappuccino, água e omelete de queijo = € 9,50 (R$ 58,4)
Oferta especial 2 – combo de espresso duplo, água e crepe de chocolate = € 10 (R$ 61,5)
Peratoner = € 6 (R$ 36,9)
Tommaseo coffee =w € 6 (R$ 36,9)

*O valor foi convertido levando em consideração a data da visita (€ = 6,15)

A equipe da Espresso visitou a casa anonimamente e pagou a conta.

Texto originalmente publicado na edição #87 (março, abril e maio de 2025) da Revista Espresso. Para saber como assinar, clique aqui.

Informações sobre a Cafeteria

Endereço Piazza Nicoló Tommaseo, 4
Cidade Trieste
País Itália
TEXTO Equipe Espresso • FOTO Equipe Espresso

Cafezal

Projeto reúne turismo e cafeicultura no Espírito Santo

Com dezenas de atrativos, Cafés do Espírito Santo divulga as belezas do estado e fomenta o café como destaque turístico

Foto: Camila Luz

Por Gabriela Kaneto, do Espírito Santo

De praias a montanhas, o Espírito Santo vive um momento promissor no turismo e na cafeicultura. Em 2023, segundo o Ministério do Turismo, o estado recebeu 450 mil viagens e gerou R$ 704 milhões. O movimento foi puxado por visitantes em busca de lazer, natureza, cultura e gastronomia. No quarto trimestre de 2024, a Setur (Secretaria de Turismo) registrou alta de 8,8% em relação ao mesmo período do ano anterior. 

A cafeicultura, principal atividade agrícola capixaba, também avança. Dados da Conab (Companhia Nacional de Abastecimento) mostram que, em 2024, o Espírito Santo – o segundo maior produtor de café do país e líder em conilon – colheu 13,9 milhões de sacas, 9,8 milhões delas de conilon. Para 2025, a previsão é de alta de 18,2%, chegando a 16,4 milhões de sacas.

Pedra Azul vista da Rota do Lagarto – Foto: Camila Luz

De olho nesse cenário, o empresário Washington Pereira, fundador da De Olho na Rua, criou o projeto Cafés do Espírito Santo, que une café e turismo em roteiros com mais de 180 atrativos. A inspiração veio após uma cliente voltar da Espanha com uma revista sobre pintxos (petisco típico do País Basco) e turismo de vinho. “Tinha uma foto do pessoal pisando nas folhas das parreiras. Rabiscamos por cima: isso poderia ser café. Aí caiu a ficha”, conta.

Em 2021, Pereira passou a estudar a produção local de café e notou que ela era majoritariamente familiar e artesanal. Percebeu ainda que uma mesma lavoura poderia gerar perfis sensoriais distintos, dependendo de fatores como altitude, sombreamento e pós-colheita. “Olhando um saco de juta, li ‘Cafés do Brasil’. Mas de onde do Brasil? O Brasil é muito grande”, lembra. 

Com uma exposição itinerante de mais de 200 embalagens de café, o projeto está em feiras e eventos para mostrar a diversidade da cafeicultura capixaba. Agora, a iniciativa, em estruturação, definiu três roteiros: o Coffee Tour (direcionado às pessoas que querem consumir cafés de qualidade e conhecer sua produção), o Coffee Stay (com hospedagem e vivências em fazendas, incluindo visita às plantações, degustações e oficinas) e o Coffee Tech (voltado ao turismo de negócios).

Washington Pereira e parte de sua exposição situada no Café Hall Sicoob – Foto: Camila Luz

“O café sempre foi a principal fonte de receita da região, mas muitas pessoas passaram a diversificar suas atividades por causa do turismo”, diz Cleto Venturim, presidente da cooperativa Sicoob Sul-Serrano, que mantém o projeto. “Valorizar o pequeno produtor é um trabalho que exige organização. Estamos colocando luz nesse movimento.”

A convite do Cafés do Espírito Santo, a Espresso saiu de São Paulo com destino à Vitória para três dias de imersão na cafeicultura e no turismo capixabas. Guiado por Pereira, o tour começou na capital e subiu as montanhas do Caparaó, nosso destino final. A seguir, nove atrações dessa viagem.

Grande Buda

Grande Buda de Ibiraçu – Foto: Camila Luz

Logo pela manhã, a primeira parada foi em Ibiraçu, a cerca de 70 km de Vitória. À beira da BR-101, ergue-se a monumental escultura de 35 metros inaugurada em 2021, que une arte, espiritualidade e paisagem natural. Parte do Mosteiro Zen Morro da Vargem, o espaço abriga ainda o Portal Torii, o Jardim Zen, o Lago da Serenidade e o Bosque da Sabedoria, além de sorveteria, cafeteria e loja de souvenirs. Ao lado da estátua principal, outras 15 esculturas de 2,5 m do Buda em meditação simbolizam serenidade e perseverança. É a maior representação do Buda na América Latina.

Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes) – Centro de pesquisa

No Campus Goiabeiras, em Vitória, um centro de pesquisa se dedica a estudar a química do café, explorando desde a composição do solo até as transformações na torra. Coordenado pela professora Emanuele Oliveira, que também dá aulas no Ifes (Instituto Federal do Espírito Santo), o laboratório analisa os compostos que influenciam o perfil sensorial da bebida, conectando ciência e sabor.

Emanuele Oliveira, coordenadora do laboratório (à esq.), e estudante do projeto (à dir.) – Fotos: Camila Luz

Criado em 2021, o laboratório faz parte do Coffee Design — grupo de pesquisa do Ifes, em Venda Nova do Imigrante, com 11 anos de atuação e 50 bolsistas, entre alunos da Ufes, Ifes e UFV (Universidade Federal de Viçosa). Cada polo foca em uma área: a Ufes se dedica à química, a UFV à microbiologia e o Ifes ao processamento, torra e análise sensorial. O objetivo é aprimorar as etapas por qual passa o café, até a xícara. “No café, tudo interfere, mas aqui tentamos entender os fatores para poder contornar situações”, explica Emanuele. Além de trabalhar com produtores parceiros no Espírito Santo, o grupo também coleta amostras de cafés de várias regiões do Brasil para pesquisa.

Terrafé

Nossa próxima parada foi na unidade conceito da Terrafé, na capital capixaba. Recebidos por Raul Guizeline, fundador da rede, e por Francisco Siqueira, barista, instrutor e responsável pelo marketing, conhecemos o espaço inaugurado há pouco mais de um ano. A marca atua desde 2014 e soma 14 unidades no Espírito Santo — com outras três previstas para abrir neste segundo semestre.

Loja conceito da Terrafé – Foto: Camila Luz

“Entendemos que o consumidor de cafés especiais não quer repetir sempre o mesmo café”, afirma Guizeline, ao explicar a carta de microlotes, que varia de 15 a 20 opções rotativas. Torrados pela própria Terrafé, os grãos vêm de regiões como Montanhas do Espírito Santo, Sul de Minas, Matas de Minas e Caparaó. “Nossa proposta é propagar o café capixaba, trazendo os melhores grãos e criando diversidade na prateleira”, completa Siqueira.

Foto: Camila Luz

Entre os destaques recentes está a caixa do campeão do Coffee of the Year: um arábica catuaí 785, lavado, cultivado por Paulo Roberto Alves, em Divino de São Lourenço (ES). Além da cafeteria, a loja conceito abriga um coffee bar para drinques, sala de cursos e workshops, espaço para reuniões e lounge para eventos sob reserva.

Khas Café

O segundo dia começou cedo. Pela Rota do Lagarto — trajeto turístico repleto de pousadas e que contorna a icônica Pedra Azul — chegamos à Khas Café. Há oito anos, a fazenda pertence a Roberta e Júlio Aguilar, que trocaram a vida na cidade para cultivar café nas montanhas. “Sou de Vitória e o Júlio é do norte do estado. Ele estudava agronomia na UFV e passava sempre por aqui para chegar à faculdade. Foi assim que se apaixonou pelo lugar”, conta a publicitária. Depois de adquirir a propriedade, o casal se especializou em cafés especiais e turismo de experiências. “Comecei a estudar o fruto e fiz curso de barista. O Júlio ficou com a produção, enquanto eu e a Dani [Daniela Aguilar, cunhada de Roberta] cuidamos da cafeteria e do turismo”, explica.

Roberta explicando sobre os processamentos de pós-colheita (à esq.) e degustação de cafés com quitutes regionais (à dir.) – Fotos: Camila Luz

Além da plantação de arábica, a Khás Café tem uma lavoura experimental com 25 clones (distribuídos em 500 pés) de conilon de altitude (1.100 m) – a variedade é, tradicionalmente, cultivada em baixa altitude – ideia do amigo e engenheiro agrônomo Fábio Partelli, da Ufes. “A partir desses clones será lançada uma nova cultivar, para ajudar os produtores a produzir um café bom tanto em produtividade quanto em bebida”, comemora Roberta. “Muitos já produzem conilon de altitude, mas o fazem empiricamente”, ressalta. “Quando lançamos uma cultivar, garantimos que o café vai ter qualidade. É bom para a ciência”.

Experimentos com conilon de altitude – Foto: Camila Luz

Na parte mais alta da fazenda, a cafeteria chama atenção pelo visual excêntrico e pela estrutura construída com materiais reaproveitados (upcycling). É o ponto final do roteiro Alquimia do Café, que atrai visitantes de todo o país para conhecer lavouras, etapas do pós-colheita e participar de harmonizações entre os dois tipos de café e comidas locais, de forma lúdica e pedagógica. “O objetivo é ensinar as pessoas a tomarem um bom café e mostrar as diferenças entre a produção de um especial e de um tradicional”, diz Roberta. “Queremos transformar o estado em um polo de experiência, pois produzimos de norte a sul”, afirma.

Fazenda Camocim

Reconhecida mundialmente pelos cafés especiais, a Fazenda Camocim, com mais de 150 hectares em Pedra Azul, distrito de Domingos Martins (ES), está ativa desde meados dos anos 1990, quando o empresário Olivar Araújo, superintendente do Grupo Sloper, iniciou o cultivo de cafés orgânicos na região. Hoje, a propriedade é administrada por seu neto, Henrique Sloper. “Vimos que o orgânico era o futuro da agricultura — e do café também”, diz.

Henrique Sloper, à frente da Fazenda Camocim – Foto: Camila Luz

A busca pela preservação ambiental fez da propriedade um refúgio para mais de 40 espécies de pássaros, entre elas o jacu, que prefere matas preservadas para se alimentar, fazer ninho e repousar. “Sem querer, viramos uma área de reprodução do jacu”, brinca o empresário. Inspirada no café kopi luwak da Indonésia, a Camocim adotou o jacu como parceiro e lançou o Jacu Bird Coffee, que ganhou fama no Brasil e no mundo.

Foto: Camila Luz

Desde 2023, a fazenda oferece turismo de experiência com visitas guiadas que acompanham todo o ciclo do café — do plantio ao envase —, culminando em degustação na Casa do Café, cafeteria moderna da propriedade. “Além de clima, altitude, conhecimento, tecnologia e pesquisa, aqui tem uma infinidade de ingredientes. Tem muita agricultura”, destaca Sloper sobre a região. “O Espírito Santo ainda está aprendendo a se vender. Juntando tudo isso, há uma solução para o turismo”, acrescenta.

Fazenda Carnielli

“O Espírito Santo ainda é relativamente pouco conhecido”, avalia Lorenzo Carnielli, quinta geração à frente da Fazenda Carnielli. Com mais de 100 anos no cultivo do café, a propriedade aprimorou sua produção a partir dos anos 1990. “Foi quando chegou a tecnologia, principalmente para o cereja descascado. Em 2001, ganhamos o primeiro concurso de cafés especiais do estado”, relembra.

Fachada da Fazenda Carnielli e Lorenzo Carnielli – Fotos: Camila Luz

Hoje, a fazenda cultiva seis variedades, entre elas catucaí, catuaí, mundo novo, arara e 785SL. “Fomos os primeiros malucos a colocar cafés especiais na prateleira do supermercado”, brinca ele. Desde 1987 recebe turistas, mas só em 2021 passou a agendar experiências. “Aqui o visitante conhece todo o processo: do pé de café ao descascamento, secagem, estoque, torra, degustação e produtos da fazenda — queijos, doce de leite, fubá e embutidos, como o socol, famoso na região”, conta. “O café está no centro da experiência. Tem coisa melhor que um queijinho com café?”.

Pousada Vovô Nininho

Após pegar a estrada rumo ao Caparaó, chegamos ao destino e passamos a noite em um dos charmosos chalés da Pousada Vovô Nininho. Situados no meio do cafezal, os dormitórios, inaugurados em 2021, combinam aconchego e design moderno, com café especial disponível para preparo no quarto e uma linda vista da plantação.

Chalés em meio ao cafezal na Pousada Vovô Nininho – Foto: Camila Luz

“Meu pai sempre foi apaixonado por café. Produzia um bom produto, mas vendia como commodity”, conta Roberta Medeiros. Após a morte do pai, ela e o marido, Nilton Martins, deixaram a vida de escritório para continuar a produção, criando a marca Vovô Nininho em homenagem ao patriarca.

Com estudos e aprimoramentos, passaram a cultivar café especial em 2017. “Decidimos que seria o melhor caminho. Fizemos cursos e unimos teoria e prática”, diz a produtora. Hoje são 10 mil plantas das variedades catucaí 2SL amarelo e catuaí 44 amarelo e vermelho, em uma lavoura a 1.350 metros de altitude. Todo o café produzido é comercializado na própria cafeteria da pousada e vendido para o Brasil pelo Instagram.

Foto: Camila Luz

Associação de Produtores de Cafés Especiais do Caparaó (Apec)

O Caparaó tem ganhado destaque nos últimos anos. Berço de produtores premiados em concursos de qualidade — como Afonso Lacerda, Deneval Miranda Vieira e o mais recente campeão do Coffee of the Year, Paulo Roberto Alves —, a região, com produção majoritariamente familiar, é denominação de origem para cafés especiais desde 2021.

Foto: Camila Luz

Localizada entre Espírito Santo e Minas Gerais, abrange 16 municípios — dez capixabas e seis mineiros — e produz cerca de 2,4 milhões de sacas de café, das quais apenas 10% são especiais. Criada em 2016, a Apec tem entre seus objetivos a gestão dessa Indicação Geográfica (IG).  “A função da associação é a proteção da marca não só no Brasil, mas no exterior também”, diz a cafeicultora Cecília Nakao, presidente da Apec. “Viramos referência em indicações geográficas. Muita gente quer vir conhecer nossa experiência. Somos muito criteriosos. Claro que ainda existem coisas amadoras, mas levamos a sério o que fazemos”.

Cecília Nakao, presidente da Apec – Foto: Camila Luz

Com cerca de 160 associados, há expectativa de crescimento. “Estamos fortalecendo a associação, entregando valor aos produtores para que eles estejam mais perto de nós, até para termos mais controle da qualidade do que estamos produzindo”, destaca a cafeicultora Ana Carolina Malta, da equipe administrativa da Apec. “A grande importância da IG é conscientizar e capacitar o produtor quanto ao produto, o mercado e mostrar a evolução dele a quem comercializa seu café”, salienta Gustavo Vilas Boas, também produtor e integrante da equipe. 

Ana Carolina Malta e Gustavo Vilas Boas na sede da Apec – Foto: Camila Luz

Parque Nacional do Caparaó

A última parada da jornada foi o Parque Nacional do Caparaó, uma das principais unidades de conservação do país. Criado em 1961, o parque abriga o Pico da Bandeira, com 2.891 metros, o terceiro ponto mais alto do Brasil.

Além das cachoeiras, mirantes e trilhas, o local oferece estrutura para camping e um centro de visitantes. A biodiversidade e a vista da cordilheira, com destaque para a famosa Pedra Menina, completam o cenário.

Entrada do Parque Nacional do Caparaó e vista para Pedra Menina – Fotos: Camila Luz

Entre a metrópole e as montanhas, o Espírito Santo se destaca como produtor de café de qualidade e destino turístico em ascensão. “Aqui está a maior variedade sensorial em um só território. Nosso objetivo é promover o café como atrativo turístico”, diz Pereira. Afinal, em cada xícara e paisagem capixaba, uma história é contada.

TEXTO Gabriela Kaneto • FOTO Camila Luz

Mercado

Concurso de embalagens Espresso Design abre inscrições

Estão abertas as inscrições para a 7ª edição da Espresso Design, concurso que premia as melhores embalagens de café disponíveis no mercado. As marcas interessadas em participar podem enviar seus pacotes até 3 de outubro. Acesse aqui o link de inscrição e o regulamento.

O concurso tem o objetivo de fortalecer o setor e destacar a importância do design e da embalagem para promoção de marcas e produtos. A comissão julgadora avalia cada embalagem/coleção considerando os seguintes quesitos: visual/identidade, eficiência, conceito, originalidade e criatividade.

As vinte embalagens mais bem pontuadas ficam expostas nos dois primeiros dias da Semana Internacional do Café (5 e 6 de novembro), para que o público da feira possa votar em sua favorita. As três com mais votos ganham troféus no último dia do evento (7 de novembro), em cerimônia de premiação no Grande Auditório.

TEXTO Redação

O poder transformador do cooperativismo

Em tempos de rápidas mudanças globais, em que desafios complexos exigem retornos inovadores e colaborativos, o cooperativismo é uma resposta poderosa e necessária. A declaração da ONU de 2025 como o Ano Internacional das Cooperativas, sob o tema inspirador “Cooperativas constroem um mundo melhor”, nos convida a redescobrir um modelo há muito defendido como um bastião de desenvolvimento sustentável e de crescimento socioeconômico. No Brasil, essa declaração ressoa de maneira especial, pois o café está profundamente enraizado na tradição do cooperativismo nacional.

A dimensão global do cooperativismo é impressionante. Mais de 1 bilhão de pessoas ao redor do mundo estão associadas a cooperativas, uma rede que gera milhões de empregos e sustenta economias em todos os continentes. No Brasil, o impacto é marcante, com mais de 23,4 milhões de associados em 2023, criando um efeito cascata positivo no agronegócio. No café existem em torno de 104 cooperativas que, juntas, respondem por cerca de 55% da produção total de café no país, evidenciando o impacto colossal deste modelo de negócios no setor.

O café tem uma cadeia de produção e comércio dinâmica e multifacetada, e o cooperativismo no setor tem papel fundamental. É por meio delas que pequenos produtores têm acesso a recursos indispensáveis, desde assistência técnica especializada até crédito com juros competitivos, todos elementos críticos para sustentar a qualidade e a robustez do café brasileiro.

Enquanto o cooperativismo continua a promover um desenvolvimento econômico e social harmonioso, torna-se cada vez mais premente que olhemos para o futuro com criatividade e determinação. Conferências globais, como a Aliança Cooperativa Internacional, realizada em Nova Delhi em novembro de 2024, e a COP30, prevista para novembro deste ano em Belém, são plataformas essenciais para discutir e explorar como as cooperativas podem utilizar tecnologias emergentes e práticas sustentáveis para enfrentar os desafios do século XXI. Este é um compromisso compartilhado que demanda nossa atenção contínua.

O Ano Internacional das Cooperativas serve como um convite à celebração e, ainda, como um impulso renovado para ações concretas. Para o setor cafeeiro, essa designação oferece uma oportunidade única de reafirmar compromissos com a inovação e as práticas sustentáveis, e de assegurar a resiliência diante de um cenário global dinâmico e, muitas vezes, volátil. Fortalecer redes de parcerias e ampliar a coesão cooperativa serão essenciais para gerenciar esses desafios.

Que 2025 seja um marco de renovação e crescimento, e que inspire novas iniciativas e solidifique as bases para o futuro. O cooperativismo, com sua capacidade inata de unir e transformar, nos oferece a oportunidade de redefinir o papel do café brasileiro na economia global, transformando sua história em um legado duradouro de progresso e solidariedade. Enquanto nos juntamos em cooperação, temos não só a chance de impactar a nossa geração como, também, as futuras.

Que cada xícara de café seja uma prova do poder do cooperativismo em promover mudanças positivas, ecoando histórias de cuidado, dedicação e visão compartilhada para um mundo melhor. É essa combinação de esforços coletivos que garantirá um futuro forte e sustentável para o café, o Brasil e o mundo.

Caio Alonso Fontes é formado em administração de empresas e é cofundador da Espresso&CO. Coluna publicada na Espresso #87 (março, abril e maio de 2025).

TEXTO Caio Alonso Fontes • FOTO Eduardo Nunes

A próxima crise na produção de café

Por Gustavo Paiva

As mudanças recentes na Etiópia, país de grande relevância no mercado do café, tanto no consumo como na produção, trazem muitas dúvidas para a sua política externa, já que o país vem demonstrando querer influenciar seus vizinhos e, até mesmo, buscar novos territórios.

O primeiro-ministro Ahmed Abiy não nega as ambições expansionistas, como tampouco esconde sua insatisfação com o fato do país não ter acesso ao mar e aos poucos recursos hídricos. A consequência disso é um aumento de tensões com os vizinhos do leste, por conta da saída para o Golfo de Aden, mas também com países ao norte, como Sudão e Egito, pelo controle dos recursos hídricos do Nilo.

Enquanto a Etiópia entende que a construção da Grande Barragem do Renascimento é vital para o seu desenvolvimento econômico, egípcios e sudaneses ficaram extremamente preocupados com a possibilidade de perder uma parte da água proveniente das montanhas etíopes.

Além disso, logo após a vitória do conflito na região do Tigray, novos conflitos internos emergiram nas regiões de Oromia e Amhara – nada menos do que duas das maiores regiões do país. Nestes casos, diferenças étnicas, baixa presença do governo e problemas econômicos são as principais causas de confrontos.

Em um primeiro momento, a desorganização e a instabilidade causadas por esses conflitos terão impacto direto na produção de café local, já que a região de Oromia é uma das principais produtoras do país e conta com uma das maiores cooperativas do mundo em número de associados.

Segundo, há uma grande questão quanto à exportação do café. Com uma logística que já é complicada em tempos relativamente estáveis, levando por volta de três semanas para exportar o café através do país vizinho, o Djibuti, a Etiópia segue dependente de um porto estrangeiro para escoar sua produção.

Terceiro, tanta instabilidade tem como consequência a dificuldade de planejar e investir na produção. A renovação dos cafeeiros do país se mostra urgente. E por último, a inflação, que é uma consequência direta de todos estes problemas. No país, a renda per capita, ajustada pelo poder de compra, é de US$ 3 mil anuais – pouco mais de dez por cento da renda brasileira, que atualmente está em US$ 20.500, segundo dados do Banco Mundial.

Portanto, mais um outro conflito ligado à uma saída etíope para o mar, envolveria Somália, Eritréia, Djibuti e se somaria a outras crises regionais, como as do Iêmen, do Irã e do Sudão, com a totalidade dos Estados da região em algum tipo de instabilidade.

Por ser um conflito aberto contra paramilitares internos em Oromia e Amhara, e um conflito não declarado com os vizinhos, a questão parece não levantar muito interesse internacional, talvez porque ainda não tenha afetado as rotas de navegação pelo mar Vermelho.

Mesmo que algo maior na Etiópia aconteça, o envolvimento de países externos tende a ser menor. Apesar de a Otan possuir três bases militares em Djibuti, o conflito ucraniano é a prioridade no momento. E os Estados Unidos têm se mantido indiferentes à situação na região desde a eleição de Donald Trump.

O presidente norte-americano tem sido enfático ao demonstrar sua falta de interesse em países do continente, com exceção daqueles que possam providenciar recursos naturais como petróleo, gás e terras raras, o que não é o caso da Etiópia.

Até agora, todas estas instabilidades parecem não alterar a cadeia do café etíope, já que, segundo estatísticas do Departamento de Agricultura dos Estados Unidos e da Organização Internacional do Café, a produção tem se mostrado resiliente, chegando até mesmo a aumentar nos últimos anos.

Se por um lado parece inevitável que o conflito escale, por outro a cadeia do café local parece se mostrar não só estável como próspera. Pode-se perguntar, portanto, se os agricultores locais possuem uma resistência heróica, se os envolvidos na cadeia local já aprenderam a trabalhar sob a pressão das crises ou se as estatísticas que demonstram um crescimento estão equivocadas. Nada impede que mais de uma alternativa seja correta.

Gustavo Magalhães Paiva é formado em relações internacionais pela Universidade de Genebra e é mestre em economia agroalimentar. Atualmente, é consultor das Nações Unidas para o café.

TEXTO Gustavo Magalhães Paiva

Mercado

Chás invadem cafeterias

Estabelecimentos brasileiros apostam em chás de origem e blends artesanais para criar experiências sensoriais e conquistar um novo público exigente

Foto: Studio Oz

Por Gabriela Kaneto

O café sempre foi protagonista no paladar dos brasileiros. Mas, nos últimos anos, cafeterias de qualidade têm visto mudanças nos pedidos dos clientes – e o café, que antes reinava absoluto, começa a dividir espaço com uma bebida milenar, que atravessou oceanos para chegar até aqui: o chá.

Variedades como verde, branco e preto, matcha (chá verde em pó) e blends artesanais aparecem cada vez mais nos cardápios – não como substitutos, mas como complementos ao café de qualidade – e despertam o interesse de um consumidor exigente, que busca por novas experiências sensoriais. “De uns tempos pra cá, tenho percebido que alguns clientes, que antes consumiam apenas café, estão começando a se interessar também pelo chá”, conta Rafaela Nascimento, barista e sócia do Coffee Five, no Rio de Janeiro (RJ).

Com uma década de experiência como instrutora, Rafaela começou a servir chá ao público em 2018, mas foi apenas após a pandemia que decidiu educar os consumidores sobre as diversas formas de consumo. “O que me motivou, e ainda motiva, é que o chá tem tudo a ver com o ambiente de café”, explica a barista. Para ela, as técnicas e as características sensoriais dos chás podem ser exploradas da mesma forma que no café. “Foi então que montei um cardápio com a aprovação da Yuri Hayashi e criamos o ‘tea café’, um cardápio de chás onde explico um pouco sobre este universo tão grandioso”, diz ela, referindo-se à sua mestra e fundadora da escola de chá Embahu, em São Bento do Sapucaí, no interior paulista.

Desde então, o menu do Coffee Five tem chás de diferentes origens (China, Japão e Brasil) e tipos (branco, amarelo, verde e preto), criações com ervas e especiarias e blends. “Acho mágico mostrar às pessoas o quanto essa bebida é rica”, anima-se a barista, que selecionou opções a partir de viagens que fez e de acordo com a época de colheita do produto.

Chá servido no Coffee Five, no Rio de Janeiro – Foto: Divulgação

Segundo dados da Euromonitor, entre 2019 e 2023, o mercado global de chás cresceu 43%, chegando a movimentar R$ 1,5 bilhão ao ano. “O interesse por chás vem crescendo consideravelmente, especialmente nos últimos cinco anos, com um impulso ainda maior durante a pandemia”, analisa Benício Coura, especialista em chás e CEO da Chá Dō, e-commerce que fornece o produto para para pessoas e cafeterias. “A busca por hábitos mais saudáveis foi um dos principais motores dessa mudança”, acredita ele. Outro motivo, continua, é a busca por experiências sensoriais diversas. Atualmente, a oferta de chás da Chá Dō passeia por vários países, como Japão, China, África do Sul, Sri Lanka, Alemanha e Brasil.

Para Coura, há hoje em dia mais espaços que destacam a bebida, como casas especializadas, cafeterias, que a incluíram no cardápio, e restaurantes, que passaram a valorizar harmonizações com o produto.

“O mercado de chás no Brasil vem crescendo a cada ano”, concorda Hesli Carvalho, proprietário da cafeteria HM Food Café, que serve a bebida em suas duas unidades paulistanas, nos bairros de Pinheiros e República. “Quando eu era mais jovem, passava boa parte do tempo no sítio dos meus avós, em Minas Gerais. Era bem frio à noite e sempre tínhamos uma bebida quente à mão, ora um leite com açúcar queimado, ora um chá”, lembra. Com o tempo, o hábito virou paixão, e o empresário aprofundou-se cada vez mais no assunto. “Me formei sommelier de chás pela Academia Brasileira de Chá e Mate, da Carla Saueressig, uma das pioneiras no Brasil”, comemora.

Chás servidos no HM Food Café, em São Paulo – Foto: Divulgação

E por que não apresentar esse outro universo aos clientes? “Quando abrimos o café, tinha certeza de que trabalharia com chás e infusões”, diz Carvalho. Hoje, o menu oferece chá verde japonês e chinês, oolong chinês e chá preto do Sri Lanka, além de blends com rooibos (infusão feita com a planta rooibos, popular na África do Sul) e drinques. “Temos uma carta de chás de primavera/verão que atualizamos para o outono/inverno”, comenta ele, destacando drinques como o mocktail (não alcoólico) de rooibos com limão e água com gás e o matcha com leite vegetal e calda de morango, sucessos na casa.

A escolha dos itens contempla o que há disponível no mercado (que, por sua vez, depende da colheita), e o que a cafeteria quer oferecer. “Temos mais de 13 bebidas entre chás e infusões, e isso é motivo de orgulho para nós”, conta Carvalho.

Outra cafeteria que aderiu à tendência é a 002 Café, em Brasília (DF). “O chá sempre esteve no nosso radar como bebida que faz parte da pausa na rotina”, conta Laís de Queiroz, barista, gerente de marketing e co-fundadora da casa. A cafeteria, inclusive, foi originalmente batizada como 002 Café e Chás Especiais. Com o tempo e para tornar o nome mais curto, retirou a menção aos chás, mas os manteve no cardápio. “Nossa ideia é colocar chás e cafés em pé de igualdade. O chá, como bebida, também pode ser estimulante e intrigante”, acredita ela, que oferece um leque de opções que varia entre matchas, blends com chá preto e com genmaicha (chá verde japonês feito com arroz tostado), e puros de oolong e puehr (fermentado), ambos de origem chinesa. “Nossos clientes de chá são diferentes dos clientes de cafés, mas, em sua maioria, também são tão exigentes quanto”, comenta Laís, referindo-se ao nível de conhecimento de seu público com relação aos chás.

Assim, diz Laís, o processo de escolha precisa ser cuidadoso, como acontece com os grãos. “Pensamos no sensorial ou nas opções que combinam mais com as estações. Temos fornecedores tanto para desenhar os blends quanto para selecionar os puros, mas sempre buscamos ter chás de vários lugares do Brasil e do mundo”, explica.

Chá oferecido na cafeteria 002 Café, em Brasília – Foto: Divulgação

Na capital mineira, o Elisa Café oferece opções de chás desde a inauguração, em 2021. “Queremos que as pessoas que ainda não consomem café de especialidade também sejam acolhidas em nossa cafeteria”, explica Ana Elisa Saldanha Alves, CEO e proprietária da cafeteria. A carta atual disponibiliza chás branco, verde e preto, cultivados na China, além de bebidas quentes e geladas com matcha – que, segundo Ana, fazem sucesso entre o público jovem. “O brasileiro tem a cultura do café no dia a dia, em vários momentos. Porém, o matcha vem se desenvolvendo bastante entre o público jovem”, acredita.

A onda verde

Para Laís e Rafaela, o crescimento da oferta de chás em cafeterias começou com o matcha. “A procura por ele só aumenta”, observa Rafaela. “Bebidas com matcha e o próprio matcha ganharam mais espaço nos últimos anos”, reforça Laís. O pó fino, feito com as folhas da Camellia sinensis, caiu recentemente no gosto do público em vários países. Basta olhar o cardápio de qualquer cafeteria de qualidade para achá-lo em versões quentes ou geladas, com leite ou como ingrediente em cookies, bolos e drinques.

A versatilidade do matcha é uma das razões para o aumento acelerado de seu consumo. “O fato de ser pó quer dizer que você pode utilizá-lo na gastronomia, nos ingredientes secos, como farinhas, e nos líquidos”, esclarece Alvaro Dominguez, fundador e diretor da Namu Matcha, marca brasileira dedicada exclusivamente ao produto.

A influência das redes sociais e o crescimento da busca por alternativas funcionais também impulsionam o consumo do matcha. “A cada ano a demanda praticamente triplica”, comenta Dominguez. O matcha tem teor maior de antioxidantes e de cafeína se comparado aos chás infusionados, o que o torna atrativo para quem procura aumentar o foco e ganhar energia de forma natural. “Por ter a folha moída, o matcha tem uma quantidade de antioxidantes ainda maior. Você não está fazendo uma infusão, está basicamente consumindo a folha inteira”, explica ele.

Linha de matchas da Namu Matcha – Foto: Agência Ophelia

Por outro lado, o efeito da cafeína no matcha e nos chás é diferente do obtido quando se toma uma xícara de café. Isso porque as folhas da Camellia sinensis tem, ainda, L-teanina, um aminoácido não essencial que ocorre quase exclusivamente nelas. Estudos científicos recentes sugerem que a L-teanina e a cafeína, quando consumidas juntas, podem ter efeitos sinérgicos na melhora de atenção, foco e desempenho cognitivo, com a L-teanina atenuando os efeitos colaterais estimulantes da cafeína.

Antes de virar tendência no Brasil, o matcha já fazia sucesso na América do Norte e na Europa. De olho neste movimento, o empresário brasileiro Bruno Prieto decidiu atravessar o oceano para explorar esse mercado. “Durante minha viagem pela Europa, percebi que o matcha está inserido na rotina das pessoas, especialmente em cidades com uma cena de cafés mais sofisticada. O consumo não se limita a uma moda passageira, mas vem acompanhado de uma valorização da origem, do tipo de cultivo e da variedade”, diz Prieto.

Em janeiro, Prieto fundou a Kyubu Matcha em Lisboa, marca dedicada ao matcha orgânico japonês. “Portugal tem se mostrado muito receptivo a novas experiências ligadas ao bem-estar, à estética e à alimentação consciente”, analisa o empresário. “Existe uma abertura para produtos que carregam história e sofisticação, o que se alinha com a proposta do matcha cerimonial japonês”, acredita. Para Prieto, a vizinha Espanha já tem marcas e espaços voltados exclusivamente para a venda de bebidas e comidas com o produto. “Daí se vê o grande potencial para isso acontecer também em Portugal”, projeta ele, que apresentou a Kyubu aos brasileiros em junho, durante o São Paulo Coffee Festival.

De acordo com Prieto, o público europeu é mais maduro do que o brasileiro para o consumo de chás. “O mercado europeu trata o chá como uma bebida com identidade própria. Há mais educação, mais opções de preparo e um entendimento maior sobre a diversidade de chás e infusões disponíveis”, explica ele. “Os consumidores estão mais acostumados a pagar por qualidade, entender as origens e explorar novos sabores. E o matcha pode servir como uma ponte para uma cultura mais ampla de chás”, acredita.

Um futuro com mais chá na xícara

Seja pelas características sensoriais, pelos benefícios à saúde ou pela curiosidade por novas experiências, o chá vem conquistando espaço nas cafeterias brasileiras. “Assim como o café evoluiu de uma bebida genérica para um universo de microlotes e perfis sensoriais, o chá pode seguir o mesmo caminho”, afirma Prieto. Ele acredita que, para expandir o mercado, é fundamental investir em comunicação e em experiências bem construídas. “Assim, outras variedades de chá também podem ganhar espaço, principalmente entre um público mais jovem e atento às tendências”.

Rafaela também acha que a educação tem um papel importante, dentro e fora do balcão. “Um dos maiores desafios é encontrar mão de obra qualificada, tanto para explicar bem o produto para o cliente quanto para saber escolher chás realmente bons para servir”, explica. Por outro lado, ela comemora a aproximação das marcas de chás do universo do café. “Até na Semana Internacional do Café [evento de café que acontece anualmente em Belo Horizonte] já vemos estandes de chás, algo que não existia antes da pandemia”, lembra. Para Ana Elisa, os chás são uma oportunidade de negócio, mas, sem conhecimento e treinamento dos colaboradores, não há vendas. “Há oportunidades, desde que a cafeteria se especialize no assunto e crie a rede de educação para levar conhecimento ao consumidor”, pondera.

Carvalho concorda que a falta de conhecimento de empreendedores e baristas é uma barreira a ser ultrapassada para a popularização dos chás nas cafeterias. “O processo operacional é idêntico ao do café: água, temperatura e peso. Não muda nada”, comenta. Para ele, apesar de tímida no Brasil, a tendência veio para ficar. “O futuro já é agora. Pensar em uma cafeteria de especialidade sem pelo menos um bom chá já está no passado”, opina. “Seja do ponto de vista econômico, diferencial de mercado ou de qualidade. Afinal, o mesmo cuidado com o café deveria se refletir em todos os aspectos da cafeteria, não é?”, provoca.

Chás servidos no HM Food Café, em São Paulo – Foto: Divulgação

É por isso que Dominguez investe, também, em workshops e treinamentos sobre o produto, além de participar de bate-papos em eventos de gastronomia. “Com essa educação que nós e outros empreendedores de chás oferecemos para os estabelecimentos de alimentos, está se criando uma categoria de chás nos cardápios, e o dono da cafeteria, o head barista e o público passam a entender o valor de tomar um chá bem feito”, comenta. “Acredito que a perspectiva é positiva não só para o matcha, mas para os chás em geral. Se todo mundo fizer seu trabalho direitinho e educar seus clientes, será algo facilmente integrado à cultura brasileira”, acredita.

“O cliente deve entender que, assim como o café, o chá puro pode oferecer notas sensoriais sem que haja a necessidade de adicionar outros produtos”, diz Laís. Para ela, a tendência daqui para frente é de crescimento e de novas oportunidades, especialmente quando o assunto são bebidas prontas para beber. “Se o mercado de chás caminhar para o mercado de wellness, podemos esperar bastante coisa boa vindo por aí”, aposta ela.

Coura também acredita que as opções ready-to-drink (RTD) são fundamentais para a expansão do mercado. “A tendência é de crescimento, com fórmulas mais naturais, sofisticadas e voltadas ao público que quer praticidade sem abrir mão de qualidade”, diz o especialista, que também menciona pontos como a valorização dos chás nacionais e a criação de blends autorais na personalização da experiência. “Há um resgate do que é nosso, com produtores investindo em qualidade, identidade de origem e métodos mais refinados de processamento”, comenta Coura. “Seja por meio de curadorias mais afinadas ou da conexão direta com o produtor, tudo caminha ao lado de uma exigência cada vez maior por transparência e sustentabilidade em toda a cadeia”.

História milenar

Segundo uma lenda chinesa, foi em 2.737 a.C. que o imperador Shennong, o “divino agricultor”, descobriu os benefícios do chá. Ele aquecia certa quantidade de água, purificando-a para bebê-la, quando folhas de um arbusto caíram no recipiente. Atraído pelo aroma, o imperador provou a infusão e surpreendeu-se com o sabor, a energia e o bem-estar dados pela bebida. Dezenas de séculos depois, esse arbusto seria classificado como Camellia sinensis.

A maneira de se consumir chá na China foi se transformando ao longo do tempo e também chegou ao Japão. “A história do chá no Japão é muito ligada ao intercâmbio cultural entre os dois países”, explica Paula Braga Batista, engenheira agrônoma, especialista em chás e conselheira de chá japonês, título concedido pela Nihon cha Kyokai (Associação de Instrutores de Chá Japonês). Segundo ela, foi por volta de 1.190 que monges japoneses viajaram à China para aprender sobre zen budismo. “Eles viram que os monges chineses conseguiam ficar longas horas meditando sem se cansarem e que, ao lado deles, havia sempre um copo com um líquido verde”, conta a especialista. Os monges japoneses retornaram ao Japão carregando sementes de Camellia sinensis para cultivar no país, propagando, assim, a cultura do chá.

O que define os diferentes chás é seu processamento pós-colheita, que envolve fenômenos como oxidação. O resultado são seis tipos: verde, branco, preto, amarelo, oolong e escuro (fermentado). Segundo Paula, há, também, variações, dependendo das características da região de cultivo, como altitude, temperatura e solo. “Muitas diferenças entre os chás verdes chinês e japonês, por exemplo, vêm do local onde são processados e das técnicas utilizadas. No produto final, o que conta mais é o processamento feito naquele terroir do que o solo”, detalha.

Além da China, maior produtor da Camellia sinensis var. sinensis – uma das variedades mais importantes de chá –, há um cultivo significativo na Índia da variedade assamica (Camellia sinensis var. assamica). No Brasil, há plantações de chá em Registro, no interior paulista. Paula explica que foram duas as tentativas de implementação do chá no país. A primeira com a corte portuguesa em 1808, quando as sementes foram trazidas e plantadas em diferentes regiões (Bahia, Rio de Janeiro, São Paulo e Minas Gerais). “Mas eles trouxeram a variedade chinesa, que não se adaptou ao nosso clima”, explica. A segunda ocorreu com a imigração japonesa, em 1908, quando um imigrante, em uma de suas viagens ao Japão, parou no Sri Lanka e conheceu a variedade assamica. Ele começou a cultivá-la em Registro, um dos principais pólos da imigração japonesa no país. “A assamica deu certo, pois ela é mais adaptada à temperatura e ao clima que temos aqui”, conclui.

O Brasil produtor

Hoje em dia, Registro é referência na produção de chás. “Na década de 1980, a cidade chegou a ter mais de 40 fábricas”, relata Paula. O sucesso levou a Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo a conceder a Registro, em 1984, o título de Capital Estadual do Chá. A partir dos anos 1990, devido à
concorrência internacional e às mudanças econômicas do país, a cidade do Vale do Ribeira diminuiu sua produção.

Ainda hoje, famílias se dedicam ao cultivo de chá na região, como é o caso da Chás Amaya, uma das empresas familiares mais antigas do segmento no Brasil. Sua história começou em 1919, quando Shutekishi e Nao Amaya, com seus filhos, saíram do Japão e desembarcaram no Rio de Janeiro em busca de oportunidades. A família se estabeleceu em Registro e começou o plantio de chá preto na década de 1930. Atualmente, sob os cuidados da terceira geração, a Chás Amaya produz chás especiais preto e verde da variedade assamica, cuidando desde o plantio até o produto final: colheita, limpeza das folhas, secagem, moagem, oxidação (se necessário), secagem final, seleção e empacotamento. “Nossa técnica de produção é mecanizada no plantio, na colheita e no processamento industrial”, conta André Luis de Freitas, responsável pelo setor comercial da Amaya.

Produção de Camellia sinensis na Chás Amaya – Foto: Chás Amaya

A partir de 2013, a empresa encerrou as exportações e dedicou-se ao mercado interno. “Nosso foco é atender grandes marcas, como Coca-Cola do Brasil, Chás Real e Mandiervas. Mas também temos nossa marca”, explica Freitas, que comenta que a Amaya também fornece para cafeterias e e-commerces, como a Chá Dō. De olho no futuro, ele aposta no aumento da demanda brasileira pela bebida e alimenta boas expectativas para os próximos anos. “O chá é mais do que uma simples bebida, sua versatilidade de preparo atende pessoas de todos os gêneros e idades”, diz ele, que percebe a tendência nas cafeterias. “Vemos um futuro promissor que vai muito além do modelo tradicional do chá apenas nas gôndolas de supermercados”, diz.

Texto originalmente publicado na edição #88 (junho, julho e agosto de 2025) da Revista Espresso. Para saber como assinar, clique aqui.

TEXTO Gabriela Kaneto
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