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Afinal, qual é o estoque dos EUA?
Por Gustavo Paiva
Há mais de dois anos, a National Green Coffee Association (Associação Nacional de Café Bruto dos Estados Unidos) eliminou uma ferramenta indispensável de informação para a cadeia produtiva.
Desde então, as estimativas de estoques norte-americanos mais confiáveis têm sido publicadas gratuitamente apenas pelo Departamento de Agricultura do país (a USDA) e mediante pagamento pela Associação Nacional de Café (NCA). Temos, também, as estatísticas da Intercontinental Exchange (ICE), que se referem apenas aos cafés registrados em armazéns certificados nos Estados Unidos e na Europa.
Em agosto, com o início das tarifas impostas pelo governo norte-americano ao Brasil e a outros países produtores, muito se especulou sobre a quantidade disponível de café para consumo imediato nos Estados Unidos, com algumas estimativas apontando para 60 dias de consumo.
Apesar do fim das tarifas, algumas perguntas ainda estão sem respostas: até quando os estoques atuais aguentam? A quem interessa a falta de informação sobre os estoques no maior mercado consumidor de café do mundo? E quais seriam as instituições com credibilidade suficiente para opinar sobre o tema?
Se a pergunta principal desta coluna, relativa à quantidade e ao prazo de alcance dos atuais estoques nos EUA parece ser inalcançável para a maioria das pessoas, nos resta a pergunta seguinte: a quem interessa o segredo? As instituições norte-americanas têm o direito de proteger os interesses da própria indústria, mas elas devem ser levadas a sério como fornecedoras de dados globais? Qual seria, portanto, a credibilidade de organizações que, agindo em conflito de interesse, se colocam como fornecedoras de estatísticas confiáveis?
Frequentemente, o desencontro de dados entre a Companhia Nacional de Abastecimento (Conab) e o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) é apontado como prova da incapacidade de as instituições brasileiras fornecerem ao mundo dados da produção nacional. Além, é claro, de frequentes acusações de conflito de interesses em relação à própria indústria nacional.
Interessante lembrar que estas acusações são frequentemente feitas por atores que buscam questionar o profissionalismo e a metodologia das organizações brasileiras. Além de suporem, ainda, um conflito de interesses das nossas instituições, que teriam a intenção de pressionar os preços para cima e beneficiar os produtores nacionais.
O que vemos, portanto, é o tradicional cabo de guerra de informações com acusações, possíveis erros metodológicos e a suposta falta de credibilidade de organizações nacionais em fornecerem dados concretos de produção. Cabe a reflexão: as acusações feitas às nossas instituições não poderiam ser igualmente aplicadas a instituições similares em países consumidores?
A liberdade de informação, de comércio e de opinião é um dos pilares da sociedade norte-americana, e existe desde a independência do país (em 1776). Porém, não há liberdade que resista à tentação do protecionismo, cabendo aos agentes de mercado nos países produtores atenção à hipocrisia e à demagogia daqueles que não têm, e nunca tiveram, interesse na prosperidade da cadeia como um todo.







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