Café & Preparos

Cafeteria temporária de Twin Peaks fica no Deli Market até 6/7

Fãs da cultuada Twin Peaks podem sentir-se um pouco “dentro” da série ao visitar a cafeteria RR Diner, lugar preferido do protagonista da trama, Dale Cooper, que está montada temporariamente na lanchonete Deli Market, em Pinheiros. A atração, chamada The DineRR Experience, é uma ação da Mubi, que exibe a série na plataforma desde 13 de junho em comemoração aos 35 anos de seu lançamento. 

A cafeteria fica até 6 de julho na capital paulista. Lá, os amantes da série podem provar o cardápio do personagem, uma fatia de torta de cereja e uma xícara de café, por R$ 48,50 e, ainda, registrar a visita na cabine de fotos instantânea ali montada e tentar arrematar um brinde na claw machine (como um poster, que a Espresso conseguiu pinçar com as garras do equipamento na sexta, 20, dia da visita) – as brincadeiras estão inclusas no combo café-torta.  

Mas não espere por um café ultra especial – a bebida, filtrada, é apenas correta. O espaço também é pequeno, e a fila na porta pode ser grande. Vale fotografar as peças retrô, que decoram com charme o lugar.

Além dos 30 episódios das duas temporadas, que passaram na TV aberta em 1990 e fizeram enorme sucesso, a Mubi também exibe os 18 episódios de Twin Peaks: a Limited Event Series, de 2017, com a presença de vários atores das primeiras temporadas, e o filme Twin Peaks: Fire Walk with Me (traduzido como Twin Peaks: os Últimos Dias de Laura Palmer), de 1992.

Criada por David Lynch (1946-2025) e Mark Frost, Twin Peaks mistura suspense policial, drama psicológico e elementos surreais ao tratar da investigação do assassinato de Laura Palmer (papel de Sheryl Lee), uma estudante popular da pacata e fictícia cidade norte-americana que dá nome à série pelo agente do FBI Dale Cooper (interpretado por Kyle MacLachlan). À época, recebeu elogios de calibre, como “televisão na fronteira da arte”, do crítico do The New York Times, John O’Connor, e  “a coisa mais original que a televisão americana produziu em anos”, do também crítico Howard Rosenberg, do Los Angeles Times, que chamava a atenção para o tom sombrio, a trilha sonora hipnotizante e os personagens excêntricos. 

The DineRR Experience (no Deli Market)
Onde: R. Cunha Gago, 841, Pinheiros (São Paulo)
Quando: quinta, sexta e sábado, das 1h30 às 16h. Terça, quarta e domingo, das 11h30 à meia-noite
Quanto: R$ 48,50 (fatia de torta de cereja e café + cabine fotográfica e máquina de garras)

TEXTO Redação

Mercado

Turismo e lucro crescem em regiões cacaueiras com Indicação Geográfica

Frutos no cacaueiro

Por Lívia Andrade

O azul do mar em contraste com o verde da vegetação é a paisagem que salta aos olhos de quem chega de avião em Ilhéus, no Sul da Bahia. A exuberante floresta deve-se à cabruca, cacau plantado sob a sombra da Mata Atlântica, sistema de cultivo responsável por manter a mata em pé.

Esse patrimônio agroflorestal é um dos requisitos que caracteriza a qualidade das amêndoas do Sul da Bahia – região que, depois de obter sua indicação de procedência (IP), tenta, agora, conquistar uma denominação de origem (DO). A valorização do cacau movimenta Linhares, no Espírito Santo, que também faz seu pedido de DO, e Tomé Açu (PA), que tem visto o turismo crescer desde a obtenção de sua IP há cinco anos. 

Ao todo, o Brasil tem quatro origens do cacau chanceladas pelo Instituto Nacional de Propriedade Industrial (INPI), todas elas na modalidade indicação de procedência (IP). Além do Cacau do Sul da Bahia, que se tornou IP em 2018, do Cacau de Linhares, que conquistou o selo em 2012, e de Rondônia (desde 2023), são também amêndoas de procedência as de Tomé Açu, no Pará (desde 2019). 

Um modelo de produção como a cabruca, que acumula 250 anos de saberes de comunidades locais e que predomina em 78% das fazendas cacaueiras (segundo estudo do Instituto Floresta), reflete a valorização do território – algo intrínseco a qualquer pedido de origem. Mas a importância do território é um de uma série de requisitos de qualidade que caracterizam a conquista de uma IG. E o caminho para obter um selo destes envolve um processo longo, que engloba a elaboração de um dossiê com uma extensa documentação e informações sobre o produto, seu local de produção (solo, altitude, clima) e sua qualidade. Primeira origem de cacau reconhecida no Brasil, o Cacau de Linhares entrou com requerimento em 2009, para obter o reconhecimento como IP somente três anos depois. 

“A IP é um selo de origem e de qualidade”, explica Adriana Reis, gerente de Qualidade do Centro de Inovação do Cacau (CIC) e autora do projeto da IG do Cacau do Sul da Bahia. Além de aumentar a reputação do produto e valorizar a cultura local e seu saber fazer, Adriana explica que o selo da IP abre mercado, principalmente para o segmento de cacau especial, e, consequentemente, atrai o turismo.

O selo também reconhece o terroir único do Vale do Rio Doce, em Linhares, uma terra de aluvião alagadiça, que sofre enchentes em determinados períodos do ano, acumulando matérias orgânicas e sedimentos carregados pelo rio. “Isso confere características à nossa amêndoa”, explica Kellen Kiepper de Jesus Scampini, presidente da Associação dos Cacauicultores do Espírito Santo (ACAU), responsável pelo pedido. “Ela é mais rica em manteiga de cacau e resulta num chocolate com um sensorial mais suave”, diz ela. 

É por esta ligação estreita que relaciona território e sabor que Kellen, por meio da ACAU, está começando a reunir documentos para pleitear a denominação de origem. “A IP foi solicitada com o conhecimento que se tinha na época”, lembra. Agora, ela reconhece que, mais do que a tradição na produção de cacau – característica que ajuda a definir uma indicação de procedência –, as amêndoas provenientes dessa terra de aluvião têm características únicas, que não são encontradas em nenhum outro lugar. 

Já no Sul da Bahia, o desafio é pleitear a DO do catongo, uma variedade de cacau com amêndoas brancas originária de uma mutação genética ocorrida na Bahia. “Esta mutação causa albinismo, e estas amêndoas, depois de fermentadas, se tornam caramelo claro, com características sensoriais específicas e um sabor mais suave”, diz Cristiano Sant’Ana, diretor executivo da IG Sul da Bahia, que está pensando em tornar o catongo o tema de seu doutorado, para embasar a solicitação da DO.

“A DO será muito importante para a Bahia”, explica Sant’Ana. “Até onde eu sei, vai ser a primeira DO de cacau do mundo”, declara. Além disso, vai destacar a catongo, variedade única no planeta. “Isso vai gerar uma agregação de valor ainda maior aos lotes desta variedade e, por tabela, melhorar a inserção no mercado de todas as amêndoas do estado”, completa.

Fruto de cacau aberto

Um divisor de águas 

Independentemente da modalidade da IG, o fato é que ela identifica para o mundo o produto e sua região. Champagne, por exemplo, designa o vinho espumante produzido na região homônima na França, assim como o queijo Canastra leva o nome da Serra em que é produzido em Minas Gerais. No caso do Cacau de Linhares, além da notoriedade, a IP tem ajudado os produtores a agregar valor às amêndoas. “Em épocas de preços normais, já registramos mais de 100% de ágio em relação ao cacau commodity”, explica Kellen. 

Para o Sul da Bahia, a conquista de uma IG foi um divisor de águas. “Ela trouxe um grande avanço ao chancelar o que é e o que não é um cacau de qualidade”, frisa Sant’Ana. “Antes do Caderno Técnico da IG do Sul da Bahia, isso não existia”, completa. Outra contribuição, explica Sant’Ana, é a governança do território, que está sob o guarda-chuva de uma federação, que reúne 16 cooperativas e quatro associações, congregando mais de 3,4 mil produtores espalhados por 83 municípios. Graças a uma série de parcerias com universidades e instituições (Sebrae, Ceplac, Instituto Cabruca, Instituto Arapyaú, Centro de Inovação do Cacau, entre outras), a IG lançou um sistema de rastreabilidade do cacau em blockchain, que gerou melhores negócios aos produtores. 

Mais do que agregar valor à amêndoa, a IG certifica e protege o valor cultural de um produto. No caso do cacau, basta pisar no Sul da Bahia para ver referências do fruto em todos os lugares: o cacau enfeita os jardins da prefeitura, dá nome às lojas da cidade, está presente nas decorações, foi enredo de novela e é um ícone vivo da literatura, reconhecido mundialmente nas obras de Jorge Amado.

A mais recente IG do cacau no Brasil foi conquistada por Rondônia em 2023 e envolve todos os 52 municípios do estado. “Além de sua importância econômica, o cacau faz parte do desenvolvimento histórico e cultural do estado, inspirando nomes de municípios como Cacoal, Cacaulândia e Theobroma, este último derivado do nome científico do cacau, uma planta nativa da Amazônia”, explica Marcileide Zirondi, gestora do projeto da IG do Cacau de Rondônia. 

No passado, Rondônia chegou a produzir entre 20 mil e 40 mil toneladas de amêndoas, mas devido à vassoura-de-bruxa (doença endêmica na região amazônica), a produção caiu para 6 mil toneladas, número atual. “Mas o estado tem a meta de ultrapassar 15 mil toneladas por ano”, explica Marcileide, referindo-se ao aumento da produtividade dos atuais 350 kg/ha para 1.000 kg/ha. Segundo ela, esse crescimento será possível através de inovações tecnológicas e capacitação dos 9,6 mil cacauicultores que atualmente cultivam 17.250 hectares”.

O cacau é estratégico para Rondônia. “É uma planta nativa, que contribui para a preservação ambiental, se adaptando aos sistemas agroflorestais e promovendo a conservação de áreas de preservação permanente e reservas legais”, diz a gestora, destacando que as amêndoas do estado possuem características únicas de sabor e consistência, com qualidades físico-químicas diferenciadas, como o teor de manteiga e o ponto de fusão, essenciais para a produção de chocolates com diversos perfis de sabor e textura.

“A IG trouxe visibilidade ao cacau do estado, o que incentivou alguns produtores e chocolateiros a aprimorar a qualidade e a diferenciação de seus produtos”, explica Mercileide. “Embora seja um processo gradual, alguns agricultores de ponta já colhem os frutos, como Deoclides Pires da Silva, que conquistou prêmios nacionais de melhor cacau em 2022 e 2023”, completa. Agora, a Associação dos Cacauicultores e Chocolateiros de Rondônia (Cacauron), com o apoio do Sebrae e outras 12 instituições, está trabalhando no planejamento estratégico da cadeia para os próximos dez anos.

Cacau no sistema cabruca

Alavanca para o turismo 

A IG também é um catalisador do desenvolvimento regional, fomentando o turismo e os novos negócios. No Espírito Santo, a IG de Linhares fez multiplicar o número de fábricas de chocolate artesanal e uma série de outros produtos vinculados ao fruto, como nibs temperado, mel de cacau e aguardente de cacau. Por falar nesta última, ela tem o nome de Cacauhuatl e é produzida pela Velho Carvalho, empresa do marido de Kellen, que fechou uma parceria com a suíça Billy&Bugga para fabricação de chocolate feito com amêndoas de Linhares e Cacauhuatl, que será vendido na Suíça e no Brasil. Todo este movimento fomentou o turismo de experiência em Linhares. “Estamos com quatro fazendas abertas à visitação com hospedagem e refeição, e a ACAU está mobilizando a governança para avançar mais nesta área”, diz a presidente da associação.

No caso de Tomé Açu (PA), cidade colonizada por imigrantes japoneses que chegaram ao Brasil em 1929, o incentivo para pleitear a IG do cacau foi dado por Masaaki Yamada, professor da Universidade Agrícola de Tokyo, que, em seu doutorado, estudou o sistema agroflorestal de Tomé Açu (Safta), caracterizado pelo consórcio de cacau com outras árvores, como andiroba, e palmeiras, como açaí e dendê. “Em conversa com a diretoria da Camta (Cooperativa Agrícola Mista de Tomé Açu), o pesquisador sugeriu que tentássemos um diferencial, para resguardar e proteger o nosso cacau num mercado tão exigente e competitivo”, diz Silvio Shibata, ex-presidente da Associação Cultural e Fomento Agrícola de Tomé Açu (ACTA), que esteve na coordenação da IG.

De lá para cá, a cidade exportou amêndoas finas com o selo para a Meiji, segunda maior chocolateria do Japão, e passou a receber turistas interessados em conhecer os Saftas, modelo de produção, que ajuda a preservar a floresta na Amazônia. “Hoje, na Rota da Imigração Japonesa – Experiências e Vivências, os visitantes têm a oportunidade de conhecer a história da cooperativa Camta e algumas propriedades com Saftas”, explica Shibata, referindo-se às propriedades como Fazenda Konagano, Casa Suzuki, Agroforestal Sakaguchi, Fazenda Oppata e Fazenda Inada.

O fruto também é um chamariz de visitantes para o Sul da Bahia. “Existe uma influência direta, o cacau atrai os turistas interessados em conhecer mais sobre a história, andar por uma lavoura de cacau e degustar um chocolate”, diz Sant’Ana. Hoje em dia, a região tem várias propriedades abertas ao turismo: Fazenda Irerê, Fazenda Capela Velha, Fazenda Provisão e Chocolate Hotel, entre outras. 

Uma das mais badaladas é a Dengo Origem, fazenda da marca de chocolate Dengo que é sinônimo de qualidade no Brasil. A propriedade fica no caminho de Ilhéus no sentido Itabuna e oferece ao visitante uma imersão no universo cacaueiro – uma experiência do cacau ao chocolate. Num tour guiado, o turista conhece o viveiro de mudas, caminha pela cabruca (onde o cacau é sombreado, também, por árvores frutíferas como jaca e banana, que servem de insumo para as barras de chocolate), “quebra um cacau” e experimenta a polpa que envolve a semente.

Além disso, tem a oportunidade de provar o mel do cacau, conhecer o processo de fermentação e secagem das amêndoas e experimentar chocolates de várias intensidades de sabor. Apesar de bons exemplos, o setor de turismo no Sul da Bahia tem um caminho a trilhar. “Ainda não é como o Vale dos Vinhedos, que tem toda aquela organização entre o setor de turismo e serviços”, finaliza Sant’Ana.

O que é Indicação Geográfica (IG)? 

É uma ferramenta de valorização e um meio de proteger uma região reconhecida por ter tradição na produção de um certo produto, que se destaca por sua qualidade diferenciada e tipicidade.

As modalidades de IGs

1) Indicação de Procedência (IP) valoriza o “saber fazer” e a notoriedade pública de uma região na produção de um determinado produto. Este selo protege a relação entre o produto e sua reputação, em razão da sua origem geográfica.

2) Denominação de Origem (DO) reconhece uma região pela tradição e qualidade na elaboração de um determinado produto e chancela que o produto oriundo daquela localidade tem características singulares, não encontradas em outros lugares.

Por dentro das IGs do cacau

Sul da Bahia
Região: 83 municípios (como Ilhéus, Camamú, Canavieiras e Itabuna)
Variedades: todas
Sistema de produção: no mínimo 50% de cacau cabruca
Padrão: mínimo de 65% de amêndoas totalmente fermentadas, livre de impurezas

Cacau de Linhares
Região: uma determinada área no interior do município de Linhares
Variedades: todas
Sistema de produção: Cabruca, Sistema Agroflorestal (SAF), Pleno Sol
Padrão: amêndoas premium, amêndoas especiais

Cacau de Tomé Açu
Região: município de Tomé Açu
Variedades: todas
Sistema de Produção: Sistema Agroflorestal de Tomé Açu (SAFTA)
Padrão: Amêndoas tipo 1, 2 e 3

Cacau de Rondônia
Região: todos os 52 municípios do estado
Variedades: todas
Sistema de Produção:  SAFs
Qualidade: mínimo de 65% de amêndoas totalmente fermentadas, livre de impurezas

Texto originalmente publicado na edição #86 (dezembro, janeiro e fevereiro de 2025) da revista Espresso. Para saber como assinar, clique aqui.

TEXTO Lívia Andrade

O café e o carioca

Por Cristiana Couto

Em 1808, a chegada da família real e da corte portuguesa ao Brasil transforma profundamente a vida de seus habitantes, especialmente a dos que vivem na cidade do Rio de Janeiro. O impacto do comércio global foi visível com a abertura dos portos, no mesmo ano, que estreitou o contato entre o Brasil e a Europa, facilitando o intercâmbio de mercadorias, como o café.

O café começa a ganhar importância como item de exportação e a consolidar-se como um produto essencial para a economia do país, especialmente a partir de 1820. 

Muitos viajantes europeus que chegaram ao Brasil nesta época documentam suas impressões sobre a bebida. Alguns deles mencionam o papel crescente do café na economia brasileira, especialmente à medida que a cultura cafeeira se expande nos anos subsequentes. Mas os visitantes estrangeiros destacam, também, o papel que o grão tem no desenvolvimento cultural e social do país.

Já bastante consumido em toda a Europa e nos Estados Unidos, o café começa a ser produzido em larga escala no Brasil, e os estrangeiros passam a descrever as imensas plantações e os primeiros impactos desse ciclo na urbanização e modernização das regiões produtoras. 

Entre esses visitantes havia comerciantes, artistas, diplomatas, escritores e naturalistas. Estes últimos vinham de vários países com o objetivo de desvendar cientificamente não só a natureza brasileira, mas também os homens que habitavam o país. 

Por volta de 1812, informa a historiadora brasileira Ana Maria Martins em seu livro História do Café, o inglês John Mawe registra a presença da planta na região da Mantiqueira. Outro depoimento sobre o cafezal e seu impacto na paisagem brasileira é dado pelo naturalista francês Auguste de Saint-Hilaire, em seu trajeto entre o Rio de Janeiro e São Paulo, em 1819. “Quanto mais me aproximo da capitania do Rio de Janeiro, mais consideráveis se tornam as plantações”, nota. “Há apenas uns vinte anos que se começou por aqui a cultivar o café que hoje faz a riqueza da zona.” 

De fato, no final do século XVIII, os cafezais eram poucos, plantados em chácaras e quintais. Por isso, seus grãos eram oferecidos como produto raro, um verdadeiro luxo para as mesas mais refinadas – e com todo o imaginário que se criava em torno de um item vindo de um lugar tão distante e exótico como o Oriente. 

Afinal, após a chegada da família real portuguesa, o Rio de Janeiro absorveu, ainda mais, os reflexos da “civilização e cultura da velha e educada Europa”, como vários estrangeiros se referem ao “velho continente” em contraste com os “trópicos”. Para se ter uma ideia, segundo o historiador Luiz Felipe de Alencastro (no primeiro capítulo do segundo volume da coleção História da Vida Privada no Brasil), a chegada da corte trouxe consigo, nos anos seguintes, mais de 15 mil pessoas – em 1821, o Rio de Janeiro conta com 79 mil habitantes, contra 43 mil em 1799. 

Maria Graham, escritora britânica que esteve no Brasil entre 1821 e 1823, faz diversas observações sobre a cultura, a sociedade e o comércio do país – e a influência europeia, assim como seu valor superior em relação aos países do “novo mundo”, é bastante clara. Em seu livro Journal of a Voyage to Brazil (Diário de uma Viagem ao Brasil) ela traz um retrato amplo de suas experiências e percepções da vida urbana no Rio de Janeiro e de suas interações com figuras importantes da época. E o café não ficaria de fora. 

Uma visita à ópera, na parte “alta” da cidade e cuja vista era a “mais magnífica imaginável”, Maria Graham relata como “as senhoras e os cavalheiros portugueses, decididos a esquecer o palco por completo” – segundo ela, os atores eram “ruins” e a orquestra, “tolerável” –, ficavam “rindo, comendo doces e bebendo café, como se estivessem em casa”. 

No começo do século XIX, são comuns as descrições do consumo de café pela elite carioca após o jantar, depois do serviço de um vinho do Porto ou da Madeira. “Terminado o seu jantar, tem por hábito as nossas classes abastadas tomarem café”, escreve o artista francês Jean-Baptiste Debret em sua obra Voyage Pittoresque et Historique au Brésil (Viagem Pitoresca e Histórica ao Brasil). 

Debret é um dos que mais detalha a vida cotidiana da cidade do Rio de Janeiro – talvez por ter permanecido por muito tempo na capital, entre 1816 e 1830, quando veio ao país como integrante da missão artística francesa para estabelecer a Academia de Belas Artes no Rio de Janeiro.

Diz ele sobre a presença dos estrangeiros e as mudanças de hábitos na cidade: “O grande número de estrangeiros, duplicando a população do Rio de Janeiro, aumenta consideravelmente o consumo atual do leite, o qual, em combinação principalmente com o café e o chá, é de uso generalizado […]”.

Em História do Café no Brasil e no Mundo, o estudioso José Teixeira de Oliveira informa que, em 1792, a cidade já contabiliza 32 casas de café, embora reclame não haver nenhum registro de como seriam esses estabelecimentos. “É desoladora a falta de informações sobre a vida urbana no Brasil colônia […]. Ninguém fixou para a posteridade a imagem daqueles cafés”, avalia.

Debret relata a existência dos cafés no que era, então, o largo do palácio. Lugares de encontro “de todos os estrangeiros”, dois deles eram cafés franceses.

A influência dos europeus nas primeiras décadas do século XIX estimula, ainda mais, a elite carioca a seguir os modos de vida do velho continente. Por outro lado, a escalada do aumento na produção do café faz com que a bebida se torne cada vez mais popular na cidade. 

Com efeito, relata Debret, “todos os dias, inúmeras vendedoras de café torrado circulam nas ruas da capital”. Essas vendedoras de ganho, como as mulheres escravizadas ou libertas eram chamadas, não deixavam, porém, de diferenciar o produto para a venda. “As que pertencem a senhores opulentos ou cuidadosos vendem o café em pó dentro de pequenas latas com tampa”, relata o francês. Já as “mais modestas contentam-se em transportar o café em vasilhas de porcelana ou barro e medi-lo com uma colher de pau ou de estanho” (o moinho, ainda pouco utilizado na capital, era substituído por um grande pilão de madeira).

A relação da bebida com a sensação de alerta que ela gerava parece não ter passado despercebida pelos proprietários rurais brasileiros. No interior, relata Debret, os cafeicultores acrescentam, nos almoços “de seus trabalhadores negros, uma infusão de café sem açúcar”.

De maneiras e propósitos diferentes, a bebida atravessou toda a população carioca a partir das primeiras décadas do século, avançando cada vez mais pelo país conforme as plantações se espraiam pelo território e as condições de transporte melhoram. Os relatos de viajantes europeus sobre o café são uma documentação rica para essa época e revelam, portanto, a conexão cultural que se desenvolveu em torno dele no Brasil. 

Coluna originalmente publicada na edição #86 (dezembro, janeiro e fevereiro de 2025) da revista Espresso. Para saber como assinar, clique aqui.

TEXTO Cristiana Couto • FOTO Eduardo Nunes

Café & Preparos

Q-Graders podem atualizar certificação com protocolo CVA até dezembro

Curso CVA for Cuppers tem dois dias de duração e investimento de R$ 2.500

Em maio, a Associação Brasileira de Cafés Especiais (BSCA) oficializou uma parceria com a Specialty Coffee Association (SCA) e assumiu a operação do programa educacional da entidade no país. O acordo inclui a implementação do Coffee Value Assessment (CVA) como protocolo nacional para avaliação de cafés especiais – Colômbia e Indonésia também passaram a integrar, formalmente, o novo padrão internacional. O CVA, como já anunciado, substitui o antigo protocolo SCA, lançado em 2004.

Na prática, isso significa que todos os cursos da SCA — voltados a produtores, provadores (cuppers), torrefadores, gestores de qualidade e consumidores — passam a ser oferecidos e certificados pela BSCA em território nacional. “Para além do CVA, a parceira SCA e BSCA se propõe a ampliar o acesso aos programas de treinamento e educação para a comunidade brasileira”, explicou Vinícius Estrela, diretor-executivo da BSCA. A associação também está responsável pela tradução completa dos materiais e provas para o português, promovendo acesso amplo ao conteúdo.

Em encontro com jornalistas na semana passada, Carmem Lúcia Chaves de Brito, presidente da BSCA, afirmou que o CVA reconhece a singularidade dos cafés brasileiros. “Se avaliarmos nossos cafés única e exclusivamente com uma nota, estaremos diminuindo o que o Brasil tem para entregar ao mundo”, disse.

“Queremos mais pessoas nos países produtores que saibam o valor do café”, defende Yannis Apostolopoulos, CEO da SCA, durante o mesmo encontro. “E queremos tornar o conhecimento mais acessível para todos”, completa. 

Segundo Apostolopoulos, a ideia de a BSCA assumir os cursos da SCA é formar uma comunidade de conhecedores de cafés especiais, com destaque, especialmente, para instrutores locais e consumidores. “Esperamos ter mais instrutores locais, e não trazê-los dos Estados Unidos”, diz ele. “Vamos deixar disponível no mercado brasileiro um treinamento de nível internacional que conecta as duas pontas, produzindo assim uma grande revolução no consumo de café especial”, completa Carmem Lúcia. 

Até 31 de dezembro deste ano, profissionais já certificados como Q-Graders podem atualizar sua certificação para o novo protocolo fazendo o curso CVA for Cuppers, com dois dias de duração e investimento de R$ 2.500. A formação já começou a ser feita em Curitiba e Campinas, e inclui capitais como Varginha, São Paulo, Belo Horizonte, Brasília e Rio de Janeiro. De acordo com Estrela, mais de 60 turmas já estão previstas.“A BSCA tem organizado com escolas parceiras e instrutores habilitados cerca de 60 turmas para o CVA for Cuppers, para que a comunidade brasileira possa se atualizar e obter o fast track, com prazo até dezembro, para se tornarem Q Evolved”, disse Estrela. 

O Q Evolved é o novo curso para Q-Graders, baseado integralmente no CVA, com seis dias de duração e ainda em desenvolvimento, que será lançado mundialmente em 1o de outubro de 2025. A expectativa da BSCA é ambiciosa: formar mais de 2 mil novos profissionais ou consumidores qualificados até o final de 2026. 

Um protocolo para o valor do café

O Coffee Value Assessment é uma metodologia desenvolvida pela SCA que propõe uma avaliação mais completa do café, indo além da análise sensorial tradicional ao considerar dimensões descritivas, afetivas, físicas e extrínsecas.

Para democratizar o acesso, a SCA implantou recentemente uma política global de precificação com base na renda de cada país, medida por PIB e paridade de poder de compra (PPP). O Brasil foi enquadrado no grupo intermediário, com valores ajustados à realidade nacional. “A partir da nova política de preços da SCA e da parceria com a BSCA, os brasileiros receberão um desconto de quase 50% no valor devido à SCA”, afirma Estrela. Para mais informações ou inscrições, basta entrar em contato com a BSCA pelo email cursos@bsca.com.br.

Fomento ao consumo 

Para a BSCA, a iniciativa vai além da qualificação técnica. É também uma estratégia de fortalecimento do consumo interno e da imagem do café brasileiro no mundo. Segundo os cálculos da associação, o Brasil consome hoje 1,5 milhão das mais de 10 milhões de sacas de cafés especiais produzidas. “É fundamental que tenhamos um diálogo comum com o mercado global, para que o mundo entenda o que o Brasil tem a oferecer”, defende Carmem Lúcia.

Além disso, a entidade observa um interesse crescente dos brasileiros por cafés especiais — evidenciado pelo aumento de baristas em campeonatos, a ascensão de novas marcas e cafeterias, a expansão das certificações e o fortalecimento de políticas públicas ligadas ao turismo de cafés.

“Esse novo sistema de avaliação traz um respeito maior ao consumidor e também ao setor de produção”, conclui a presidente da BSCA. 

TEXTO Redação

Uma bebida resiliente

Por Celso Vegro

No Brasil, o varejo de alimentos é representado por vários perfis de estabelecimentos, sendo os mais emblemáticos os super e hipermercados. Porém, outros tipos também coexistem com essas instalações como: lojas de vizinhança e de conveniência, atacarejo, mercearias e hortifrutis, varejo digital e lojas autônomas em condomínios. Aproximadamente, 424 mil dessas lojas encontram-se distribuídas pelo território brasileiro. Em 2024, o faturamento, considerando as vendas no varejo alimentar para as famílias brasileiras, alcançou R$ 1.067 trilhão, representando evolução de 6,5% em relação ao ano anterior.1

O desempenho das vendas de varejo alimentar, contabilizado em 2024, compôs 9,12% do PIB do país, sendo que os trinta maiores estabelecimentos em faturamento responderam por 77% das vendas totais. Os cinco primeiros perfizeram 26,14% desse total, denotando que o segmento possui baixa concentração econômica, mantendo, portanto, estrutura competitiva.

Dentre os 240 mil SKU’s (Stock Keeping Unit, ou seja, o “CPF” de cada item distribuído pelos supermercados), a participação relativa do café alcançou 2,70% do total das vendas, considerando todos os tipos (torrado e moído, torrado em grãos e solúvel). Em 2024, esse percentual na composição do faturamento do segmento supermercadista brasileiro, de R$10,67 bilhões, representou crescimento de 35,50% no faturamento em relação ao ano anterior.

Há que se reconhecer que esse resultado é, em parte, caudatário de ação realizada, em 2003, quando, então, o Grupo Pão de Açúcar elaborou um protocolo de cooperação com seus fornecedores, abarcando as indústrias responsáveis pela torrefação e moagem do café2 por meio da Associação Brasileira de Supermercados (Abras). Como vetor norteador, o protocolo visava aprimorar a relação comercial, lastreada por princípios de qualidade e de sustentabilidade. 

Assim, foi acordado junto aos fornecedores: a) promover a qualidade e segurança dos produtos oferecidos; b) adoção de práticas sustentáveis ao longo da cadeia de produção e distribuição; c) desenvolvimento da cadeia de suprimentos através do apoio na busca por melhorias contínuas e ampliação do acesso aos mercados e tecnologias; d) promover a ética, a transparência e a responsabilidade social em todas as transações comerciais

Para o caso do café, as mudanças foram muito significativas. Em primeiro lugar, saiu a questão do preço para assumir a qualidade com cuidadosa valorização da categoria. Houve um reposicionamento do produto nas gôndolas, trazendo mais ousadia na exibição das marcas de café, associada a momentos de degustação e de palestras para os clientes apreciadores da bebida. Portanto, tratou-se de um conjunto de ações assertivas que estimularam vendas por meio da educação dos consumidores.

Desde o lançamento desse protocolo do varejo, outras inovações foram cruciais para o incremento da demanda pelo produto. A popularização das máquinas de preparação de cápsulas de café foi, talvez, a mais icônica. Esse formato elevou a um outro patamar a comodidade e praticidade da apreciação da bebida, especialmente entre famílias mononucleadas.

Após esse longo parênteses, voltemos à discussão sobre a explosiva elevação dos preços do café no varejo. Segundo dados do Instituto de Economia Agrícola (IEA), para a cidade de São Paulo, entre março de 24 a março de 2025, o café torrado e moído exibiu incremento de 85,78%, saltando de R$ 18,17 (pacote de 500g) para R$ 33,75 (pacote de 500g)3. Essa alta nos preços foi a maior registrada no período para o conjunto de 101 itens pesquisados pelo IEA.

Em contrapartida, segundo a mesma fonte, o café solúvel teve uma elevação menos expressiva, contabilizando 44,06%. Frente aos preços do torrado e moído, a alternativa mais factível de substituição do produto tem sido o solúvel. Com menos perdas e muito adequado quando misturado ao leite, o solúvel tem exibido demanda alavancada, conforme noticiou a Associação da Indústria Brasileira de Café Solúvel4 (Abics).

O café é uma bebida, reconhecidamente, de demanda inelástica, ou seja, variações de preços não são acompanhadas na mesma proporção por variações na procura. Segundo os dados apresentados pela Abras, a comercialização do café no primeiro trimestre de 2025, apesar do expressivo aumento nos preços do produto, cresceu 5,1% em volume e 3,6% em quilos. Até 13 de abril, o faturamento do café nos supermercados já alcançava R$ 4,73 bilhões.

Pelo registro das vendas nos check outs dos supermercadistas, os cinco maiores torrefadores em termos de vendas de café em pó foram Melitta, seguida por Pilão/JDE, Três Corações, Santa Clara e Maratá. Juntos, esses torrefadores compuseram 55,6% das vendas totais.

A expansão das vendas de café nos supermercados relaciona-se mais diretamente  ao consumo que ocorre no lar. Já o consumo de café fora do lar (cafeterias, quiosques, lanchonetes, bares, restaurantes, hotéis, consultórios etc.) pode ter caído em decorrência da menor oferta por parte desses estabelecimentos, devido ao incremento dos preços do produto. 

Como perspectivas para a evolução do consumo de café, duas medidas em análise no Congresso Nacional poderão impulsionar a demanda pela bebida. A primeira refere-se à configuração da cesta básica nacional que, com isenção de tributos, poderá promover baixa de preços do produto. Na maior parte dos casos, o café é tributado em 7%, mas, em alguns estados, o ICMS alcança percentuais bem maiores, como 20,5% na Bahia ou 20,0% nos estados do Amazonas, de Roraima e da Paraíba. 

Uma das ações do governo federal, apoiada pela Abras, consiste na revisão para baixo das taxas administrativas das empresas de voucher de alimentação e a possibilidade de concessão do benefício por meio de pix no holerite dos beneficiários, entre outras ações que indicam o incremento de até R$ 10 bilhões ao ano nas contas dos trabalhadores. 

Diante de todo o contexto estatístico exposto, surpreende a capacidade do café em exibir tenaz inelasticidade. Preços nos atuais patamares, associados ao vigoroso crescimento da demanda, constituem parâmetro que vale para o Brasil, assim como para todos os demais países produtores e importadores da bebida.

1 Os dados contidos nesta coluna foram apresentados por João Galassi & Márcio Milan, presidente e vice-presidente de Relações Institucionais e Administrativo da Abas. Encafé 2025 – Campinas/SP. 24 a 26/04/2025.

2 Informação recolhida por meio de consulta de Inteligência Artificial após busca com a seguinte expressão: “protocolo de cooperação GPA 2003”.

3 Os preços médios no varejo da cidade de São Paulo são levantados todos os dias (segunda a sexta-feira), presencialmente, em 370 equipamentos varejistas divididos em: 169 supermercados; 69 feiras-livres; 40 açougues; 79 quitandas, sacolões, hortifrutis e 13 padarias.
Ver: https://iea.agricultura.sp.gov.br/out/varejo.php. Acesso em 06/04/2025.

4 Segundo a associação, no primeiro trimestre de 2025 frente ao mesmo período do ano anterior, houve elevação de 6,2% na demanda por solúvel. Disponível em: https://abics.com.br/continua-escalada-no-consumo-de-cafe-soluvel/

TEXTO Celso Luis Rodrigues Vegro - Eng. Agr., MS, Pesquisador Científico VI do IEA - celvegro@sp.gov.br • FOTO Agência Ophelia

Mercado

Pesquisadores brasileiros desenvolvem roda de sabores inédita para o café canéfora

Estudo identifica 103 descritores sensoriais para a espécie, com o objetivo de promover sua valorização no mercado de cafés especiais

Por Cristiana Couto

Um grupo de pesquisadores brasileiros desenvolveu a primeira roda de sabores dedicada aos cafés da espécie canéfora. O estudo, que acaba de ser publicado na revista Scientific Reports, um braço da Nature, buscou identificar e organizar os descritores sensoriais da espécie, criando uma ferramenta para avaliação de qualidade e promoção no mercado de cafés especiais. A pesquisa foi conduzida por Fabiana Carvalho (The Coffee Sensorium), e teve a participação dos cientistas Enrique Alves (Embrapa Rondônia) e Lucas Louzada, entre outros.

“Embora a avaliação sensorial de cafés canéfora seja feita por meio de protocolos padronizados, falta no mercado uma ferramenta descritiva específica para a compreensão mais ampla de suas características”, escrevem os autores.

Descrições sensoriais precisas de cafés canéfora são cada vez mais mais importantes num mercado que vem recebendo, nos últimos anos, canéforas brasileiros com qualidade sensorial cada vez maior. Isso porque manejos adequados, melhoramento genético e processos pós-colheita cuidadosos ajudaram a tornar a espécie, que já é mais resistente a pragas, doenças e altas temperaturas, uma alternativa viável ao arábica diante das mudanças climáticas.

A pesquisa sugere, portanto, que a nomenclatura de cafés de alta qualidade deve ser reconsiderada, para incluir os cafés canéforas como de “especialidade”. “A suposição de ‘baixa qualidade’ desviou a captura de C. canephora por mecanismos alternativos da cadeia de suprimentos (por exemplo, comércio justo, comércio direto) e enfraqueceu a motivação para a melhoria da qualidade, comum no mercado de café arábica especial”, dizem os autores. Eles também não deixam de pontuar que, ao se tratar de qualidade, deve-se considerar que genoma, composição química, práticas de cultivo e pós-colheita da espécie foram muito menos estudados do que os cafés arábicas – principalmente no que diz respeito a procedimentos-padrão e/ou potenciais marcadores para a qualidade da bebida.

O estudo envolveu 49 avaliadores de café profissionais (produtores do Brasil e importadores da Suíça), em três sessões de degustação. Foram avaliadas 67 amostras de 13 países diferentes (Brasil, Congo, Costa Rica, Cuba, Equador, Gana, Guatemala, Índia, Indonésia, México, Peru, Uganda e Vietnã), com diferentes processos de pós-colheita (lavados e naturais) e níveis de qualidade (especiais e não-especiais). A roda de aromas resultante, organizada em três níveis (categorias, subcategorias e descritores específicos), contém 103 descritores de aroma e sabor – a posição dos termos na roda foi determinada pela média das pontuações. Entre os descritores mais destacados estão “torrado”, “doce”, “frutado” e “cacau”, enquanto “salgado” apresentou menor frequência.

Segundo os pesquisadores, o protocolo de cupping para canéforas é bastante diferente do protocolo de arábicas, especialmente na avaliação de acidez e doçura, e a padronização é fundamental para a comunicação entre produtores e consumidores.

As amostras selecionadas buscaram representar uma ampla gama de atributos de sabor, e foram transportadas aos avaliadores como grãos de café verde em embalagens a vácuo.

Os autores do trabalho identificaram, ainda, que avaliadores de café de diferentes locais apresentaram diferenças significativas nas classificações de categorias de sabor, como frutado, doce e especiarias, devido às diferenças culturais e de mercado entre europeus e brasileiros. Essas diferenças influenciam a terminologia e a intensidade das notas de sabor. “Avaliadores brasileiros tendem a focar mais em notas doces, enquanto os europeus valorizam notas frutadas”, diz o artigo.

Por exemplo, a categoria “frutado” foi avaliada, em média, em 5,68 pelos avaliadores importadores, mas em 3,84 pelos exportadores. Já a categoria “caramelo” teve a maior média de pontuação, com 21,4. “A interação entre o avaliador e o nível de qualidade do café foi significativa, com importadores avaliando cafés de baixa qualidade mais generosamente”, relatam os autores do artigo.

O estudo destaca, ainda, a necessidade de reconhecer o potencial dos cafés canéfora, incentivando práticas que valorizem sua qualidade e contribuam para a sustentabilidade da cafeicultura global.

TEXTO Por Cristiana Couto • ILUSTRAÇÃO Divulgação

Cafezal

Como as altas temperaturas estão afetando os cafezais no Brasil?

Especialista em fisiologia vegetal explica o funcionamento da planta em clima muito quente; produtores acreditam em mais perdas em 2025

Por Cristiana Couto (colaborou Angela Ruiz)

A seca prolongada e as altas temperaturas vêm preocupando produtores de café pelo país, levantando alertas sobre possíveis quebras, inclusive, na safra de 2026. A Espresso conversou com especialistas e produtores para entender como a condição climática atual está afetando os cafezais, e qual a previsão do tempo para os próximos dias nas diversas regiões produtoras.

O dia em que a chuva parou

“O clima vinha bem até o fim de janeiro, com temperaturas amenas, bom para o desenvolvimento dos frutos, podendo melhorar as previsões da safra de 2025”, resume Jean Vilhena Faleiros, CEO da Eldorado Specialty Coffees, na Alta Mogiana, sobre as dificuldades de 2024 que, entre março e outubro, resultaram em mais de duzentos dias sem chuvas. Mas, no início de fevereiro, as chuvas pararam (4/2, em algumas regiões, 5 e 6/2, em outras). “Alguns lugares alcançaram temperaturas 15% acima da média”, relata Faleiros, que também é presidente do Instituto Brasileiro dos Cafés de Origem e da Associação dos Cafeicultores da Alta Mogiana. 

Em Araxá, no Triângulo Mineiro, Daniela Burger Aguiar, empresária à frente da Fazenda Congonhas, faz relato semelhante. “Nesta época, sempre chovia. Choveu muito em dezembro, mas agora parou. Estamos há 30 dias sem chuva”, preocupa-se ela.

Perdas e torcidas

Desde 2021 o Brasil enfrenta problemas climáticos na cafeicultura, com quebras subsequentes de safra. “Vamos torcer para que o clima fique bom, para vermos como será a de 2026, pois a de 2025 já está comprometida”, diz Faleiros. “Antes, quando ficava muito quente, chovia à noite, refrescando. Agora, nem isso temos. Tem dois anos que o clima está adverso e afetando todas as lavouras, principalmente o café”, relata Daniela, que também produz outras culturas. 

Calor de efeito 

Mas não é só o estresse hídrico que aflige os cafeicultores. As altas temperaturas, que acompanham a falta de chuvas, não só já provocaram perdas na safra atual, que vinha sofrendo danos desde 2024, como podem também afetar a safra de 2026. 

Segundo Paulo Mazzafera, especialista em fisiologia vegetal e professor-sênior do Instituto de Biologia da Unicamp, essa combinação está sendo ruim para a granação (desenvolvimento dos frutos), que acontece nessa época. “Se fosse só a falta de chuva, teríamos grãos pequenos, menores, mas com aumento da temperatura, o que estamos observando é a morte da semente no interior do fruto”, explica ele, referindo-se aos grãos denominados chochos.

“Sempre tivemos veranicos, os períodos com falta de água, mas eles nunca vieram acompanhados de temperaturas tão altas como estamos vendo”. “A questão é que viemos de vários problemas desde a geada [de 2021], que foi grave e um divisor de águas”, emenda Marco Valério Brito, presidente da Coccamig. “O mercado está sensibilizado”, diz.

Como se isso não bastasse, o que se vem observando há algum tempo nas lavouras, conta Mazzafera, é a queima de folhas por conta das temperaturas elevadas. “Quando a folha fecha os estômatos por causa da alta irradiação e por falta de água, a planta deixa de transpirar”, explica. Essa transpiração da água, porém, é um mecanismo de retirada de calor da folha. 

Essa falta de retirada de energia pela transpiração da água, ensina Mazzafera, faz com que a temperatura da folha aumente a níveis realmente muito altos. “Isso começa a gerar a morte de tecidos”, conclui. Além das folhas, diz o especialista, há também relatos da queima de frutos por fora. 

A tal da poliembrionia

Além de grãos chochos, cafeicultores têm observado o aparecimento de grãos concha. “No fruto de café existem duas lojas, e em cada uma contém um ovário”, ensina Mazzafera. Ele diz que, com o aumento de temperatura, dá-se  o fenômeno denominado poliembrionia, ou seja, o aparecimento de mais de uma semente por loja. 

Consequentemente, as sementes ficam entremeadas umas às outras e isso dá o que se convencionou chamar de grão concha. “Além das perdas para o cafeicultor durante o beneficiamento, pelo fato de o grão concha ser menor, ele também atrapalha a torra, pois vai queimar e conferir o gosto amargo ao café”, lembra ele. 

Para o cientista, a perda de café já é certa, apesar das previsões de chuvas que se aproximam. “Seria muito bom se chovesse. Mas esses grãos que já estão morrendo e os que estão formando conchas já são uma perda, não há como reverter”, afirma. 

E a chuva? 

Segundo a Climatempo, algumas áreas cafeicultoras vão se beneficiar da umidade trazida pela chuva nos próximos dias. “Neste final de primeira quinzena de março, estamos observando que a umidade começou a aumentar por causa de áreas de instabilidades que estão se espalhando por São Paulo e sul de Minas Gerais”, explica a meteorologista Nadiara Pereira. Nessas áreas, diz ela, as instabilidades ganham força e trarão chuvas regulares e com volumes “significativos” nos próximos dez dias. 

Essas chuvas mais volumosas, de acordo com a Climatempo, devem cair sobre a zona da Mata Mineira e chegar até o sul do Espírito Santo na próxima semana (entre 18 a 22 de março). 

Aos poucos a chuva vai avançar. “Nas áreas mais ao sul da região sudeste, Alta Mogiana, sul de Minas e as principais áreas de arábica vão sentir uma melhora tanto em condições de temperatura quanto em aumento das chuvas”, prevê a meteorologista. 

Mas esse avanço não deve cobrir todas as áreas cafeeiras. “Espírito Santo, áreas mais ao norte de Minas e interior da Bahia ainda vão continuar com altas temperaturas e tempo mais seco”, diz Nadiara. 

Nem tudo são flores 

Mazzafera diz que vai ser difícil avaliar o impacto da seca em diferentes regiões, já que as plantas reagem de formas distintas. Um exemplo é a diferença na exposição solar: as partes da lavoura que recebem o sol da tarde, mais intenso, tendem a sofrer mais do que aquelas que recebem a luz da manhã, que é mais amena. “É cedo para contabilizar perdas, depende da região”, afirma Brito. “O não enchimento dos frutos pode ter impactado no tamanho do grão. Mas se as chuvas chegarem, vai regular o ciclo do café e minimizar as perdas”, torce ele. 

Além das perdas já computadas com a morte dos frutos, cafeicultores e especialistas temem pela safra de 2026. “Nessa época do ano ocorre a diferenciação das gemas”, explica Mazzafera, referindo-se às estruturas que vão formar as florzinhas do café. 

“Nós veremos isso quando retornarem as chuvas, e não sabemos se essa alta temperatura afetou essa diferenciação. Não dá para ver ainda, e esse é um outro problema que pode acontecer”, alerta. “O negócio agora é esperar que a chuva venha para que aqueles cafés não fiquem com peneira muito baixa por causa de efeito na granação. Não dá pra prever muito bem o que vai acontecer, quantificar, mas que vai haver perda, vai haver perda”, lamenta Mazzafera.

Faleiros preocupa-se com as consequências desse calor para o comércio dos grãos. “O cenário de preços do café e de estoque precisam de uma estabilidade de pelo menos dois anos para mudar”, calcula. “Vínhamos com estoque bom, que supriu o mercado em 2022, após a geada de 2021. Hoje, por causa da quinta safra ruim, não tem estoque em nenhum lugar do mundo”, alerta. 

Apelo à sustentabilidade

Por fim, Mazzafera ressalta, em publicação recente, que esses impactos das altas temperaturas e da escassez de chuvas na fase da frutificação já eram previstos e sugere, nas próximas safras, o uso de práticas integrativas como irrigação, nutrição balanceada, controle de pragas e doenças, utilização de plantas de cobertura, adição de matéria orgânica e de tecnologias que aprofundem o sistema radicular para minimizar as perdas.

“Além disso, práticas conservacionistas bem estabelecidas e a utilização de agentes biológicos, biofertilizantes e bioestimulantes, são pilares indispensáveis para sustentar uma cafeicultura rentável em tempos de desafios climáticos severos”, escreveu. 

Mercado

Exportações brasileiras tem queda de 10,4% em fevereiro, diz Cecafé

Receita, porém, subiu 55,5%; cafés diferenciados representaram 25% das exportações e dobraram o faturamento; exportação de solúvel cresce 16,5%
 

Da Redação

Em fevereiro, o país exportou 3,274 milhões de sacas de café – uma queda de 10,4% em comparação com o mesmo período do ano passado, diz relatório de fevereiro do Conselho dos Exportadores de Café do Brasil (Cecafé) divulgado nesta quinta (13). A receita, porém, é 55,5% maior, um recorde: US$ 1,190 bilhão, reflexo das cotações elevadas no mercado global (para acessar o relatório completo, clique aqui).

As exportações somam 33,452 milhões de sacas nos oito primeiros meses da safra 2024/25, o que gerou divisas de 9,723 bilhões de reais – uma alta recorde de 59,8% em receita cambial se comparada ao mesmo intervalo anterior (julho de 2023 a fevereiro de 2024).

Para Marcio Ferreira, presidente da Cecafé, “embora as bolsas internacionais tenham recuado, os preços atuais e cotações médias dos últimos meses são significativamente maiores do que aqueles praticados no mesmo período do ano anterior”. 

Preços ao consumidor podem subir 

Ferreira lembra, porém, que os canéforas do Brasil na bolsa de Londres não estão com preços competitivos como os do Vietnã, por exemplo, porque estamos na entressafra. Também os arábicas nacionais estão mais caros na bolsa de Nova York.

Sobre a diminuição do comércio de café, Ferreira cita como causas a redução de linha de crédito e um eventual recuo pontual no consumo da bebida. “Novas altas nos preços ao consumidor não devem ser descartadas. Esses potenciais aumentos gerarão uma redução no consumo”, declara. 

Safra 2026/27 pode se recuperar

Segundo Ferreira, se o inverno for sem intempéries e as chuvas retornarem em volume suficiente, a safra 2026/27 poderá ter boa florada e se recuperar. “No momento, a certeza para a safra 2025/26 é de um volume bem menor para o arábica e maior ao conilon”, prevê o presidente do Cecafé. Nesse cenário, diz ele, não será possível bater recordes de exportação, mas o Brasil ainda terá “uma participação representativa”. 

Os Estados Unidos foram o principal destino dos cafés brasileiros neste primeiro bimestre, importando 1,206 milhão de sacas (16,6% do total). Em seguida vem a Alemanha (878.350 sacas, 12,1% do total), a Itália (531.260 sacas), o Japão (478.844 sacas) e a Turquia (354.904 sacas).

Problemas logísticos

Apesar de Vietnã e Indonésia estarem mais competitivos no primeiro bimestre, ambos — respectivamente, segundo e quarto maiores produtores globais — continuam ampliando a compra de café verde brasileiro. Nos dois primeiros meses do ano, os vietnamitas importaram 72.836 sacas (aumento de 297,3%), enquanto os indonésios adquiriram 47.471 sacas (um crescimento de 29,2%).

Ferreira acredita que muitas dessas exportações correspondem a contratos fechados em 2024, quando os canéforas brasileiros estavam mais competitivos. No entanto, parte desse volume ainda não foi embarcada devido a problemas logísticos –  atrasos de navios, mudanças de escala e rolagens de carga, reflexo da infraestrutura portuária defasada do país.

Solúvel cresce 16,5%

O café arábica manteve a liderança nas exportações brasileiras no primeiro bimestre, com 6,07 milhões de sacas embarcadas ( 83,4% do total). Apesar do volume expressivo, houve queda de 0,7% em relação ao mesmo período de 2024.

Na segunda posição, solúvel registrou um crescimento de 16,5%, com 640.996 sacas exportadas (8,8% do total). Já os canéforas tiveram recuo de 45,5%, somando 559.928 sacas (7,7%), enquanto o café torrado e torrado e moído apresentou o maior crescimento percentual – alta de 63,9%, mas com um volume modesto de 7.993 sacas (0,1% do total).

Os cafés de qualidade superior ou com certificados como sustentáveis representaram 24,8% das exportações, com 1,8 milhão de sacas embarcadas — um crescimento de 14,7% em relação ao mesmo período de 2024.

Com preço médio de US$ 398,47 por saca, os cafés diferenciados geraram uma receita de US$ 717,7 milhões – 28,5% do total obtido com as exportações de café no período. Em relação ao ano anterior, a valorização foi expressiva, com um aumento de 101,1% no faturamento.

Os Estados Unidos lideraram as compras desse tipo de café, adquirindo 351.205 sacas (19,5% do total exportado). Na sequência, aparecem Alemanha (228.840 sacas, 12,7%), Bélgica (179.510 sacas, 10%), Japão (125.646 sacas, 7%) e Holanda (118.806 sacas, 6,6%).

TEXTO Redação

Cafezal

Exportações de café verde em janeiro caem 14,2% no mundo todo, diz OIC

Relatório aponta terceiro mês seguido de queda nas exportações globais; Vietnã lidera recuo, enquanto África cresce; já as exportações de arábica do Brasil recuam 1%

Da Redação

As exportações globais de café verde em janeiro somaram 9,72 milhões de sacas – queda de 14,2% em relação às 11,32 milhões de sacas exportadas no mesmo mês de 2024, diz o relatório mensal da OIC (Organização Internacional do Café), que analisa os eventos recentes na indústria global do café. Foi o terceiro mês seguido de retração, após 12 meses de crescimento (entre novembro de 2023 e outubro de 2024).

A queda recente se explica, diz a OIC, pelo crescimento, no ano cafeeiro 2023/24, de 12,3% das exportações (que atingiram 124,39 milhões de sacas) – o maior volume já registrado pela OIC e o maior aumento absoluto da história, com um acréscimo de 13,63 milhões de sacas.

Já as exportações totais de café (verde, torrado e solúvel) somaram 10,83 milhões de sacas no mesmo mês – uma redução de 13,3% em relação aos 12,49 milhões de sacas exportadas em janeiro de 2024, diz o relatório mensal de fevereiro da OIC (Organização Internacional do Café).

Este é o terceiro mês consecutivo de queda nas exportações globais desses cafés, depois de 13 meses seguidos de crescimento. O resultado disso, segundo o boletim, foi o decréscimo de 4,9% nas exportações acumuladas no ano cafeeiro 2024/25 (42,79 milhões de sacas contra 45,01 milhões no mesmo período do ano anterior), sendo a Ásia e Pacífico os principais responsáveis (27,1% nos 12 meses até janeiro de 2025).

A queda acentuada dos robustas

No mundo, a maior queda das exportações de janeiro foi entre os robustas, que recuaram 27,5% (de 5,1 milhões de sacas em janeiro de 2024 para 3,7 milhões de sacas em janeiro de 2025). Segundo a OIC, essa queda acentuada foi impulsionada pelo Vietnã – responsável por recuar 43,8%. Isso reflete um dado atípico de janeiro do ano passado, quando o Vietnã registrou seu maior volume mensal de exportação de grãos verdes já registrado.

Ajudando a compensar parte dessa queda dos robustas, Indonésia e Uganda tiveram um aumento de 230% (250 mil sacas) e 20,4% (80 mil sacas), respectivamente.

Já as exportações de arábica do Brasil caíram 1% (passando de 3,59 milhões para 3,55 milhões).

Também os estoques certificados de café robusta em Londres diminuíram 4,9% entre janeiro e fevereiro de 2025, fechando fevereiro em 720 mil sacas. Já os de arábica tiveram uma queda mais acentuada – 7,5% (ou 840 mil sacas).

Para saber mais:

Em termos continentais, enquanto as exportações da América do Sul em janeiro caíram 4,2% (de 5,41 para 5,18 milhões de sacas, queda esta impulsionada pelo Peru, que recuou 58,9%), a África cresceu 7,1% (de 1,03 milhão para 1,1 milhão de sacas) e o México e a América Central, 10,9% (atingindo 1,1 milhão de sacas).

O crescimento do volume das exportações na África – o maior desde 1997, quando somaram 1,12 milhão de sacas – foi impulsionado pela Costa do Marfim e por Uganda (os dois maiores exportadores africanos de robusta), cujas exportações combinadas cresceram 28,1%.

Torrado cresce 1,4%

As exportações totais de café solúvel também caíram: o recuo foi de 5,2% em janeiro (1,05 milhão de sacas, em comparação com 1,1 milhão de sacas no mesmo mês em 2024). O mesmo não aconteceu com os cafés torrados, cujo aumento foi de 1,4%, atingindo 60.532 sacas. 

O recorde do I-CIP

O I-CIP atingiu novos recordes em fevereiro –  354.32 centavos de dólar por libra-peso (preços nominais), um aumento de 14,3% em relação a janeiro –, com a maior média mensal já registrada e superando o recorde de março de 1977 (305,13). O I-CIP (Índice Composto de Preços da OIC) representa uma média ponderada dos preços diários dos cafés comercializados no planeta e serve como um indicador de referência para o mercado internacional.

A OIC deu duas possíveis razões para essa retração dos preços iniciada em meados de fevereiro: a primeira delas é que, em 10 de fevereiro, a ICE aumentou os requisitos de margem em até US$ 3.046 para contratos de arábica com vencimento em março de 2027. Isso pode ter levado alguns traders a liquidarem suas posições por conta do aumento dos custos operacionais. A segunda razão é que a divulgação de resultados negativos em pesquisas de negócios e confiança do consumidor feitas em fevereiro nos EUA e na União Europeia impactou negativamente a confiança dos consumidores.

Tudo isso pode ter desencadeado uma realização de lucros, levando a uma retração nos preços. Esse movimento, ainda, foi sustentado por fatores como fluxo de caixa (necessidade de liquidez e o aumento da demanda por créditos comerciais, que elevam os custos e riscos das operações), incertezas resultantes do anúncio de aumentos tarifários pelos EUA, estimativas preliminares aparentemente positivas da safra 2024/25 do Vietnã (que podem ter aliviado preocupações sobre um possível déficit de oferta) e clima favorável (espera-se que o fenômeno La Niña substitua o El Niño intenso de 2024).

Fonte: OIC (Organização Internacional do Café)

TEXTO Redação

Mercado

Ranking internacional de cafeterias cita apenas uma brasileira entre as 100 melhores

Por Cristiana Couto

A paulistana Cupping Café, na Vila Madalena, é a única cafeteria brasileira a integrar a primeira edição do ranking The World’s 100 Best Coffee Shops, organizada pela empresa espanhola NeoDrinks. O anúncio das cem melhores do mundo foi feito nesta segunda (17), em Madri, durante o evento Coffee Fest. A Cupping Café posicionou-se em 92o lugar.

O primeiro lugar ficou com Toby’s State Coffee Roasters, da Austrália, país que emplacou mais três estabelecimentos entre os dez melhores na lista, ao lado dos Estados Unidos, Áustria, Noruega, Singapura, França, Malásia e Colômbia – estes dois últimos, os únicos países produtores de cafés contemplados entre os dez mais bem posicionados. “A Austrália tem uma tradição e uma qualidade enorme de cafés, de serviço de baristas e de equipamentos”, diz Edgard Bressani, CEO da Latitudes Brazilian Estates e autor do Guia do barista – Da origem ao café perfeito. 

O ranking avaliou mais de quatro mil cafeterias, baseando-se nos critérios de qualidade do café, habilidade do barista, práticas sustentáveis, serviço, atmosfera, qualidade dos alimentos, inovação e consistência. Um júri internacional de especialistas e profissionais da indústria (com peso de 70%) e votação pública online (que compõe 30% do peso da nota) determinaram as melhores de uma lista preliminar de 200 cafeterias indicada pelo público ou pelos profissionais. 

Entre os coordenadores de cada região de votação estão nomes como Michalis Dimitrakopoulos, campeão mundial de baristas e chefe do júri para a Europa Oriental, Kat Melheim, fundadora do Coffee People Zine e chefe do júri para a Costa Leste dos EUA, a especialista e educadora Dara Santana, chefe do júri para a Europa Ocidental e Darveris Rivas, especialista em cafés venezuelano e chefe do júri para a América do Sul. O site oficial não revela o número total de jurados. “Há, porém, casas que ficaram de fora, como a Substance [Cafe], em Paris, a Sisu [Coffee Studio], no Panamá, a loja conceito da Espresso Lab, em Istambul”, lembra Bressani. 

“De fato, algumas cafeterias tradicionais do mundo e do Brasil não estão contempladas na lista. Assim como aconteceu com outras premiações de gastronomia, questionamentos sobre rankings parecem fazer parte do negócio”, reforça Caio Alonso Fontes, CEO da Espresso&CO. “Vale considerar que esta é a primeira edição do ranking, e que listas como estas geram visibilidade e impulsionam mercados”, conclui.

TEXTO Cristiana Couto • FOTO Divulgação