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Marketing pro bono
Por Celso Vegro
Para qualquer agente econômico envolvido no agronegócio café, ao ponderar sobre possíveis estratégias de marketing, a imagem que chega imediatamente à mente é a do mítico personagem Juan Valdez, o exemplo de maior êxito global em favor da excelência do café colombiano. Criado no final dos anos 1950, a imagem do cafeicultor com sua mula (ou burro) tornou-se emblemática para todos os apreciadores da bebida ao redor do mundo. Ademais, por envolver também os demais agentes da cadeia produtiva, consolidou uma identidade do segmento cafeeiro colombiano em seu conjunto.
A estratégia de divulgação da excelência do café colombiano por meio desse personagem tem sido um exemplo estudado pelas agências de marketing e pelos cursos de formação de novos publicitários. Evidentemente, esse êxito somente foi obtido por meio de grande investimento financeiro por parte da Federação Nacional de Cafeicultores de Colômbia (FNC). Desde 2002, o empreendimento é conduzido pela Promotora de Café Colômbia S.A. (Procafecol S.A.), empresa controladora da marca e das franquias e da distribuição varejista de cafés com a marca Juan Valdez.
Segundo o informe de gestão1 publicado pela controladora, existem aproximadamente 103 mil estabelecimentos que oferecem café colombiano em 38 países. Destes, 584 são cafeterias (216 delas em outros países), com equipe composta por 2.762 colaboradores. Em 2023, o faturamento bruto da empresa foi de R$ 286,08 milhões2, representando avanço de 23,5% frente ao ano anterior. Apesar desse expressivo resultado, houve prejuízo operacional de R$13,09 milhões3! De qualquer modo, sem dúvida, ele continua sendo um tremendo exemplo para o caso brasileiro que, ainda, engatinha quando o assunto é o “marketing dos Cafés do Brasil”.
O resultado não poderia ser diferente. Diante dos mais de 60 anos de emprego da marca Juan Valdez na comercialização do café colombiano no mundo, o Brasil constatou que seu reconhecido papel em suprir com o produto a demanda global foi, paulatinamente, substituído em favor de um de seus principais concorrentes.
Todavia, alcançamos o segundo semestre de 2025 com anúncio que sobressaltou o agronegócio Cafés do Brasil. Unilateralmente, o governo estadunidense adicionou ao café brasileiro 40% de tarifa adicional, que se somaram aos 10% anteriormente estipulados. Sendo o Brasil o principal fornecedor de café naquele mercado, tal medida promove uma desorganização dos negócios.
De imediato, os apreciadores locais, ao recorrerem a novas aquisições de café, perceberam elevação dos preços de varejo do produto. Deve-se considerar que processos inflacionários não consistem em aprendizado dos americanos e, por essa razão, há um choque maior quando se constatam variações substantiva de preços.
Apesar do impacto imediato sobre os embarques brasileiros destinados aos EUA (queda de 17,5% em agosto)4, houve crescimento nas vendas para a Colômbia5, entre outros destinos menos usuais para o café brasileiro. Esse movimento de incremento de embarques para destinos não tradicionais deverá se intensificar, sobretudo para o México e o Canadá. Também o Uruguai é forte candidato a aumentar as importações de café brasileiro.
Diante disso, a população estadunidense percebeu que o que garante seu hábito de consumo a preço justo é o café brasileiro, que, por razões de interesses políticos e não comerciais, foi prejudicado em sua competitividade pela imposição dos 50% de taxa aduaneira.
Ocorre então uma significativa redescoberta entre os consumidores daquele país: o café vem do Brasil!!! Sem qualquer investimento da parte de nossas lideranças, com ou sem a parceria com o governo (Funcafé), o agronegócio Cafés do Brasil foi contemplado no mercado estadunidense com um marketing pro bono6.
A evidência decantada de que aquela bebida que acompanha os apreciadores todos os dias tem origem brasileira traz ganhos para o agronegócio Cafés do Brasil. Estando o país em grande evidência, os consumidores enfrentam restrições ao acesso da bebida (por escassez de suprimento) devido a razões que não decorrem de fatores econômicos. Tal cenário coloca a população americana contra seu governo e, em contrapartida, reúne mais e mais simpatizantes para com a democracia brasileira e sua pujante produção de café.
O momento é propício para que nossas lideranças intensifiquem campanhas para estímulo à procura dos Cafés do Brasil. A onda é favorável, e com um tostão em recursos seria possível conseguir firmar a origem brasileira como central na manutenção desse hábito de consumo tão caro ao povo americano. Mangas arregaçadas e trabalhemos o marketing pro bono dos Cafés do Brasil!
1 Disponível em: https://juanvaldez.com/wp-content/uploads/2024/12/Procafecol_-_Informe_Integrado_2023.pdf (Acesso em 10/09/2025).
2 Para conversão dos valores foi empregada a paridade cambial de 1.000 pesos colombianos = 1,39 reais brasileiros.
3 Em 2022, o resultado líquido operacional foi de R$19,50 milhões.
4 Ver: https://www.moneytimes.com.br/volume-exportado-de-cafe-despenca-em-agosto-mas-receita-sobe-com-precos-altos-eua-perdem-lideranca-fets/ (Acesso em 10/09/2025)
5 Disponível em: https://agfeed.com.br/economia/por-que-a-colombia-comprou-quase-6-vezes-mais-cafe-do-brasil/ (Acesso em 10/09/2025)
6 A expressão vem do latim pro bono publico, que significa “para o bem público”.