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União entre baristas e produtores
Você já deve ter ouvido falar que os países são classificados como “produtores” ou “consumidores” de café especial. Desse modo, existem aqueles com condições geográficas e climáticas adequadas para o cultivo da planta, assim como Brasil, Colômbia, Etiópia, Quênia – os “produtores” –, e países que precisam importar os grãos, os “consumidores”. Particularmente, como barista brasileira, acredito que essa distinção não seja tão simples. Segundo pesquisa realizada pela Associação Brasileira de Cafés Especiais (BSCA), o consumo de cafés especiais no Brasil cresceu 15% em 2017, e tende a aumentar ainda mais nos próximos anos*. Assim, nós brasileiros, estamos em uma situação privilegiada: vivemos lado a lado com a produção de café e também consumimos café de qualidade.
Quem começa a se especializar em café especial, seja barista, provador, ou ainda um consumidor entusiasta, logo ouve falar das nossas regiões produtoras, dos nomes das variedades mais comuns, dos processos de fermentação e secagem mais praticados. E a melhor parte: podemos fazer visitas e acompanhar tudo isso de perto.
Em minha vivência no Lucca Cafés Especiais, em Curitiba (PR), tive contato com produtores de cafés de várias regiões, já que compramos os grãos verdes direto das fazendas, torramos e os comercializamos. Em 2015 passei a viajar mais e conhecer pouco a pouco os processos de que sempre falamos nos cursos de barista. Foi nessa época que conheci a Fazenda Rio Brilhante, que fica na região do Cerrado Mineiro, a mais de mil quilômetros de casa. Lá encontrei uma empresa jovem, que, assim como eu, havia apenas começado a trabalhar com café especial. Ano a ano, a evolução na qualidade dos cafés e a nossa amizade aumentavam.
Em 2017 me adotaram como barista da fazenda, mas não do jeito que todo mundo imagina. Ali nasceu uma parceria entre fazenda e barista, em que cada um contribuiu para o outro crescer e ir além. Pude aprender, cada vez mais, sobre o cultivo de café, processamentos e novos experimentos de fermentação. Eles me apoiaram muito na preparação para o campeonato de Brewer’s Cup, em 2018.
Em troca desse conhecimento, eu transmitia à fazenda tudo o que já tinha vivenciado no contato com os consumidores, como os perfis de sabor mais apreciados e pedidos no Lucca, preparo e cultura das cafeterias, algo muito importante para a comercialização de café verde.
Esse é só um exemplo do que pode acontecer quando as duas pontas da cadeia se unem e andam juntas, lado a lado. Hoje vemos cafeicultores participando de campeonatos de barista, torrefadores ajudando na colheita de café, e também eventos nacionais que reúnem vários participantes do mercado de cafés especiais, como a Semana Internacional do Café.
Minha experiência não apenas me abriu os olhos para entender mais sobre o que acontece com o café até ele chegar à xícara, como contribuiu um pouquinho para fortalecer a indústria e o consumo brasileiro da bebida de qualidade, e acredito que, quanto mais troca de informações existir entre todos os elos da cadeia, maior será a contribuição para o crescimento do mercado interno de cafés especiais.
*Camila Franco é treinadora e barista. Foi campeã de Brewers Cup em 2017 e é SCA Trainer (AST). Fale com o colunista pelo e-mail colunacafe@cafeeditora.com.br
(Texto originalmente publicado na edição impressa da Revista Espresso referente aos meses março, abril e maio de 2019 – única publicação brasileira especializada em café. Receba em casa. Para saber como assinar, clique aqui).
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