Mercado •
“Queremos ser a principal marca global de cafeterias”, diz CEO da The Coffee
Carlos Fertonani, CEO e cofundador da The Coffee, pretende chegar em duas mil unidades em cinco anos
Com 195 unidades no Brasil e 15 na Europa em cinco anos de existência, a rede de cafeterias The Coffee é o ouro negro de Carlos Fertonani, de 46 anos. Cofundador e CEO da empresa, de DNA nacional mas inspiração japonesa, o curitibano pretende, até 2028, chegar à marca de 2 mil lojas mundo afora.
Com um novo aporte na empresa de US$ 10 milhões, firmado em outubro de 2023, e a aposta em um modelo de franquia, Fertonani quer entrar com tudo na Europa, na Ásia e nos Emirados Árabes. Ele e seus sócios e irmãos, Alexandre e Luis Fertonani, também querem incrementar a presença da The Coffee no Chile, no Peru e no México.
De sua cidade natal, Carlos Fertonani conversou com a Espresso sobre o modelo de negócio e os planos de expansão da empresa, design, tecnologia e sua percepção do mercado consumidor de cafés especiais. “Empreender é ter persistência”, define. A seguir, a entrevista.
Espresso: Como você começou no mercado de cafés e por que decidiu criar a The Coffee?
Carlos: Eu conhecia um pouco do mercado de café antes de abrir a The Coffee. Já tinha me envolvido em um projeto da cafeteira Aram, de Maycon Aran, o que me levou a participar das feiras sobre a bebida. Então, além de consumir e gostar da bebida, comecei a entender mais desse setor, o que significava realmente um café especial, o que era a terceira onda de café. Em 2017, eu e meus irmãos fizemos uma viagem ao Japão e, na época, o mercado de cafés de lá era muito mais evoluído do que o daqui, a bebida estava bombando, havia muitas cafeterias de cafés especiais. E lá tinha esse modelo de cafeterias bem pequenas, de portinha, em que o barista atende o cliente de frente pra rua, como um take away ou to go. Esse modelo não funcionava ainda no Brasil, mas aí pensamos em trazer o conceito, porque seria uma maneira de instruir as pessoas de que aquele café era pra levar, “to go”.
E: Como foi o processo de sair de uma primeira loja para uma rede de cafeterias?
C: Montamos a primeira loja em Curitiba, de portinha, pequenininha, mas com o conceito parecido com todas as outras que temos: diagramação visual, aplicativo, tablet. Dali a 8 ou 9 meses, abrimos a segunda, que já foi uma franquia. A gente não queria montar só uma loja, idealizamos o negócio para ser uma marca, uma rede. Entendemos que tínhamos que dar todo o suporte, o know how ao franqueado, como prover produtos sistema, modelo e treinamento. Nos especializamos nisso. A terceira loja abriu em 2019, na Rua dos Pinheiros, em São Paulo. Neste meio tempo, recebemos uma oferta de um fundo venture capital [fundo de investimentos que foca em empresas iniciantes] e fechamos um acordo. A ideia dos investidores era que a gente fizesse mais lojas próprias do que franquias. Hoje temos 13 lojas próprias, mas mantemos o foco no modelo de franquia, que está cada vez mais enraizado na nossa cultura.
E: Você acredita que o modelo de franquia é melhor do que o de lojas próprias?
C: Hoje estamos com 210 lojas, sendo 5% delas próprias. O modelo de franquias funciona muito bem pra nós, mas cada negócio é um negócio. Existem negócios em que o modelo de franquias talvez não funcione tão bem, como, por exemplo, o caso da Aesop [marca de cosméticos de luxo australiana recentemente adquirida pela L’Oréal]. Eles têm cerca de 200 lojas pelo mundo, todas próprias, mas é um modelo diferente, muito conceitual, sem o objetivo de escalada – eles só querem ter duas, cinco lojas nas principais capitais. Neste caso, o modelo de loja própria se encaixa. Mas quando falamos de milhares de lojas, não há como fazer isso com capital próprio, mesmo que se faça captação de investimento ou financiamento (e fazer dívida é muito perigoso). Mas o modelo de franquia descentraliza o negócio: cada um cuida do seu e nós cuidamos da marca.
E: Vocês receberam uma segunda rodada de investimentos para uma expansão internacional. Como estão planejando esse crescimento?
C: Continuaremos a expandir com o modelo de franquia. Na Europa, onde fizemos nossa primeira expansão internacional, temos uma operação própria. Mandamos um time para lá e abrimos a nossa loja. Hoje são 15, e o restante são franquias. Mais 15 unidades serão abertas nos próximos cinco meses, em Portugal, na Espanha e na França. Já nos países não europeus, como Peru, Chile e México, o modelo será o de master franquia. Ou seja, em cada novo país em que entraremos com esse modelo, os master franqueados vão começar a incluir mais lojas. Por exemplo, abrimos uma loja no Peru e o master franqueado de lá já está para abrir outras duas lojas. A mesma coisa está acontecendo no Chile. Isso vai aumentar o ritmo de expansão. Mas também estamos de olho em outros países europeus e temos, ainda, um acordo com os Emirados Árabes. Ainda não abrimos a loja, mas já temos o ponto, assim como na Tailândia.
E: Qual a previsão dessa expansão para os próximos anos no Brasil? Ou já há um número suficiente de lojas?
C: Acreditamos que o Brasil tem um potencial para mais mil lojas. Estamos com quase 200 lojas no país hoje. O ritmo de expansão vai desacelerar um pouco, mas continuaremos crescendo. Mas queremos achar os franqueados certos, os pontos certos. A gente estava crescendo muito rápido. Tínhamos quiosques, o que facilitou o ritmo de crescimento, mas isso não é legal para a marca, porque ela acaba sendo caracterizada como um café de quiosque.
E: E qual a previsão do total de lojas a longo prazo?
C: Montamos um plano para apresentar aos investidores, e queremos, nos próximos cinco anos, chegar a 2 mil lojas.
E: As lojas da The Coffee, em sua maioria, são pequenas (entre 10 e 12 m2). Esse é o modelo que mais cresce hoje?
C: A gente aumentou o portfólio de lojas. Hoje temos lojas grandes, chamadas premium. Não sabemos qual vai ser a proporção, calculamos algo como 30% lojas premium para 70% lojas pequenas. Quanto a estas,temos lojinhas de 10 até 50 m2, com o mesmo portfólio de produtos. A comida é minimalista: cookies, brownies e bolos. Desenvolvemos essas cozinhas locais, para cada cidade poder fornecer para as lojas que estão ao redor. E são receitas nossas, e fazê-las não é um bicho de sete cabeças, é apenas conseguir manter padrão e consistência. As lojas só finalizam as receitas. Além disso, estamos desenvolvendo a seção de panificação, com croissant, pain au chocolat e pães de fermentação natural para fornecer para as lojas premium, que servirão brunch. Ou seja, estamos nos especializando nesses produtos, que combinam com café. E isso permite que a gente faça lojas maiores. O ideal é que a gente não dependa do café.
E: Como é o processo de escolha dos cafés? Eles têm várias origens ou trata-se de um blend único para as lojas?
C: Temos três categorias: o White, o Kraft e o Black. O White é para todas as bebidas à base de espresso e, atualmente, vem de um único fornecedor, a CarmoCoffees. Nas opções Kraft e Black, destinadas aos coados – e teremos a opção também para espressos –, trabalhamos outras variedades, e sempre temos novidades. A gente compra café verde das fazendas, fazemos nossa torra em Curitiba e mandamos para o país inteiro. Temos também uma torrefação na Europa, para onde enviamos o café verde. Os pacotinhos têm QR Code com o nome do produtor, a altitude em que o café foi produzido, a variedade, o processamento e tudo o mais. O Kraft, acima de 85 pontos, e o Black, acima de 88 pontos, são microlotes variados.
Espresso: Essa expansão internacional terá cafés brasileiros?
C: Na maior parte das vezes sim, porque o café brasileiro é muito bom, e temos contato com muitas fazendas. O que não impede que a gente busque outros fornecedores. Na Europa, por exemplo, o White é café brasileiro, mas o Kraft e o Black são de outros lugares. Tem café colombiano, do Vietnã, da Etiópia…
E: Como vocês enxergam hoje o consumidor brasileiro de café? No caso do The Coffee, é um cliente que entra na loja buscando café especial ou apenas um consumidor que quer tomar, rapidamente, um café com um amigo?
C: Poucas pessoas entendem o que é café especial, e, mesmo que você monte uma história, um conceito e ganhe credibilidade, muitos vão acabar indo na onda. Muita gente acha que o café da Starbucks é bom porque eles carregaram isso na sua história. Mas a gente não pode descuidar da qualidade do café, porque os formadores de opinião são as pessoas que levam a nossa marca. Então, temos um cardápio de cafés autorais. A maioria das pessoas prefere uma bebida mais adocicada, e mesmo que o cliente fique sabendo, de um formador de opinião, que temos um bom café, ele pede um flat caramelo. No Brasil, 70% do que vendemos são cafés açucarados, bebidas de assinatura que têm caramelo, vanilla. Na Europa, o pessoal não gosta de açúcar. O cardápio é parecido, e o que muda é a proporção: vendemos mais bebidas puristas do que açucaradas. A gente também acredita no design dos produtos e das lojas para atrair pessoas e consolidar a marca.
E: Design e tecnologia foram duas bandeiras de vocês para este ponto de varejo de café. Por que vocês pensaram nesses dois quesitos? Quanto à tecnologia, ela é usada para monitoramento de métricas e dados ou apenas para atender o consumidor?
C: Design e tecnologia estão no nosso DNA. Meu irmão Luis é designer, e a parte tecnológica veio da minha experiência com uma startup de tecnologia e da minha formação em administração. Achei que ela nos ajudaria a monitorar toda a rede, ainda mais por termos franquias. Usamos a tecnologia para tudo. A gente está desenvolvendo, cada vez mais, um painel em que conseguimos monitorar todas as lojas. Por exemplo, se elas estão com os produtos ativos, quanto estão vendendo, que baristas estão trabalhando e quais são certificados, tudo “real time”, integrado.
E: Temos falado muito de sustentabilidade. E quando falamos de café, tratamos de origem, clima, ESG etc. Como a The Coffee trabalha sustentabilidade?
C: Olhamos muito para a cadeia do café. Temos feito um trabalho com um parceiro para comprar café verde. Por enquanto, eles estão presentes nas categorias Kraft e Black, mas queremos incluir a categoria White. Conhecemos pouco do funcionamento de uma fazenda, pois estamos do outro lado do balcão. E esse pessoal tem conhecimento, dedica-se à pegada de sustentabilidade, transparência e valorização do trabalho dos produtores. Além disso, as comidas que produzimos não têm corantes nem conservantes, usamos produtos naturais.
E: Qual é o maior sonho, seu e dos seus irmãos, e que conselho você daria para um empreendedor que está no início da jornada?
C: Em relação ao sonho, vamos continuar a construir a marca, e tentar levá-la para o mundo. Assim como a Starbucks foi a principal marca de café na segunda onda, queremos ser a principal marca da terceira onda, e globalmente. Quanto à dica para um empreendedor, eu diria que é persistência. Empreender não é fácil. Quem lê matérias sobre o assunto acha que é só sucesso, mas é paulada o tempo inteiro, o dia inteiro, de funcionário, franqueado, investidor, cliente. É bronca!
Texto originalmente publicado na edição #82 (dezembro, janeiro e fevereiro de 2024) da Revista Espresso. Para saber como assinar, clique aqui.
Deixe seu comentário