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Café levado a sério
Como profissional de café, me parece estranho que, na maioria dos melhores restaurantes do mundo, se sirva uma xícara de café medíocre. Acho difícil aceitar que um dos melhores restaurantes de São Paulo, que se orgulha de servir ingredientes de origem local, serve um café de baixa qualidade que se pode achar no supermercado. Mesmo quando em pequenas fazendas, a apenas algumas horas de distância, se produzam os melhores cafés do Brasil. Cafés que muitas pessoas – eu me incluo entre elas – viajam por todo o mundo para encontrar.
Então, por que o café ainda não é levado a sério nesses restaurantes? Eu suspeito que isso tenha a ver com dinheiro. As grandes empresas de café dão máquinas e, em alguns casos, dinheiro aos restaurantes, a fim de que sirvam o seu produto. É uma forma barata de comercialização como algo superior apenas por ser associado a um grande chef. Há também a tradição de usar o café como uma maneira de os restaurantes fazerem um bom dinheiro. Eles compram o café mais barato e o vendem caro.
Felizmente, existem chefs que estão começando a mudar essa visão. Tenho a sorte de poder ajudar um deles, o chef René Redzepi, a desenvolver um novo programa de café em seu restaurante, o Noma, em Copenhague, que é considerado o melhor restaurante do mundo. Há dois anos, fui contatado por René e seu sommelier para ajudá-los a melhorar o serviço de café no lugar. Eles perceberam que não estavam dando tanta atenção ao grão do jeito que se importavam com os outros ingredientes e queriam que ele atingisse o mesmo padrão de todos os outros ítens oferecidos no restaurante. Um ano mais tarde, depois de horas de treinamento e degustação, foi lançado o novo serviço de café do Restaurante Noma.
Decidimos concentrar nossas energias a fim de buscar o melhor café que pudesse chegar a nossas mãos e prepará-lo com um simples filtro de papel manual, o Hario V60. Muito similar ao preparo da maioria dos cafés escandinavos. Nós recebemos muitas críticas dos profissionais do setor. Para eles, o método era muito simples e poderíamos ter escolhido um caminho mais espetacular de fazer café, por exemplo, usando o sifão ou pelo menos preparando o grão ao lado das mesas para que os convidados pudessem ter uma apresentação adequada.
A meu ver, esse é um dos motivos pelos quais não há mais restaurantes que servem um café de excelente qualidade. Nós, profissionais do café, dificultamos muito a compreensão tanto dos chefs como dos clientes. O serviço simplista no Noma foi muito bem pensado. Queríamos que os clientes experimentassem o café em si, e não todo o burburinho em torno dele.
No entanto, ainda temos desafios, e um dos maiores é mudar a percepção dos clientes. Mesmo em minha própria cafeteria, ainda precisamos educar as pessoas sobre o sabor da bebida, que a maioria, normalmente, acredita ser amargo e forte. Mas um ótimo café não necessariamente é assim. Para mim, um café delicioso pode ter gosto de chá, tangerina, jasmim, etc. Com certeza não é muito amargo e é naturalmente doce. Mas nem todos os clientes serão capazes de entender que o café não é apenas café. A formação de sommeliers para apresentar a bebida é, portanto, fundamental.
Logicamente, a preparação exige um pouco de atenção, mas com treino e bons sistemas no local, fazer um café saboroso não será um problema. Encontrar os ingredientes certos pode ser um tanto desafiador. Por isso, é indispensável para um restaurante trabalhar junto com um bom torrador, que selecione os melhores grãos de pequenos produtores e que possa ajudar com treinamentos e sistemas de preparação.
Acredito que os restaurantes brasileiros deveriam liderar o mundo servindo o melhor café. Afinal, eles têm as fazendas em seu quintal e a bebida faz parte da cultura e da história do Brasil. Isso é algo que deve deixar os chefs e sommeliers brasileiros orgulhosos. É também um jeito fácil de fazer com que os visitantes saiam com um sorriso no rosto em vez de partir com um gosto amargo na boca.
* Tim Wendelboe é torrador e consultor de cafés especiais, proprietário do Tim Wendelboe Espresso Bar, em Oslo, na Noruega.
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