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Fermentação do café: saiba mais sobre a técnica em destaque no mercado
Fermentar café é um processo que gosto muito e já faz alguns anos que pratico. Podemos ter a fermentação negativa e a positiva, a qual irei explicar neste artigo. Para muitos produtores isto pode significar um risco demais na qualidade, para outros uma aventura em buscar diferentes aromas e sabores.
Muitos produtores me perguntam se vale a pena fazer fermentação. Sempre brinco e respondo: é um processo que fica entre o céu e o inferno. Temos que saber onde estamos e onde queremos chegar. Podemos ter bebidas extraordinárias e bebidas negativas com uma fermentação.
Mas vamos lá, o mercado está crescendo em busca dessa nova experiência sensorial que a fermentação oferece e o produtor correndo atrás das técnicas para conseguir entregar seu melhor produto.
Dentre os processos de fermentações estão as anaeróbicas (obtenção de energia sem a utilização do oxigênio) e as fermentações aeróbicas (com a utilização do oxigênio). Para mim, ela é uma tecnologia e ferramenta de trabalho. A fermentação ajuda a melhorar as bebidas das regiões com altitudes mais baixas, lavouras contra face, e também auxilia o produtor que deseja obter uma nota mais alta em seu lote.
Sabemos que a bebida de um café fermentado é muito parecida com a do vinho, porém a fermentação do vinho já existe há muitos anos e, com a levedura certa, a probabilidade de acerto é de 80%. Já a do café, estamos aprendendo no dia a dia, tanto nas fermentações selvagens em monte, em bombonas ou em tanques, com leveduras, com frutas ou especiarias. Isso tudo estamos aprendendo com especulações.
Existem estudos e pesquisas sendo feitas para tentar criar uma receita. Minha opinião é que elas deveriam ser criadas e desenvolvidas em nosso país e aplicadas aqui, pois temos realidades e características únicas. Alguns produtores já querem receita para o monitoramento e o controle de uma fermentação, e acredito que vai levar muito tempo para ser criada uma receita, pois existem diversas variáveis, entre clima, microclima, controle pluviométrico, biota, além da nutrição da planta.
A natureza é muito dinâmica e isso fica impresso na qualidade. Cada variedade de café possui uma personalidade. Lembrando que muitos terroirs já possuem perfil sensorial frutado. Não é que com uma fermentação você vá ganhar esse perfil. Por outro lado, um mesmo café pode apresentar resultados completamente diferentes quando preparado por duas pessoas distintas. Podem ter seguido as mesmas regras, mas o resultado não será o mesmo.
Minha orientação é: cada produtor, de acordo com a sua realidade, pode criar um histórico com os dados obtidos por tempo, temperatura, brix, umidade, ponto de maturação, entre outros. Isso para conhecer a estrutura da sua semente e, dessa forma, tentar fazer com que no ano seguinte chegue a um resultado próximo do conquistado anteriormente.
O ideal em uma fermentação é que se tenha uma maior quantidade de grãos maduros. Outra coisa é saber o histórico de bebida da sua lavoura. Se seu histórico de pontuação é de 78 a 83, sugiro fazer um lote de teste, mas se você tem um histórico de café natural ou cereja descascado com pontuações entre 84 a 88 pontos, jamais faça uma fermentação, você já possui um excelente produto, as vezes só necessita de mais atenção no pós-colheita.
Uma das fermentações naturais que passam despercebidas pelo produtor é aquela que vem da própria lavoura de muitos grãos maduros e passas, quando observados já estão com um melado na casca. Caso tenha identificado essa característica, separe esse lote, pois ele tem grande potencial.
Sabemos que o processo de fermentação faz com que muitas células da semente sejam destruídas, eu a apelidei de semente sofrida. Constatei que existem fermentações em que o potencial de bebida se mantém por 60 dias e outras por 6 meses, além dela sofrer variações, mas quando a semente sofre uma agressão por meio do tempo e temperatura, ou por um longo período mergulhada em uma solução, ela pode entrar mais rapidamente em processo de senescência (“velhice”) em até 30 dias.
Fermentação por acaso
Quem já ouviu falar naquele café que foi esquecido na sacaria no meio da lavoura, ou que ficou de um dia para o outro dentro da carreta, ou amontoado na moega, ou tomou uma chuva no terreiro, muita das vezes achamos que estava tudo perdido, mas ao provar o lote vem a surpresa, um resultado inesperado diante de tantos ocorridos: o café apresentou resultado positivo! Isso já aconteceu comigo e com outros amigos, e já vi lotes assim serem finalistas de concursos. Mas isso é um acaso, pois na maioria das vezes a probabilidade de erro é de 90%.
Fermentação negativa
Dificilmente cafés que sofreram esse tipo de fermentação irão apresentar bebida riada ou rio. Geralmente apresentam bebidas com características alcoólicas, azedas, ranças, sabor vegetal e até amendoadas. Já cafés com bebidas riado ou rio podem vir de lavouras problemáticas, boias ruins, água do lavador muito suja, abafamento com lonas, contaminações, entre outros.
Fermentação positiva
Com esse processo de fermentação fazemos a quebra da cadeia de amido, selagem de aromas e sabores nos ácidos, elevamos a licorosidade, a fragrância, aromas doces e florais. Deixamos a bebida com finalizações exóticas e únicas.
Contudo, dentro do cenário da cafeicultura, o processo que está se destacando são os de cafés fermentados, gosto de chamá-los de: os novos frutados. Um processo que vem ganhando espaço e que este ano terá uma grande quantidade de microlotes com os novos frutados. Isso vem de encontro com cafeterias diferenciadas, um novo consumidor, um público mais jovem, que não possui o leque sensorial do passado, e que está disposto a ter experiências com essas novas bebidas exóticas e provocativas.
Uma dica: em uma fermentação nunca adicione produtos químicos, lembrando que café é um alimento. O ideal é que o primeiro consumidor do seu café seja sua família e depois o seu cliente!
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