Aftertaste por Pedro Cirne

Crônicas sobre a vida, o universo e o tudo mais

Oi, tudo bem?

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Às vezes eu me vejo como um alienígena dos filmes de ficção científica, daqueles que caem na Terra e vão parar na mão de cientistas, que passam dias e dias examinando-o. No fim, nem os pesquisadores entendem o ET, nem o visitante entende o planeta Terra.

Falo isso de uma maneira geral, mas muito especificamente quando olho essa geração nova, que há quem chame de geração Y ou Z. Para mim, é a Geração @, já que eles estão sempre enviando ou recebendo e-mails, ou tuitando, ou citando alguém no Facebook.

Por outro lado, às vezes eu me vejo como um cientista dos filmes de ficção científica, daqueles que examinam um alienígena de tudo o que é jeito, e nunca entendem nada. Enfim, dia desses resolvi fazer uma experiência “científica”: descobrir quanto tempo demorava para ver o quanto alguém, de fato, se interessava em saber como eu estava.

Convenhamos: nem todo mundo que te encontra pessoalmente e diz “oi, tudo bem?” quer saber a resposta. Da mesma maneira, no WhatsApp, no Facebook, no Google Talk, Skype, ou em qualquer um desses ambientes em que a Geração @ habita. A pergunta, então, era: quanto tempo levaria para alguém ao menos ouvir a resposta ao “oi, tudo bem?” antes de começar a falar de si mesmo? Podia ser on-line ou off-line, tanto fazia.

Eu encontrava as pessoas e perguntava “como você está” e ouvia a resposta. Depois, ninguém me perguntava um mísero “e você?”. Idem nos ambientes da Geração @. Nunca um “e vc?” – acho que eles comem as letras “o” e “ê” da palavra “você” porque não têm tempo a perder, e não por preguiça. Eles são muito ocupados: são centenas de amigos em cada rede social, como acompanhar tudo isso? Temos de compreendê-los.

Como pesquisador, descobri que sou um fracasso. Após uma semana, desisti. Estava ficando triste. Onde estavam aqueles amigos virtuais todos? Não posso julgá-los, é claro. Devem estar ocupados demais dando “likes” em centenas de perfis, não têm tempo para se preocupar com alguém que não conhecem no mundo real.

E as pessoas do mundo real? Não posso julgá-los, é claro. Devem estar ocupados demais com o trabalho, o trânsito, o tempo, o pós-Copa, o pré-Olimpíada. É, a vida está corrida. E encontrar alguém ao vivo dá trabalho: não dá para você dar um like no queixo da pessoa e seguir em frente com a sensação de dever cumprido.

Com tanto noticiário online, jornais, seriados na TV, webseriados, é preciso ter um dia de 36 horas para acompanhar tudo e ter assunto para o caso de encontrar, por acaso, alguém ao vivo. E se, pior, essa pessoa dispor de cinco minutos para conversar contigo, como você vai preencher esse tempo imenso se não estiver por dentro de absolutamente tudo que se passa na internet, na TV, nos seriados?

Deixo a resposta contigo, é claro. Eu, particularmente, prefiro ocupar esses infinitos cinco minutos ouvindo o que a pessoa tem a dizer quando eu pergunto “oi, tudo bem?”. Mas raramente a resposta demora mais que quatro segundos. Deve ser o equivalente da vida off-line para o “like” da Geração @.

*Pedro Cirne é chefe de reportagem do UOL Notícias. Fale com o colunista pelo e-mail aftertaste@revistaespresso.com.br

FOTO Divulgação • ILUSTRAÇÃO Eduardo Nunes

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