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Baristas na estrada: a importância da interação entre profissionais pelo Brasil
A troca de conhecimento entre profissionais com diferentes graus de experiência e o contato com perfis variados de público são fundamentais para a qualificação do barista. Para os que estão em busca de aprimorar suas técnicas e expandir o aprendizado, o café converte-se em passaporte para descobrir a diversidade da cena pelo Brasil e entender os desafios que o mercado ainda enfrenta.
O mineiro Felipe Brazza, barista e mestre de torra do Café das Amoras, lembra que os primeiros passos no mundo do café especial, em 2012, já o fizeram sair de Belo Horizonte (MG) em busca de informações em outras cidades, como São Paulo e Curitiba.
Desde então agregou o conceito de escola à sua torrefação e percorre o País levando na bagagem grãos da Serra da Mantiqueira e um pouco da cultura gastronômica de Minas Gerais. Em 2016 realizou o primeiro encontro de cafés especiais do Macapá (AP), que incluiu consultoria a cinco cafeterias e eventos para o público. “Até então as pessoas daquele lugar não conheciam café especial. A ideia era preparar as cafeterias, treinar os baristas e fomentar o público local”, afirma.
O curitibano Daniel Munari, barista e mestre de torra do Royalty Quality Coffee, explica que os baristas ganham visibilidade diferente quando convidados a ministrar cursos em outros estados. “Existe certa valorização do profissional quando ele é de fora. Se eu trago alguém de Florianópolis a Curitiba, essa pessoa vai ter uma notoriedade diferente”, destaca.
O intercâmbio também é positivo para as cafeterias que promovem os encontros, completa Brazza: “Quando você traz um profissional diferente, acaba tendo acesso a outro público, que não necessariamente o da cafeteria”.
Transmitir informação
Para a barista Analice Pereira, de Manaus (AM), a iniciativa de promover cursos com profissionais de outros locais veio da necessidade de difundir informação e, assim, formar público para a cafeteria Como em Casa. O local foi inaugurado em 2015 e pouco se sabia sobre café especial na região.
“Em cada profissional vemos um nível de maturação diferente do mercado. Nos grandes centros, como Belo Horizonte, São Paulo e Curitiba, a gente percebe um mercado que já tem dinâmica própria e não precisa de estímulo constante, como analisamos, principalmente, na região Norte e em algumas cidades do Nordeste”, aponta a barista.
Renan Dantas, de São Paulo, foi além e transformou a troca de conhecimentos em uma verdadeira jornada. Deixou o posto de instrutor em cafeteria para dedicar-se a um empreendimento pessoal, a Oficina do Barista. A ideia era passar uma semana em cada estado ministrando cursos e cuppings, e, assim, alcançar lugares que muitas vezes nunca tinham recebido esse tipo de evento.
Com foco na acessibilidade, ele elaborou o mesmo programa de aulas para todos os locais, cobrando os mesmos valores. Um dos maiores desafios, conta, foi adaptar a didática de forma a aproximar o tema do café especial das realidades locais. “Em São Luís do Maranhão a gente abriu um cupping e vieram três pessoas no primeiro dia”, lembra. “No outro dia, parei para pensar e troquei ‘cupping‘ por ‘degustação de cafés’. Realizamos o curso com 35 pessoas. Fiquei muito feliz, porque apenas uma adaptação de linguagem fez a diferença”.
De volta a São Paulo, Renan planeja expandir o projeto por meio de viagens por demanda e uma plataforma de conteúdos para agregar baristas de todo o Brasil. “Hoje vejo quanta oportunidade existe para todo mundo. O mercado está aberto a todos, para aprender, ministrar aulas, torrar café, encontrar produtor. Existem profissionais excelentes em todo o Brasil”, reflete.
Parceria em competições
Além de cursos e oficinas, grandes eventos como a Semana Internacional do Café (SIC) e Campeonatos de Barismo, são espaços importantes de interação. O aprendizado compartilhado já começa na fase de treinamento para as competições.
Na preparação para o Brewers Cup, de 2018, Analice Pereira contou com a ajuda de Emerson Nascimento, do Coffee Five (cafeteria localizada no Rio de Janeiro) ‒ ele compete desde o início da carreira, há treze anos. “Foi muito importante para passar mais segurança para quem nunca tinha participado de campeonato. Nossos resultados foram muito bons”, pontua Analice, que conquistou o segundo lugar naquele ano.
Sobre a experiência nos treinos, Emerson ressalta que o processo de aprimoramento é mútuo. “Durante muito tempo fui de treinar sozinho e ir para o tudo ou nada na competição. Isso me fez ter muita dificuldade didática, eu esquecia o que ia falar, não tinha um workflow limpo”, explica.
Daniel Munari, de Curitiba, reforça a importância de encontros como a 2ª Copa São Paulo Hario V60 – da qual participou como juiz –, que permite encurtar a distância entre as diferentes escolas de barismo que existem no Brasil. “Foi algo muito ecumênico”, explica sobre a competição.
“Poder provar o café de um colega que mora a centenas de quilômetros e conversar com ele sobre aquela receita é mais uma prova de como o café pode unir a gente, e como podemos criar uma escola com identidade brasileira”, conclui Daniel.
(Texto originalmente publicado na edição impressa da Revista Espresso referente aos meses março, abril e maio de 2020– única publicação brasileira especializada em café. Receba em casa. Para saber como assinar, clique aqui).
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