Pelo Mundo por Gustavo Paiva

Equador: a última fronteira do café sul-americano?

De todos os países sul-americanos que produzem café, o Equador talvez seja aquele cuja produção ainda é a mais subestimada no Brasil. O país, relativamente próximo de nós, está encurralado entre tradicionais produtores, como a Colômbia ao norte e o Peru ao sul, além da cordilheira dos Andes ao centro e da floresta amazônica ao leste.

A produção equatoriana é superior até mesmo a algumas origens consolidadas, como El Salvador e Ruanda. O país andino chega a produzir cerca de 50% a mais do que El Salvador e três vezes mais do que Ruanda, segundo dados da Organização Internacional do Café (OIC).

Além disso, é um dos poucos países com produção funcional tanto de arábica como de robusta. A produção anual gira em torno de 700 mil sacas, o que coloca os equatorianos em um honroso posto entre os vinte maiores produtores de café do mundo. Se considerarmos apenas os países que produzem tanto arábica quanto robusta, o Equador sai com um ainda mais honroso posto de oitavo maior produtor do mundo. 

Mas como é possível um país ter uma produção tão diversa? Ou ainda, como é possível que a maioria do público leigo, e até mesmo boa parte do público especializado do café, não conheça muito bem esta origem? Existe café de qualidade por lá? Estas três perguntas não são tão simples de responder, e envolvem fatores diversos como a geografia, a economia e, até mesmo, a criminalidade do país. 

Comecemos pela diversidade da produção. O Equador tem três zonas geográficas bem definidas: litoral, serra e costa. No litoral está Guayaquil, a cidade mais rica e populosa. Esta região costeira tem clima tropical parecido com o das regiões costeiras do Brasil e abriga o porto mais importante do Pacífico equatoriano. Além disso, o terreno na zona costeira é relativamente plano e de fácil manejo. Portanto, a produção do café robusta em larga escala pode prosperar, apesar da enorme tradição regional no cultivo de frutas. Existe ainda a produção do cacau, sendo país o quarto maior produtor mundial, com nada menos do que o dobro da produção brasileira. 

Ao leste, as regiões amazônicas equatorianas também contam com produção de robusta, restando ao arábica as zonas serranas que cortam o país ao centro no sentido norte-sul.

A maioria do público entusiasta de café não conhece o Equador justamente pelo país ser eclipsado pelos seus vizinhos e pela estrutura do mercado de café local. Com fronteiras extensas, pouco fiscalizadas e muitas vezes tomadas por serras e florestas, o tráfico de café do Equador para a Colômbia e o Peru acontece de maneira exacerbada. E, ainda, as torrefações locais não têm condições de competir com o preço pago pelas empresas colombianas e peruanas. Assim, o consumidor equatoriano acaba tomando seu próprio café torrado e empacotado na Colômbia ou, até mesmo, no Peru. 

Além disso, o conhecimento de cafés especiais tanto por parte dos consumidores como dos produtores ainda é limitado, o que dificulta o desenvolvimento da cadeia de especialidade. A única exceção acaba sendo, de certa maneira, o café solúvel, que tem no Equador uma indústria organizada e capaz de atender as demandas internas e, até mesmo, externas.

Por último, vale dizer que os fundamentos do terroir equatoriano não difere, em larga medida, do colombiano nem do peruano. Portanto, o país tem um enorme potencial de produção de cafés especiais. Além do mais, o país tem diferenciais de marketing para a comercialização de cafés de alta qualidade de dar inveja a qualquer outro produtor: o café produzido nas Ilhas Galápagos e a complexa cadeia de vulcões espalhada pelo país e que oferece solos ricos e experiências complementares ao consumo do café.

Mesmo que o país ainda tenha um longo caminho a percorrer para melhorar a qualidade dos seus grãos, já se pode notar algumas marcas tentando elevar o nível do produto ofertado e algumas cafeterias especializadas surgindo por Quito, a capital do país, que tem 1,8 milhões de habitantes – dez por cento da população equatoriana. 

Para o desenvolvimento da cafeicultura local a demografia equatoriana é uma vantagem, pois conta com uma população jovem, cada vez mais urbana e vivendo em uma economia dolarizada. 

Se, por um lado, o jovem urbano está mais interessado pelo consumo da bebida, ele acaba fazendo falta no trabalho do campo e na sucessão rural. A questão da economia dolarizada acaba influenciando, e muito, os hábitos de consumo do país – nem sempre de modo positivo. Mas este seria um tema para uma próxima coluna.

Gustavo Magalhães Paiva é formado em relações internacionais pela Universidade de Genebra e é mestre em economia agroalimentar. Atualmente, é consultor das Nações Unidas para o café.

TEXTO Gustavo Paiva

Deixe seu comentário