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Três regiões mineiras se destacam no 34º Prêmio Ernesto Illy de Qualidade do Café

A illycaffè realizou a cerimônia de premiação do 34º Prêmio Ernesto Illy de Qualidade Sustentável do Café para Espresso na noite de ontem (09), em São Paulo (SP). Minas Gerais foi o destaque da edição, com os três vencedores vindos das regiões Matas de Minas, Chapada de Minas e Sul de Minas.

Dimas Mendes Bastos (Matas de Minas), Fazenda Sequóia (Chapada de Minas) e Leda Terezinha Castellani Pereira Lima (Sul de Minas) vão representar o Brasil no 10º Prêmio Internacional de Café Ernesto Illy, que será realizado em Roma, no segundo semestre, e que reúne 27 cafeicultores selecionados de 9 países que fornecem grãos para a illycaffè.

Durante a premiação, também foram revelados os produtores vencedores regionais (Cerrado Mineiro, Chapada de Minas, Matas de Minas, Sul de Minas, São Paulo e Região Sul) e os ganhadores do Prêmio Classificador do Ano. 

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Café regenerativo pode aumentar a renda dos agricultores em 62%, aponta pesquisa

Estudo internacional aponta que práticas regenerativas podem elevar a renda dos cafeicultores brasileiros, reduzir emissões e impulsionar exportações

O Brasil participou de um estudo global, conduzido pela organização internacional TechnoServe, que destaca os benefícios da agricultura regenerativa na produção de café arábica e robusta. O relatório, intitulado “Regenerative Coffee Investment Case” e publicado em abril, analisa nove dos principais países produtores de café e revela como práticas agrícolas sustentáveis podem transformar a cadeia produtiva do setor. 

Além do Brasil, o relatório fornece uma análise detalhada do Vietnã, da Colômbia, de Honduras, Indonésia, Uganda, Etiópia, Peru e Quênia, abrangendo fazendas que produzem cerca de 70% do café mundial.

A iniciativa contou com o apoio de parceiros, como as multinacionais Nestlé e JDE Peet’s, além da Fundação Rudy & Alice Ramsey. Essas colaborações foram fundamentais para viabilizar a pesquisa e promover a adoção de práticas regenerativas em larga escala. 

O estudo aponta que, no Brasil, a implementação de práticas agrícolas regenerativas pode resultar em um aumento de até 62% na renda dos pequenos produtores de café, melhorando significativamente sua qualidade de vida e estabilidade financeira. Também registra uma redução de até 46% nas emissões de gases de efeito estufa, contribuindo para a mitigação das mudanças climáticas e, ainda, um incremento de 30% nas exportações de café, impulsionado pela melhora na qualidade e sustentabilidade do produto.

Além disso, o relatório destaca que a transição para práticas regenerativas no Brasil exigiria um investimento médio de US$ 560 milhões por ano durante sete anos, destinado a assistência técnica e financiamento para apoiar os pequenos produtores.

O estudo da TechnoServe no Brasil avaliou o impacto da agricultura regenerativa a partir da modelagem de diferentes perfis de pequenos produtores, com base em produtividade, área cultivada e acesso técnico. Utilizou simulações técnico-econômicas para estimar os efeitos da transição sobre produtividade, custos, renda e emissões, com apoio de dados primários, entrevistas com especialistas, fontes públicas e referências de boas práticas agrícolas.

Impacto global da agricultura regenerativa

Em termos globais, o estudo da TechnoServe revela que a adoção de práticas regenerativas – como cobertura do solo com plantas de cobertura, adubação orgânica e compostagem e manejo integrado de nutrientes – tem o potencial de beneficiar 3,2 milhões de pequenos produtores, aumentar as exportações em US$ 2,6 bilhões e reduzir as emissões em 3,5 milhões de toneladas de CO₂ por ano. Esses números evidenciam o potencial transformador da agricultura regenerativa não apenas para o Brasil, mas para toda a cadeia global de produção de café.

O relatório da TechnoServe, porém, reforça a importância de investimentos estratégicos e parcerias colaborativas para promover uma agricultura mais sustentável e resiliente. 

TEXTO Redação

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SCA e Federação Colombiana fecham parceria para cafés especiais

Anunciado na Specialty Coffee Expo 2025, acordo prevê uso da metodologia CVA para avaliar o valor do café colombiano, com foco em rastreabilidade, diferenciação e conexão com as tendências globais do mercado

A Associação de Cafés Especiais (SCA) e a Federação Colombiana de Cafeicultores (FNC) assinaram um Memorando de Entendimento (MoU) com o objetivo de aprimorar a rastreabilidade, a diferenciação e o reconhecimento global dos cafés especiais colombianos.

A parceria, anunciada na Specialty Coffee Expo 2025, em Houston, concentra-se na implementação da metodologia de Avaliação do Valor do Café (CVA) da SCA no setor cafeeiro do país. A FNC treinará equipes técnicas e provadores na aplicação da CVA, integrará a coleta de dados na origem e explorará uma adoção mais ampla dos cafés colombianos. A SCA apoiará esse esforço com assistência técnica, treinamento, aplicação personalizada da CVA e promoção global dos resultados.

Germán Bahamón, CEO da FNC, enfatizou o impacto potencial desta colaboração, afirmando que a adoção de ferramentas inovadoras como a CVA abre caminho para um maior reconhecimento e alinhamento com as preferências do mercado, beneficiando os cafeicultores colombianos.

O acordo inclui, ainda, o desenvolvimento de uma plataforma digital dedicada ao café colombiano, a fim de aprimorar o rastreamento de dados, a análise e a comunicação dos atributos do café. Além disso, a SCA colaborará com a FNC compartilhando dados da CVA para informar os produtores colombianos sobre as tendências e preferências do mercado em evolução.

TEXTO Redação / Fontes: Comunicaffe International, SCA, Qahwa World

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Flores de conilon podem virar chá e diversificar a renda do cafeicultor, aponta estudo

Pesquisa brasileira publicada na revista Foods revela o potencial sensorial e funcional das infusões feitas com flores desta variedade de Coffea canephora, ricas em compostos bioativos

As flores de café da variedade conilon são uma matéria-prima promissora para a produção de infusões, segundo estudo brasileiro publicado na revista científica Foods de março (a referência completa ao trabalho está no final da reportagem).

O estudo – que analisou flores secas de seis genótipos diferentes de conilon e que é um dos primeiros do gênero – chegou a resultados que apontam para o potencial sensorial e funcional da infusão das flores desta variedade de canéfora. “As infusões possuem aroma e sabor extraordinários, e, portanto, tem potencial para ser usado para um chá de ótima qualidade”, diz o engenheiro agrônomo Fábio Luiz Partelli, doutor em produção vegetal e um dos autores do estudo.

Muitos compostos que impactam o aroma e o sabor do café também trazem benefícios para a saúde, podendo ajudar na prevenção ou tratamento de doenças (os denominados compostos bioativos). São eles a cafeína, a trigonelina e os ácidos clorogênicos (AGC) – estes últimos, um subgrupo dos ácidos fenólicos – que funcionam como antioxidantes e têm ações antiinflamatórias.

Na pesquisa, os cientistas identificaram 38 compostos orgânicos voláteis  – responsáveis por aromas como amadeirado, herbal e floral — nas infusões (nas flores secas, este número salta para 85), e um menor teor de cafeína, se comparado ao teor encontrado nos grãos do café. Esses teores, porém, variaram de acordo com o genótipo da flor, mas, em geral, foram bem extraídos e em quantidade substancial.

De acordo com os autores do artigo, o estudo se insere num contexto de busca crescente por novos produtos alimentares de origem vegetal e um interesse cada vez maior por subprodutos do café. Por isso, abrem caminho não só para a diversificação da cadeia cafeeira, mas, também, para o aproveitamento de subprodutos dela, geralmente descartados.

“Estamos há anos estudando a diversidade do café conilon, considerando a parte agronômica, como produção, tolerância e rendimento”, explica Partelli, que trabalha no Departamento de Ciências Agrárias e Biológicas da Ufes (Universidade Federal do Espírito Santo), e que compartilhou seu desejo de investigar a diversidade química da variedade com colegas da UFRJ (Universidade Federal do Rio de Janeiro). “Essa equipe do Rio fazia alguns trabalhos com chá, daí conversamos e vimos que seria bacana estudar esse potencial em flores de canéfora”, diz ele.

Partelli – que desconhece qualquer produção comercial de infusão de flores de canéfora – acredita que a bebida pode ser mais uma fonte de renda para o produtor, principalmente se ele estiver envolvido com turismo rural. “Quem sabe um dia podemos exportar chá de flores de café para a China ou a Inglaterra”, diz ele.

O pesquisador reforça, porém, que o trabalho é inicial, e há alguns desafios a vencer, como definir os melhores genótipos (clones), a melhor temperatura e tempo de secagem das flores, a embalagem e principalmente, os desenvolvimentos necessários para transformá-lo num produto.

Para saber mais:

Juliana de Paula, Sara C. Cunha,Fábio Luiz Partelli, José O. Fernandes and Adriana Farah. “Major bioactive compounds, volatile and sensory profiles of Coffea canephora flowers and infusions for waste management in coffee production”. Foods, 14(6), 911.

TEXTO Redação

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Vinho é a nova aposta de cafeicultores brasileiros

Em regiões cafeeiras, produtores encontram no vinho uma nova forma de explorar o terroir e impulsionar o turismo

Por Cristiana Couto

Em regiões conhecidas pela produção de cafés de qualidade, como Cerrado Mineiro, Sul de Minas, Chapada Diamantina e Região do Pinhal, um novo cultivo vem ganhando espaço: o de uvas para vinhos finos. Graças à combinação de solo, clima e manejo inovador das uvas viníferas, cafeicultores investem na vitivinicultura e desafiam a lógica de que café e vinho não podem dividir o mesmo território.

A Espresso ouviu produtores que conciliam os dois cultivos e enólogos que acompanham essa transformação. Com a adaptação das videiras ao ciclo produtivo tropical, as fronteiras do vinho brasileiro se expandem – e, da mesma maneira, cafeicultores enxergam no cultivo de uvas uma oportunidade de diversificar seus mercados.

Terroir

Termo francês consagrado no mundo do vinho, o terroir reflete a complexa interação entre solo, clima e manejo humano, que determinam as características únicas de cada safra e influenciam diretamente a identidade da bebida.

Em sua caminhada rumo à excelência na xícara, os cafés de qualidade adotaram diversos aprendizados e incorporaram outros tantos conceitos desse universo, e o terroir não ficou de fora. É ele a chave de compreensão para a transformação que vem revolucionando, há duas décadas, o cenário do vinho brasileiro e que está, cada vez mais, entrelaçando-se à identidade sensorial e à valorização de origem do café.

Anos atrás, interessados por vinhos aprenderiam em sala de aula que eles são produzidos em zonas temperadas, enquanto cafés prosperam em climas tropicais. Manejar videiras e cafezais na mesma região – que dirá na mesma fazenda – era impensável até então. Mas paradigmas existem para ser quebrados.

A razão é a dupla poda, manejo que interfere no ciclo de vida das videiras e resulta na produção de vinhos de qualidade em regiões antes consideradas inadequadas. Também denominada poda invertida, a técnica, desenvolvida no Brasil no início dos anos 2000 sob a liderança do pesquisador Murilo de Albuquerque Regina (saiba mais ao fim da reportagem), consiste em fazer duas podas na videira ao ano, o que permite colher uvas no inverno brasileiro (entre maio e agosto) e não no verão, como acontece tradicionalmente no país. Nesta época, em áreas de altitude do sudeste e do centro-oeste, as chuvas de verão prejudicam a qualidade das uvas, ao permitir, por exemplo, o aparecimento de doenças fúngicas.

Mas o manejo dos chamados vinhos de inverno não faz milagre sozinho. “Não adianta plantar videiras na Amazônia e fazer dupla poda, porque lá não existe clima adequado”, lembra o enólogo chileno Christian Sepúlveda, referindo-se aos dias ensolarados e noites frias, comuns nas regiões de altitude no sudeste e centro-oeste do país, e aos solos secos no outono e no inverno, ou seja, à umidade relativa muito baixa.

“Onde se faz café de qualidade faz-se também vinho de qualidade, desde que os dois amadureçam na mesma época e tenham o ciclo de amadurecimento influenciado pelas mesmas condições climáticas”, ensina Murilo Regina, que foi coordenador do Núcleo Técnico Uva e Vinho na Empresa de Agropecuária de Minas Gerais (Epamig) à época da criação do protocolo da dupla poda. Condições essas que influenciam de forma positiva o amadurecimento tanto da uva quanto do café, atuando na formação e acúmulo de açúcares, na degradação de ácidos e no metabolismo de elementos fenólicos e aromáticos, responsáveis pelas qualidades sensoriais das duas bebidas.

A colheita segue a mesma lógica. “É interessante colher o café quando não chove”, lembra Frederico Novelli, consultor de vitivinicultura da empresa Floeno, referindo-se à sanidade dos cafezais. Novelli lembra que a produção cafeeira na Serra do Rio de Janeiro diminuiu porque chuvas frequentes, mesmo no inverno, favoreciam a fermentação indesejada dos frutos, resultando em cafés de qualidade inferior. “Grandes regiões vitivinícolas do mundo, como Bordeaux, Borgonha e Priorato, têm características de clima muito parecidas com as das regiões dos nossos bons cafés, seja São Paulo, Rio de Janeiro ou Minas Gerais”, emenda. “O que o manejo de dupla poda fez foi transferir a colheita da uva para o inverno, e as regiões mais apropriadas para plantá-las, coincidentemente, eram as mesmas do café”, resume ele, que dá consultoria a produtores de vinhos em áreas cafeeiras mineiras como Patrocínio, Patos de Minas, Lavras e Araxá. “Quando começamos a fazer vinhos de inverno, já tínhamos um mapa pré-traçado pelos produtores de café”.

Assim, os dois cultivos, até então dissociados, começaram a se estabelecer lado a lado. “Ninguém arranca café para plantar uvas”, afirma Sepúlveda. “Vinho e café não concorrem por terras agrícolas”, esclarece Murilo Regina. Segundo ele, o café ocupa as áreas mais altas dos morros, onde a incidência de geadas (às quais ele é sensível) é menor, enquanto as videiras se adaptam melhor às áreas de baixadas. Portanto, as duas culturas não concorrem por espaço e conseguem expressar seu potencial qualitativo no mesmo território.

Novos territórios

Recortada por vales e montanhas, a Serra da Mantiqueira, que se estende por São Paulo, Minas Gerais e Rio de Janeiro, é um dos territórios mais propícios à produção de cafés. Próximo a essa região montanhosa e na divisa com terras mineiras está o município paulista Espírito Santo do Pinhal, um dos oito a integrar a indicação de procedência (IP) de cafés Região de Pinhal, obtida em 2016.

A interseção dos fatores naturais – altitudes entre 850 e 1.300 metros e dias quentes e noites frescas – aliada à técnica da dupla poda colocou o município, há vinte anos, no mapa dos novos territórios brasileiros do vinho.

“Produzir vinhos aqui virou uma oportunidade para os que gostam da bebida e uma diversificação para os cafeicultores”, acredita Mariana Del Guerra. Q-Grader e torrefadora, Mariana e o marido, o engenheiro agrônomo especialista em café e sustentabilidade e consultor da Plataforma Global do Café Eduardo Sampaio, conduzem há quatro anos, ao lado de dois sócios, a vinícola Les Amis de Pinhal, um dos mais de cinquenta projetos de vinho da Serra dos Encontros, que abrange quatro municípios entre São Paulo e Minas Gerais.

São 2,9 hectares de vinhas distribuídas entre o sítio San José, no município, e o sítio Aponte, em Albertina (MG), há 15 km dali, onde o casal também planta cafés. “Em Albertina, o terroir é até melhor”, conta Mariana, que vai elaborar suas primeiras garrafas em solo mineiro em 2026.

Em 2024, a vinícola produziu 900 garrafas de sauvignon blanc e mil de syrah, uvas com qualidade já reconhecida na região. “Vamos diversificar para outras uvas que também estão se dando bem por aqui”, explica ela, que pretende expandir os vinhedos para 12 hectares e incluir as castas cabernet franc e chenin blanc.

Vinho e café também se cruzam por outros caminhos na região. O casal Fernando Mororó e Raquel Pacagnela, recém-chegados da África do Sul, decidiram fazer vinhos em Espírito Santo do Pinhal e adquiriram um pedaço de terra. “Ficamos encantados com o enoturismo”, diz Mororó. Mas os pés de mundo novo falaram mais alto. “A cidade respira café”, emenda Raquel, sobre a história local, entrelaçada à cultura cafeeira desde a década de 1850, quando os primeiros pés foram plantados na região. A inauguração do ramal ferroviário da Mogiana contribuiu para a prosperidade da cidade. Palacetes, igrejas e instituições culturais construídas no auge do café, entre os séculos XIX e XX, ainda resistem.

Hoje, 40 mil pés de sete variedades de arábica cobrem parte dos oito hectares da fazenda Terra de Kurí, onde Mororó e Raquel produzem cafés especiais e dedicam-se ao turismo de experiência. A fazenda, cujos grãos classificaram-se entre os primeiros lugares em concursos como o Coffee of the Year, tem uma área reservada aos visitantes para a degustação dos cafés, uma pousada e um restaurante. “O vinho veio ocupando esse espaço, trouxe gente para a região e acabou valorizando o café. Café e vinhos são complementares, pode-se aproveitar os dois”, acredita Raquel.

Hospedagem na Terra de Kurí

Sobre vinhos e cafés

Vinhos de inverno e cafés de qualidade compartilham território e clima, mas têm suas particularidades. Enquanto o café exige menos manejo contínuo ao longo do ano, a viticultura demanda cuidados quase diários durante o desenvolvimento das videiras.

“A uva é desafiadora no verão, enquanto o café aguenta mais desaforos”, analisa Mariana, sobre o crescimento vigoroso das videiras na estação quente, o que exige acompanhamento intensivo, como desfolhas para arejar o vinhedo e controlar o microclima dos cachos. “Enquanto no café você pode adiar um trato para a semana seguinte porque choveu, na uva ele tem que ser feito no timing. Se a pulverização dos vinhedos é para ser feita tal dia, é para fazer tal dia”, detalha.

O trabalho intensivo no campo, porém, inverte-se na época da colheita. Se a colheita do café pode alcançar três meses, a da uva é feita em um só dia (os cachos são enviados diretamente para a área de vinificação, onde o vinho é fermentado e engarrafado).

Aliás, uma das vantagens em cultivar uvas e grãos na mesma fazenda é que, com a dupla poda, ambas as culturas são colhidas na mesma época. “Aproveitamos a mesma mão de obra, o mesmo maquinário, o mesmo pulverizador, otimizando o custo”, lembra Flávio Bambini, engenheiro agrônomo e consultor de café do Sebrae Educampo.

Em 2015 e por hobby, Flávio Bambini começou a produzir vinhos na Região do Cerrado Mineiro, na fazenda Cruzeiro da Fortaleza, entre Serra do Salitre e Patrocínio. Em 2017, produziu as primeiras 200 unidades de vinho feito da casta syrah, plantada em um hectare – um dos primeiros rótulos do Cerrado Mineiro.

O projeto-piloto – que atualmente atinge 3 mil garrafas, vendidas localmente ou via Instagram – estimulou-o a fomentar a ideia entre os cafeicultores da região e, no mesmo ano, lançou o projeto Vinhos do Cerrado com a Federação dos Cafeicultores do Cerrado. “Várias pessoas ficaram curiosas”, lembra Bambini. As terras dedicadas aos vinhedos expandem-se ano após ano. Para 2026, a expectativa é a de que, dos atuais 25 hectares de vinhas na região, surjam cerca de 137 mil garrafas, fruto do trabalho de onze produtores – oito deles, também cafeicultores.

As altas altitudes (entre 850 e 1.250 metros), um clima bem definido (inverno seco com baixas temperaturas e verão chuvoso) e boa amplitude térmica, com o auxílio da dupla poda e de irrigação, entregam vinhos de inverno de qualidade.

Assim como em Pinhal, as uvas mais plantadas no Cerrado Mineiro são syrah e sauvignon blanc, mas há experimentos com malbec, marselan, tempranillo e chenin blanc sob a consultoria do Grupo Vitácea Brasil, do qual Murilo Regina é sócio-fundador e diretor. Maior viveiro vitícola do Brasil, a Vitácea surgiu em 2001 e hoje em dia tem um portfólio amplo, com serviços de consultoria e vinificação. “Vendemos para todos os grandes produtores do sul, e 99% das mudas de dupla poda dos produtores do sudeste e centro-oeste são da nossa produção”, explica Matheus Cassimiro, gerente de comunicação e agronegócio do grupo.

Além das variedades de uvas, os produtores do Cerrado e de Espírito Santo do Pinhal compartilham uma visão comum: a necessidade de fazer parcerias e o impulso que o vinho dá ao turismo rural.

Ganha-ganha

No Cerrado, a ideia é fazer uso da governança e da estrutura na produção do grão para impulsionar a viticultura por meio da criação da Associação de Vinicultores do Cerrado Mineiro (Vincer). “Um dos objetivos é ter um espaço dedicado à vinificação, com capacidade para compartilhar enólogo e otimizar equipamentos”, explica Bambini que, assim como outros produtores, vinifica seus vinhos no Núcleo Técnico Uva e Vinho da Epamig, entre outros locais.

As uvas da Les Amis de Pinhal e de produtores próximos também são vinificadas fora das propriedades de origem, em parceria com a vinícola Terra Nossa.

Além de viabilizar a elaboração dos vinhos de pequenos produtores como Mariana, a Terra Nossa fornece consultoria enológica. Criada por ex-funcionários da prestigiada vinícola Guaspari – pioneira no cultivo de vinhas em Espírito Santo do Pinhal, no início dos anos 2000 (a Guaspari também produz cafés e azeites) –, a Terra Nossa nasceu em 2014 para fazer vinho para consumo próprio. Hoje em dia, além de comercializar seus rótulos, a empresa atende 38 produtores da região de Pinhal e tem capacidade para gerar, anualmente, até 300 mil litros da bebida.

“É uma forma democrática de ajudar as pessoas a desenvolverem seus projetos vitivinícolas”, diz Sepúlveda, um dos sócios. Segundo ele, pelo menos 50% dos clientes que atende são, também, cafeicultores. “Mas cem por cento das uvas que cultivamos aqui foram plantadas em regiões em que já se plantou café”, lembra o enólogo.

Montar uma vinícola não é tarefa fácil. “Não é viável investir em uma estrutura de vinificação própria antes de a produção atingir dez hectares”, acredita Mariana, referindo-se ao custo com prensas, bombas hidráulicas e tanques de fermentação.

Plantio de uvas e cafés

Vinho, café e vulcão

No sul de Minas, Andradas se destaca como um polo da cafeicultura de qualidade. Sua geografia particular, marcada por altitudes entre 700 e 1.300 metros e solos de origem vulcânica, ricos em minerais, cria condições ideais para a produção de cafés especiais.

Se o café é hoje a principal atividade econômica de Andradas, a viticultura também faz parte de sua identidade. Essa tradição começou há mais de um século, quando imigrantes portugueses trouxeram uvas da Ilha da Madeira e iniciaram a produção de vinhos simples, para consumo interno. Depois, chegaram os italianos e continuaram o processo. “Nos anos 1960, a cidade chegou a ter setenta vinícolas”, conta o empresário paulistano Luis Augusto Opice. Atualmente, são seis propriedades dedicadas aos vinhos.

Em 2014, Opice comprou o Rancho da Bela Vista, onde produz catuaí, arara e bourbonzinho com foco no mercado de alta qualidade. Em 2023, resolveu substituir cafezais antigos por vinhedos. “Tenho dois talhões de uvas colados aos de café”, diz ele.

O plantio de syrah e viognier foi um sucesso. “Parece que a terra pediu por uma mudança de cultura. São uvas viçosas, sadias, com boa acidez, taninos e teor de açúcar”, comemora. Vinte e três meses depois, colheu a primeira safra, que, no fechamento desta edição, vinificavam na Terra Nossa. A expectativa é engarrafar 5.100 vinhos, e o empresário já investe num segundo talhão e na sua marca, a RBV, de vinhos e cafés.

Sustentabilidade em dobro

Reconhecida pelas suas paisagens exuberantes, a Chapada Diamantina guarda uma tradição cafeicultora pouco conhecida. A cultura do café existe lá há décadas, mas ganhou projeção com o Cup of Excellence (COE) e a denominação de origem (DO) obtida no final de 2024.

Foi na década de 1980 que os Borré migraram do sul para a Bahia. “Em 1984, houve um movimento de produtores sulistas que buscavam áreas de expansão”, conta Fabiano Borré, CEO da vinícola Uvva.

Situada a 1.150 metros de altitude, a vinícola nasceu em 2022, depois de dez anos de investimentos em pesquisas com uvas viníferas – época em que o governo da Bahia, em parceria com a Embrapa Uva e Vinho, fizeram plantios experimentais na região. “Já tínhamos boa estrada com café”, lembra Borré. Isso porque em 2005 a família, que também produz outras culturas, investiu na produção de cafés especiais. Atualmente, a Fazenda Progresso, em Mucugê – um dos 24 municípios da DO –, tem a maior produção de cafés da região. São 550 hectares de catuaí 144 vermelho e topázio amarelo vendidos para nove países, além do mercado interno, sob a marca Latitude 13º.

Na Progresso, a sustentabilidade é um dos pilares da produção de cafés e vinhos – são cerca de 52 hectares de vinhedos que geram tintos, brancos e espumantes. Entre as práticas, o uso de gramíneas como cobertura vegetal, para preservar umidade e reduzir a temperatura do solo, o uso consciente da água e a aposta no controle biológico. “Temos uma biofábrica onde multiplicamos bactérias e fungos. Na uva, mais de 50% do controle é feito dessa forma”, destaca Borré.

O CEO também faz parcerias com cerca de 25 pequenos cafeicultores da região, que utilizam a plataforma de exportação da Progresso. “Quando um cliente nos visita, nós o levamos até a fazenda do pequeno produtor, que vai contar um pouco de sua história e comercializar seu café, que leva o nome da sua fazenda. Isso atrai um pouco a nova geração”, analisa.

No final do ano passado, a Chapada Diamantina ganhou a Rota do Vinho da Bahia. “Além dos outros atrativos, a Chapada é hoje um destino enoturístico também”, diz Maurício Bacelar, secretário do Turismo do Estado da Bahia. A rota percorre as cinco vinícolas da região – a Uvva, em Mucugê, e mais quatro no Morro do Chapéu, município que já abriga outros quatro novos projetos. “Vejo um potencial grande para o vinho na Chapada, que é começar a atrair visitas”, acredita Borré. “Temos que usar um pouco dessa massa turística e apresentar café e outros produtos, que vão ter a mesma origem”, arremata ele. “Onde mais no mundo você pode produzir cafés e uvas lado a lado? Isso coloca o Brasil numa posição diferenciada também”, conclui.

Vinhedos da Uvva

Enoturismo

De fato, a vitivinicultura tem potencial para abrir caminhos para o turismo, impulsionando não só a venda de vinhos mas, também, a valorização dos cafés e de outros produtos locais. Além disso, o turismo em torno dos vinhedos fortalece a rede de comércio regional.

Lançada em 2024, a Rota da Serra dos Encontros – uma das cinco que perfazem o projeto Vinhos de São Paulo, organizado pelo governo do estado para divulgar a produção paulista – ajudou a alavancar os rótulos do Espírito Santo do Pinhal e, de quebra, valorizar os cafés pinhalenses. “O único lugar no mundo que tem uva e café juntos é aqui no sudeste do Brasil”, reforça Sepúlveda. “Os turistas que vêm de fora do país ficam loucos ao ver pés de café ao lado das videiras”.

Segundo Mariana, a logística fácil, como estradas duplicadas e a proximidade do Aeroporto de Viracopos, também ajudou. “Dependemos 90% do turismo”, diz ela, que faz suas vendas de vinhos para restaurantes, empórios e lojas locais e que vê no enoturismo a chance de mostrar seus exemplares aos que chegam ali em busca de experiências.

A ascensão do vinho na região favoreceu comerciantes. Mariana diz que aqueles que vendiam equipamentos e insumos destinados ao café, por exemplo, começaram a vender para o vinho também, e que a viticultura “deu novo gás” à faculdade local, a Unipinhal, que oferece uma pós-graduação em enologia e viticultura e onde Bambini acaba de se formar.

“Sonhando grande, espero que o nosso vinho possa ajudar o café futuramente”, diz Bambini. “As pessoas não saem de São Paulo para vir ao Cerrado tomar um café, mas vêm para visitar vinícolas. Nosso objetivo é fazer tudo junto”, projeta.

Desafios

Produzir vinhos, porém, não é simples para os produtores de café. O intervalo entre a implantação dos vinhedos e o retorno financeiro é longo, e os custos são elevados. “O café é colhido, seco, armazenado e é uma commodity vendida em bolsa; chegou no preço que o produtor quer, ele é vendido”, compara Mariana. No vinho, além dos processos no campo, o mosto (oriundo da maceração das uvas) fica em tanques de inox por até um ano. Assim, o tempo entre a colheita e o engarrafamento e comercialização alcança, no mínimo, doze meses. “O vinho só ganha com o descanso, seja em barril ou em garrafa. Para nós, cafeicultores, é tudo muito novo”, analisa.

Segundo ela, o maior desafio na cidade é a mão de obra que, tradicionalmente acostumada aos processos da cafeicultura, tem que se adaptar. Com o aumento de turistas na região, a demanda por trabalho é maior do que a oferta de braços. “Temos que formar essas pessoas, porque o vinho é um negócio completamente diferente”. O outro é a segurança, que costuma ser ameaçada com o crescimento urbano. “É preciso criar pertencimento”, diz Mariana.

Para Sepúlveda, a tarefa mais difícil é levar vinho e café brasileiros para o mundo. “Se você não falar que tem o melhor café do mundo, ninguém vai falar”, raciocina. “A uva tem que aproveitar a tradição do café, e o café tem que aproveitar a fama da uva, trazer o turista para entender o café”, acredita ele. “O produtor de café também ganha quando turistas buscam os vinhos da região”, emenda Ulisses Ferreira, diretor-executivo da Associação dos Produtores de Café da Região Vulcânica.

Em busca da origem

A busca por origem das duas bebidas também caminha em paralelo. Criada em 2022, a associação Avvine tem como objetivo elevar a Região de Pinhal a uma denominação de vinhos.

Em busca de proteção da origem dos grãos especiais e atenta ao crescimento do cultivo de uvas (entre outros produtos, como azeites e queijos), a Associação dos Produtores de Café da Região Vulcânica está expandindo a marca coletiva – adquirida em 2021 e usada para os cafés – também para os rótulos. “Esperamos este ano já ter os primeiros vinhos comercializados com a marca Região Vulcânica”, diz Oliveira.

De acordo com seus cálculos, dos cerca de 25 projetos dedicados ao vinho, 30% são tocados por cafeicultores – a região, que engloba doze municípios, contabiliza 12 mil produtores de café. A expansão, acredita ele, está só no começo. “Essa nossa retomada da produção de vinhos acontece pela recente qualidade da bebida e para agregar valor ao turismo”, completa.

Para saber mais: A técnica que transformou a viticultura brasileira

Nas décadas de 1940 e 1950, Minas Gerais e São Paulo produziam vinhos, mas a qualidade era baixa graças ao verão, cuja umidade excessiva favorecia a proliferação de fungos, e os solos encharcados diluíam os compostos das uvas. Como resultado, os vinhos tinham baixo teor de açúcar e, consequentemente, pouco álcool. Com as rodovias, que facilitaram o acesso ao Rio Grande do Sul, a produção no sudeste praticamente desapareceu.

A reviravolta veio nos anos 2000, quando Murilo Regina, então pesquisador da Epamig, trouxe para a viticultura brasileira uma técnica já utilizada em frutíferas: a dupla poda. Durante seu pós-doutorado na França, ele percebeu que o verão europeu tinha condições climáticas semelhantes ao outono-inverno brasileiro: amplitude térmica, dias quentes, noites frias e solo seco. Então, desenvolveu um protocolo para aplicar a dupla poda nos vinhedos.

O primeiro experimento foi em 2001, na Fazenda Santa Fé, em Três Corações (MG), onde o pesquisador encontrou condições ideais para testar a técnica. A primeira safra experimental veio em 2003, e a uva escolhida foi a syrah que, com excelente sanidade e produtividade, tornou-se a principal variedade no manejo de dupla poda – ao lado da sauvignon blanc, cabernet franc e chenin blanc, que têm se destacado nos últimos anos. Graças ao protocolo de Murilo Regina, regiões no sudeste e centro-oeste do país produzem vinhos de alta qualidade.

Texto originalmente publicado na edição #87 (março, abril e maio de 2025) da Revista Espresso. Para saber como assinar, clique aqui.

TEXTO Cristiana Couto • FOTO Divulgação

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Brejo paraibano revitaliza sua cafeicultura e faz primeiro evento de café

A iniciativa, liderada pela UFPB, ganha força e será apresentada nos dias 9 e 10 de abril, durante o 1º Encontro de Cafeicultura da região, em Areia (PB), reunindo produtores, pesquisadores e especialistas de todo o país

Colheita de café no campo experimental da UFPB

Por Cristiana Couto

Há um século, a região conhecida como Brejo Paraibano foi um pólo nordestino importante na produção de café. O grão, que praticamente desapareceu na década de 1920, volta agora a ser o centro das atenções do engenheiro agrônomo Guilherme Silva de Podestá: o pesquisador e sua equipe da UFPB (Universidade Federal da Paraíba) estão, desde 2017, revitalizando a cafeicultura da região. E, nos dias 9 e 10 de abril, um evento reunirá produtores, pesquisadores e estudantes para apresentar os primeiros resultados desse esforço e discutir os rumos da cafeicultura local.

Bem servida de chuvas (1.200-1.300 mm por ano) e a 560 m de altitude, o Brejo Paraibano, que abrange cidades como Areias, Alagoa Nova, Bananeiras e Serraria, chegou a ter seis milhões de pés de café. “Algumas fontes dizem que esse volume foi só na cidade de Areia”, pontua Podestá. De qualquer modo, relatos garantem que um produtor desta cidade – sede da antiga Escola de Agronomia da Paraíba (fundada em 1934) – chegou a ter entre 420 e 500 mil pés da planta. 

O vilão da história, dizem os escritos antigos (que são poucos), foi a cochonilha vermelha do café (Cerococcus parahybensis), que ocorre na região (também em Pernambuco e no Ceará). “Acreditamos que não foi somente a praga”, diz Podestá, professor do Departamento de Fitotecnia e Ciências Ambientais da UFPB, que atribui a decadência da cafeicultura local, também, à falta de investimento e assistência técnica para corrigir o solo e devolver a ele os nutrientes necessários. “Também há o nosso veranico, que é muito forte em alguns anos”, acrescenta ele. 

Tentativas de revitalizar Areia e arredores foram feitas depois, sem sucesso. Em 2016, Podestá foi contratado pela UFPB e, com o tempo, soube da história e resolveu investir no potencial da região para retomar a produção – desta vez, com qualidade. 

Guilherme Podestá (o quarto da esq. para a dir., sentado) e equipe

Com o projeto “Resgate da cafeicultura no Brejo Paraibano”, Podestá – que também é orientador do Necaf (Núcleo de Estudos em Cafeicultura), do Centro de Ciências Agrárias (CCA) da universidade – firmou parceria com a Epamig (Empresa de Pesquisa Agropecuária de Minas Gerais), que forneceu sementes de 21 genótipos de Coffea arabica. “O intuito da pesquisa era saber se a espécie se adaptaria à região e quais genótipos se adaptariam melhor”, explica o pesquisador (o projeto, que permite a prática no campo dos estudantes da UFPB, também inclui oficinas, palestras e acompanhamento técnico a agricultores de municípios como Areia, Bananeiras e Alagoa Nova).

Em 2020, foram plantadas seis variedades de arábica, das quais se destacaram arara, catucaí 24137, catuaí vermelho e catuaí amarelo. A produtividade boa e o potencial de qualidade dos primeiros plantios gerou mais parcerias e investimento em cultivo e processamento do grão. “Dá pra fazermos café especial por aqui”, afirma Podestá, que vem recebendo laudos que pontuam os cafés das fazendas experimentais da universidade acima de 82 pontos. “Ontem, recebi um áudio de um Q-Grader que avaliou um arara nosso, com fermentação de 24 horas, em 85,7 pontos”, comemora.

Não é à toa que, em setembro de 2024, a universidade lançou a marca Grãos da Parahyba, que está em fase final de registro no INPI (Instituto Nacional da Propriedade Industrial). A marca vem incentivando ainda mais o cultivo entre os produtores locais. Hoje, são cerca de 40 pequenos cafeicultores que já apostam nos cafés selecionados pela equipe do pesquisador, totalizando 4,5 hectares plantados. “Estamos tendo muita procura do pessoal, que vem adquirir mudas com a gente”, conta ele, que tem parceria com outros departamentos da universidade em aspectos como gestão de resíduos do café e estudos de fermentação. Segundo o pesquisador, os recursos da venda dos Grãos da Parahyba vão servir para investimento em mais pesquisas e experimentos.

Atualmente, a equipe trabalha com 53 materiais genéticos de arábica oriundos de parcerias, e o próximo passo é cultivar robustas amazônicos. “São seis clones que serão plantados daqui a alguns dias”, anuncia Podestá. 

O primeiro encontro

Nos dias 9 e 10 de abril, o 1º Encontro de Cafeicultura do Brejo Paraibano, em Areia, pretende compartilhar essas iniciativas e trocar experiências sobre temas relevantes para a cafeicultura. O evento vai reunir em torno de 20 especialistas do Nordeste e de outras regiões do Brasil. 

A programação inclui palestras, painéis e visitas técnicas a propriedades, abordando temas como qualidade e produtividade, fermentação, torra e degustação de cafés, agregação de valor e o papel das mulheres na cafeicultura.

A UFPB será sede do evento, realizado pelo (Necaf/UFPB) e pela Associação de Turismo Rural e Cultural de Areia (Atura), além de ter como parceiros diversas entidades, como Embrapa Alimentos e Territórios, Governo da Paraíba e Sebrae Paraíba. 

Café e turismo

A cafeicultura local tem sido vista não só como uma oportunidade para a geração de renda, mas também como um atrativo para o turismo rural e gastronômico. “Está-se criando a Rota do Café por Areia, que é um ponto turístico importante”, diz Podestá, referindo-se aos casarões históricos da cidade que é, também, a capital paraibana da cachaça, com 11 engenhos registrados. “O café vai ser mais uma opção”, promete o pesquisador.

TEXTO Cristiana Couto

Cafezal

Governo do Estado lança Rotas do Café de São Paulo

Iniciativa tem por objetivo transformar o café em um atrativo turístico, valorizando o produto, a história e impulsionando o desenvolvimento rural sustentável

Por Lívia Andrade

Hoje (8), às 15h, no Palácio dos Bandeirantes, o governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas, faz o lançamento oficial das Rotas do Café de São Paulo, uma iniciativa para promover as regiões cafeeiras do estado, que une as secretarias do Turismo, Cultura, Agricultura, Desenvolvimento Econômico, Casa Civil e a Agência Investe SP. “A Rota do Vinho, lançada no ano passado, nos inspirou a dar prosseguimento com outras cadeias. Apresentamos a proposta do café ao Turismo e eles gostaram, porque queriam há algum tempo impulsionar o turismo rural”, diz José Carlos de Faria Júnior, coordenador das Câmaras Setoriais e Temáticas da Agricultura.

A cadeia do café foi escolhida por sua importância para o estado. Historicamente, o grão está relacionado ao desenvolvimento econômico, à colonização e à fundação dos municípios de São Paulo. Segundo dados governamentais, em 2024 a produção de café no estado foi avaliada em 5,4 milhões de sacas beneficiadas. “Nos últimos anos, São Paulo perdeu protagonismo para os outros estados. A rota faz parte deste movimento de apresentar os cafés de qualidade do estado, os cafés especiais, e as pessoas que fazem a diferença em cada região”, diz Raquel Nakazato Pinotti, assessora de pesquisas das Câmaras Setoriais.

Neste primeiro momento, as regiões que serão exploradas nos roteiros turísticos são: Mogiana, Mantiqueira Vulcânica, Circuito das Águas, Cuesta e Alta Paulista. Além dessas, há os destinos cafeeiros e outras vivências do café, que englobam experiências de integração com a natureza, turismo de negócios e fazendas-modelo, como as de café canéfora no oeste do estado, que fazem parte do Programa Estadual de Incentivo ao Cultivo de Coffea Canephora.

O processo de seleção das propriedades rurais que integram as Rotas do Café começou em agosto de 2024, quando a Secretaria de Agricultura enviou para as regiões cafeeiras um questionário para saber quais cafeicultores tinham interesse em abrir o sítio ou a fazenda para o turismo rural. 

Na sequência, a Secretaria de Turismo fez um filtro das informações, selecionando e categorizando 141 propriedades rurais aptas a abrir as portas para o turismo. “Desde o início, as Rotas do Café têm por objetivo ajudar os produtores, especialmente os pequenos e médios, a ter uma renda a mais com a propriedade e promover o desenvolvimento regional com o turismo, que fomenta outros setores, como hotelaria e gastronomia”, diz Faria Júnior. Juntamente com uma rota vem outros benefícios, como verbas para melhoria da infraestrutura de estrada, asfaltos, placas de sinalização etc.

Na ocasião, a produtora Daniella Pelosini, do Sítio Daniella, de Pardinho (SP), entregou um kit de cafés cultivados no estado para o Governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas

Na tarde desta terça, será lançado o livro Rotas de Café de São Paulo com a contextualização histórica da importância da cultura cafeeira para o estado ser, hoje, a capital financeira do Brasil e referenciais turísticos e agronômicos da cadeia produtiva do café. Só para se ter uma ideia, o Instituto Agronômico de Campinas (IAC) tem o maior banco de germoplasma de café do Brasil, um dos principais do mundo. E o Instituto Biológico de São Paulo está entre os pontos turísticos por abrigar o maior cafezal urbano do mundo. Todo ano, a instituição organiza o evento Portas Abertas, que marca o início da colheita do café, convidando o público urbano para colher o grão e fazer uma imersão no universo cafeeiro.

O potencial do turismo interno, turismo de experiências, veio à tona na pandemia. “São Paulo tem uma característica que facilita muito o deslocamento. Percorrendo 100, 200, 300 km, você roda por 30 cidades”, diz Faria Júnior. E, além disso, há regiões que concentram várias cadeias produtivas. Em algumas cidades, o turista poderá conhecer uma fazenda de café, uma vinícola, um lagar de azeite, um laticínio etc.

Com tanta diversidade, a ideia é catalisar o turismo rural no estado. “Até o fim do ano, queremos lançar as rotas da cachaça, do queijo e do mel”, finaliza José Carlos de Faria Júnior, Coordenador das Câmaras Setoriais e Temáticas da Agricultura.

TEXTO Lívia Andrade

Cafezal

Mantiqueira de Minas alcança 1 milhão de embalagens comercializadas com IG

A Região Mantiqueira de Minas alcançou, em março, a marca de 1 milhão de embalagens de café torrado comercializadas com o selo de Indicação Geográfica (IG).

Localizada no lado mineiro da Serra da Mantiqueira, no sul do estado, a região cafeeira – que recebeu seu IP em 2011 e a DO em 2020 – reúne 25 municípios, com cerca de 8 mil cafeicultores, 83% deles sendo pequenos agricultores. O cultivo de café na região se espalha por 55 mil hectares, responsável por entregar anualmente, em média, 1.150 milhões de sacas do grão (60 kg), segundo dados de 2024 da Emater.

De acordo com Lília Maria Dias Junqueira, gerente administrativa da Aprocam, entidade gestora da DO, a marca de um milhão de embalagens refere-se aos cafés com pontuação mínima de 83 pontos (e que cumprem todos os critérios técnicos), comercializados no mercado interno para todo o país. “Pela leitura do QR Code, na plataforma digital, o consumidor pode ter acesso a todas as informações de cada um desses lotes, como localização geográfica, histórias, fotos e perfil sensorial dos cafés”, diz Lilian. “É uma conquista dos produtores, que plantam, cuidam e trabalham com dedicação para obter um produto diferenciado”, completa ela.

Saiba mais:

O café é cultivado na Mantiqueira de Minas, no sul do Estado de Minas Gerais, desde meados do século XIX, e teve uma expansão significativa entre 1913 e 1925.

A partir de 1996, a região passou por um processo de aprimoramento tecnológico, com a introdução de novas cultivares e modernização da infraestrutura pós-colheita, tornando-se uma das principais produtoras de cafés de qualidade no Brasil.

Entre as variedades mais plantadas estão os arábicas bourbon, arara, catuaí, catucaí e mundo novo, mas produtores vêm buscando novas variedades.

TEXTO Redação • FOTO Divulgação

Cafezal

Selo da IG do Café do Vale da Grama é lançado hoje (3/4)

A região entra na modalidade IP, que confirma sua tradição na produção de cafés de qualidade

Por Lívia Andrade

Uma cerimônia na tarde de hoje no Clube Recreativo de São Sebastião da Grama (SP) marca o lançamento oficial do selo da Indicação Geográfica (IG) dos Cafés do Vale da Grama na modalidade Indicação de Procedência (IP) com a presença de representantes do MAPA, Secretaria Estadual de Agricultura, Prefeitura Municipal, FAESP, BSCA, Cooxupé e o Sindicato Rural local, entre outras.

Concedido pelo Instituto Nacional da Propriedade Industrial (INPI), o selo chancela que a região tem tradição na produção de cafés de qualidade.

O Vale da Grama, região cafeeira situada entre duas cadeias de montanhas no lado paulista da Serra Mantiqueira, no final do ano passado, foi reconhecido pelo INPI por sua tradição na produção de grãos de qualidade. O lançamento do selo coroa a busca dos produtores pelo reconhecimento da região, cuja documentação começou a ser reunida em 2020 e o depósito no INPI, feito em 2023.

A imagem acima, que ilustra o selo, faz alusão não só ao café, mas às serras, ao vale e à água abundante da região.

Leia a reportagem sobre o Vale da Grama aqui.

TEXTO Lívia Andrade • FOTO João Barim

Cafezal

Qualidade entre montanhas: conheça a produção de cafés do Vale da Grama

Incrustado na Serra da Mantiqueira, o Vale da Grama tem sido destaque nos concursos de cafés especiais desde 1999 e, no final do ano passado, foi reconhecido como a mais nova indicação geográfica cafeeira do estado paulista

Foto: João Barim

Por Lívia Andrade

Quem chega a São Sebastião da Grama logo avista o Cristo Redentor de braços abertos para o Vale da Grama, terra fértil e de clima ameno que, em 1871, atraiu as primeiras famílias interessadas em plantar café na localidade.

A vocação centenária na produção de grãos de qualidade é anterior à fundação do município, em 1925, e acaba de ser reconhecida pelo Instituto Nacional de Propriedade Industrial (INPI) como a mais nova indicação geográfica do estado de São Paulo, na modalidade indicação de procedência (IP), que atesta que a região tem tradição na produção de cafés especiais.

“O nome Vale da Grama se deve ao fato de os cafezais estarem localizados numa espécie de planalto entre duas cadeias de montanha da Serra da Mantiqueira”, explica o professor Leandro Paiva, referência em cafeicultura do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Sul de Minas (IF Sul de Minas).

Situado a mais de mil metros de altitude, o Vale da Grama tem dias quentes e noites frias, o que implica numa maturação lenta do grão, que favorece a qualidade. Hoje em dia, a região tem cerca de 300 cafeicultores.

Uma das primeiras lavouras de café de que se tem registro é de Benedito Ferreira de Andrade, conhecido como Dito Bandeira pelo fato de haver muitos tamanduás-bandeira em suas terras. “Ele começou a implantar os cafezais em 1878, época que coincide com a construção da casa sede da Fazenda São João de Cima. Já a tulha para armazenar café foi erguida em 1908”, conta Ubirajara Rabello de Andrade Júnior, que hoje está à frente da parte da propriedade em que fica a casa-sede.

“Naqueles tempos, o sistema produtivo era diferente. Plantavam-se várias sementes numa cova profunda, deixavam germinar e selecionavam até quatro mudas”, explica Sérgio Parreiras Pereira, pesquisador do Instituto Agronômico de Campinas (IAC). Dessa forma, foram plantados os primeiros cafezais na região.

Por muitas décadas, tudo o que acontecia no Vale da Grama tinha relação com o café. O jornal O Desgramado, que conta as histórias das famílias da cidade, traz notícias dos times de futebol das fazendas cafeeiras, do concurso da rainha do café, e escritos literários que abordam a cafeicultura. Na época, o Brasil era um país rural, o desenvolvimento econômico estava no interior e o café era o principal produto da balança comercial nacional, o que atraiu muitos imigrantes europeus.

A família do italiano Fortunato Bernardi foi uma delas. “Em 1900, ele veio da região do Vêneto, comprou uma propriedade no Vale da Grama para cultivar cafés e criar os filhos. Fortunato formou a fazenda, construiu casas de colonos e trouxe outros italianos para trabalhar para ele”, relata Valdir Duarte, atual presidente da Associação dos Cafeicultores do Vale da Grama, que se casou com Lourdes Bernardi, uma das descendentes de Fortunato.

Foto: João Barim

Por volta da mesma época, em 1890, começa a trajetória da família Carvalho Dias, quando a matriarca Ignez Bernardina da Silva Dias compra uma propriedade no Vale da Grama e, com seus quatro filhos, inicia o plantio de café e recebe imigrantes italianos para ajudar nas lavouras.

Os anos passam, a família cresce e um dos filhos de Ignez, Lindolpho Pio da Silva Dias, casa-se com Mathilde e, juntos, têm 11 filhos. Um deles, Joaquim José de Carvalho Dias, se forma agrônomo pela Universidade Federal de Viçosa (UFV) e, após trabalhar para outras fazendas, assume os cafezais da família, em 1945.

Com o know-how adquirido na universidade, o jovem reformula o plantio e implanta novas técnicas de manejo e pós-colheita. “Meu pai era muito amigo do pessoal da Pinhalense. Gostava muito de máquinas. Se desse para colocar um motor, colocava. Tanto que trocou o lavador e colocou despolpador para fazer cereja descascado por volta de 1964, 1968”, diz Maria Dias Teixeira de Macedo, filha de Joaquim.

O agrônomo firmou parceria com o Instituto Agronômico de Campinas (IAC) na figura de Alcides Carvalho (1913-1993), agrônomo considerado o maior geneticista de cafés do mundo, que estava selecionando variedades apreciadas pelos compradores, como bourbon amarelo, e resistentes às pragas e doenças, como o icatu amarelo.

Cuidados no pós-colheita são fundamentais para garantir a qualidade na xícara – Foto: João Barim

O primeiro campo experimental do IAC na fazenda foi criado em 1952 e continua ativo até hoje. “Meu pai tinha um viveiro de mudas em parceria com o IAC. Na época, não havia tubetes, as mudas eram plantadas em saquinhos de plástico. As mulheres ficavam enchendo os saquinhos”, conta Maria.

A paixão de Carvalho Dias pelos cafezais contagiou o neto, Diogo Dias, que passava as férias com o avô na roça. Em 2000, ele se forma em agronomia e começa a implantar o que aprendeu na fazenda. “O Diogo começou com a história de lavar todo o café no mesmo dia da colheita [processo que evita a oxidação do grão]. O papai não se conformava em fazer os funcionários trabalharem até à noite. Houve algumas brigas, mas quando começamos a ganhar prêmios [de bom valor em dinheiro], ele entendeu que compensava fazer qualidade”, explica Maria.

A recompensa veio em 2001, quando Carvalho Dias ficou em 3º lugar no Prêmio Ernesto Illy de Qualidade Sustentável de Café para Espresso. De lá para cá, a parede da casa ficou pequena para a quantidade de troféus conquistados.

Sempre à frente do tempo, a família se tornou referência na cafeicultura de montanha. “Lá por 2010, não se falava de terraceamento no Brasil, e o Diogo Dias, da Fazenda Recreio, começa a fazer terraços nos talhões da propriedade para facilitar a entrada de máquinas para adubação e pulverização”, lembra Pereira, do IAC.

A Fazenda Recreio foi precursora no pós-colheita e na busca por qualidade – Foto: João Barim

Partilhando o Vale

Com o decorrer do tempo, as famílias foram aumentando e as sucessões aconteceram naturalmente, com a partilha das terras entre os herdeiros. Na família Meirelles, a divisão se deu em 1977, quando Lourival Vilela Meirelles e a esposa, Célia, transferiram a propriedade para os cinco filhos. Hoje, parte das terras é tocada pela terceira geração.

É o caso da Fazenda Floresta, sob o comando das netas Carolina, Cristina e Camila Meirelles, que decidiram seguir o legado do pai, Jairo. Elas herdaram a empresa Café Fazenda Floresta, que fornece cafés especiais produzidos na propriedade para todo o Brasil, atendendo mercado corporativo, varejo e e-commerce.

Do plantio à torra, tudo acontece na fazenda, preservando a autenticidade do café. Agora, o foco das irmãs é expandir o reconhecimento da marca Café Fazenda Floresta como referência em café especial. Para isso, a empresa passou por reformulação e ampliou sua presença em lojas físicas e on-line. “Mais do que conquistar prêmios de qualidade, nosso objetivo é conquistar o coração de milhares de consumidores”, diz Carolina, CEO da empresa.

A fazenda Santa Alina, de Lucia Maria da Silva Dias, mais conhecida como Tuca Dias, é outra história de sucessão familiar. Quarta geração de cafeicultores, Tuca assumiu a propriedade em 2010 e mantém a Santa Alina de portas abertas para os compradores de café.

Fazenda Santa Alina – Foto: João Barim

“Os japoneses, por exemplo, compram todo o bourbon da nossa lavoura centenária, dois hectares de café que foram plantados em 1901 e estão na propriedade até hoje. Eles têm uma relação muito especial com os mais velhos, com o que vem antes”, diz Tuca.

De acordo com a produtora, a guinada da Santa Alina para os cafés especiais se deve muito ao surgimento de duas exportadoras na região, a Bourbon Specialty Coffees, em 2000, e a Qualicafex, em 2002. À frente da fazenda, Tuca contratou profissionais para fazer o inventário de qualidade dos lotes e treinar a equipe em boas práticas de pós-colheita, o que aumentou a presença da Santa Alina no pódio dos principais concursos – destaque para o Cup of Excellence, Concurso Terroir da Região Vulcânica e Concurso Estadual de Café de São Paulo.

Mas nem tudo são flores. “Em 2021 faltou muita mão de obra, as pessoas não queriam trabalhar registradas”, explica ela, que começou um processo de mecanização para diminuir os problemas na época da colheita manual. Até então, a única mecanização utilizada era a derriçadeira de café, as “mãozinhas mecânicas” que melhoram a produtividade do colhedor de café.

O mesmo movimento foi adotado pela família Taramelli, que tem tradição na produção cafeeira no Vale da Grama. “Estamos mecanizando há oito anos por falta de mão de obra”, diz Rafael Taramelli. A Fazenda São José, que tem uma topografia favorável, é 100% irrigada e mecanizada. “Lá, uma colhedora de café faz o trabalho de cerca de 80 pessoas”, esclarece.

Já na Fazenda São Caetano, com terreno mais íngreme, 40% da colheita ainda é manual. “Estamos fazendo terraços em alguns talhões e tirando o café de áreas onde não é possível mecanizar”, conta ele.

Origem premiada

Um dos primeiros registros de premiação do Vale da Grama é de 1999, quando Lindolpho de Carvalho Dias, um dos descendentes de Dona Mathilde, foi finalista do Cup of Excellence (COE) e ficou em quarto lugar no prêmio da illycaffè.

De lá para cá, a região virou figurinha recorrente nos principais concursos de qualidade: COE, Aroma BSCA, illycaffè, Concurso Estadual de Café de São Paulo, Concurso Florada Premiada e Terroir da Região Vulcânica.

O Vale da Grama foi destaque, por exemplo, no COE 2023. A Fazenda Rainha, da Orfeu Cafés Especiais, onde fica a Capela Santa Clara, projeto de Oscar Niemeyer, conquistou o primeiro lugar na categoria via seca, com um café gesha produzido a 1.560 metros de altitude, que recebeu o maior lance da história, R$ 84,5 mil por saca.

Capela Santa Clara, de Niemeyer, na Fazenda Rainha

Segundo Alexandre Marchetti, engenheiro agrônomo responsável pela fazenda e Q-Grader da Orfeu, a localidade representa 50% do êxito. “Tem tudo a ver com o terroir, com o solo vulcânico, que é um solo diferenciado, bem pedregoso, que faz a planta ter uma melhor absorção de açúcares no fruto, o que resulta num café mais exótico”, diz. “A outra metade está relacionada com a variedade e com o pós-colheita. Nosso trabalho é manter a qualidade que a natureza nos dá”, explica. Na época, 200 garrafas numeradas com 210 gramas do microlote premiado foram vendidas por R$ 450 a unidade.

Cantinho do paraíso

Apelidado de Toscana brasileira por Guilherme Amado, grande referência em cafés e vinhos, o Vale da Grama tem muita semelhança com a famosa região italiana. Além das montanhas, as plantações de oliveiras e uvas viníferas são outro ponto em comum.

Tanta diversidade de paisagem atrai ciclistas, peregrinos (três ramais do Caminho da Fé passam pela cidade) e turistas. Os amantes de pedais em estradas de terra, inclusive, criaram seus roteiros – muitos deles para conhecer igrejas, situadas em fazendas cafeeiras. Entre elas, a Igreja da Pedra, na Fazenda Zarif, a Capela Santa Clara, na Fazenda Rainha e a Igreja São Miguel dos Arcanjos, na Fazenda Floresta.

Há, ainda, o turismo de negócios, compradores que na época da colheita vão visitar as propriedades das quais costumam comprar. E não para por aí. A Associação dos Cafeicultores do Vale da Grama, em parceria com o Sebrae e a Prefeitura Municipal, está começando a estruturar um plano para alavancar o
turismo regional.

Um dos primeiros passos é focar nas crianças e jovens, com palestras sobre café especial nas escolas para que a nova geração (não só aqueles cujos pais trabalham com café) aprenda a tomar café especial e compartilhar a bebida.

Outra estratégia para a região ganhar musculatura é o fortalecimento do associativismo. Desde que o grupo se debruçou no processo para a conquista da IG, muitos produtores entraram para a associação.

Em 2021, o Vale da Grama foi reconhecido como Arranjo Produtivo Local (APL) da Cafeicultura e, no ano seguinte, participou de um edital da Secretaria do Desenvolvimento Econômico de São Paulo, onde conseguiu aprovar o projeto para a construção do laboratório de classificação e análise sensorial dos cafés especiais. A obra permite aos cafeicultores conhecer a qualidade dos grãos e negociar melhor seus cafés.

Todo este movimento envolveu os filhos dos produtores. “A nova geração é antenada, tem feito workshops de torra, cursos do Senar e Sebrae para criar sua marca própria de café torrado, além de participar de feiras e eventos representando o Vale da Grama”, finaliza Duarte, da associação.

Texto originalmente publicado na edição #87 (março, abril e maio de 2025) da Revista Espresso. Para saber como assinar, clique aqui.

TEXTO Lívia Andrade