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Fórum Mundial de Produtores de Café é palco de debates difíceis sobre o futuro da cafeicultura

Realizado entre os dias 10 e 11 de julho, em Campinas (SP), no Royal Palm Plaza, o evento bianual chegou à segunda edição com muitos desafios. Depois de ser lançado na Colômbia, organizado pela Federação de Cafeicultores daquele país, o Fórum Mundial de Produtores de Café veio ao Brasil com a intenção de debater os principais desafios da cafeicultura mundial. Em um momento em que o preço do café está muito baixo, este foi o principal tema nos corredores e nas palestras. Com realidades bem distintas entre as 25 milhões de famílias que cultivam café ao redor do mundo, no chamado cinturão cafeeiro, as soluções não poderiam ser genéricas.

Por isso a missão dada ao economista Jeffrey Sachs, Diretor do Centro de Desenvolvimento Sustentável do Instituto de la Tierra da Universidade de Columbia, era bem desafiadora: criar proposições para melhorar os rendimentos dos pequenos produtores de café através de uma análise econômica e política. A conclusão dada pelo consultor foi de que “os preços de café atuais não estão distantes do equilíbrio entre oferta-demanda de longo prazo”. Sua análise foi baseada no crescimento de Brasil e Vietnã, que tiveram juntos 83% de aumento de produtividade desde 1995 enquanto outras regiões estagnaram em produtividade.

Jeffrey Sachs, Diretor do Centro de Desenvolvimento Sustentável do Instituto de la Tierra da Universidade de Columbia

Com as mudanças climáticas e o aquecimento global de 0,3 graus em dez anos, Sachs prevê que “se houver um aumento de temperatura de 2 graus celsius até 2050 será impossível produzir café. Se isso acontecer, grandes áreas serão prejudicadas. Colômbia, Índia, Malásia, Costa Rica, Madagascar e Tailândia serão os países mais afetados com a crise climática”. E chegamos ao ponto crucial da proposta de Sachs: “Quem tiver capital para fazer essa transformação é quem vai conseguir mudar. Se o aquecimento global continuar, muitos países sairão da produção.”

O grande momento esperado da apresentação de Sachs eram as soluções para a melhoria de rendimento de produtores. Eis que a proposta do consultor foi inesperada pela maioria: a sugestão de criar um Fundo Global do Café, que seria co-financiado por empresas privadas e públicas em busca de cumprir, em todas as áreas produtivas de café, com as metas da Agenda 2030 da Organização das Nações Unidas (ONU) assinadas pelos países membros que indicam os 17 principais objetivos de Desenvolvimento Sustentável no mundo. O financiamento preliminar necessário, na proposta dele, seria de 10 bilhões de dólares anuais que viriam de investimentos privados e também de doações. Mais do que a criação de um Fundo, o consultor indicou que a solução será coletiva e que é preciso envolver todo o setor “governo de quem produz, governo de quem consome, produtores, torrefações, indústria e consumidores. O setor precisa resolver não de forma competitiva, mas juntos para a melhoria da indústria do café em todo o mundo. A grande questão é como fazer isso.”

Jeffrey Sachs, Diretor do Centro de Desenvolvimento Sustentável do Instituto de la Tierra da Universidade de Columbia

A proposta agora será discutida pelas principais entidades do setor, mas, já nas conversas nos intervalos com os representantes de entidades presentes, a solução foi vista com cautela, por se tratar, na opinião de muitos, de um fundo de difícil gestão e organização. Na coletiva de imprensa, Sachs ainda mencionou a importância e responsabilidade do Brasil com o aquecimento global, por ter a Amazônia em seu território, mas também o petróleo, o que, na visão dele, acaba por tornar a preservação bem desafiadora.

Durante o período da tarde, três painéis abordaram diferentes pontos do setor: “O mercado como instrumento de proteção à renda de produtores”, “Formulação de preço do café: transparência da semente à xícara” e “Promover e aumentar o consumo”.

Com representantes de empresas e entidades do setor, os painéis trouxeram dados relevantes e cases de sucesso no Brasil e no mundo. Foi possível perceber como diversas iniciativas pelos países traçam o caminho de valorizar o produto café, através de programas educativos, sustentáveis e de agregação de valor. Dentre os cases, foi apresentado por Anna Illy, proprietária da illycaffè, as iniciativas da torrefação italiana na relação direta com o produtor, assim como da Nespresso, com Guilherme Amado, gerente de café verde da marca, e também a empresa brasileira do Grupo 3 Corações, que trouxe o case do Florada Premiada, iniciativa com mulheres produtoras, coordenada por Patrícia Carvalho, gerente de cafés especiais.

Anna Illy, proprietária da illycaffè

No último painel, o conteúdo foi bem relevante com a demonstração de iniciativas em diferentes países para incentivar o consumo de café: Indonésia, Estados Unidos, Brasil e países da África. A mediação de Carlos Brando, da P&A Marketing Internacional, trouxe para o debate a importância de “ser multifacetado quando se fala em aumento de consumo de café pois há iniciativas para serem realizadas desde a classe mais baixa até a classe alta, todas consumidoras de café”. Moenardji Soedarg, da Indonésia, apresentou desde as simples “Starbikes” que existem em seu país, que são bicicletas na rua que vendem cafés até cafeterias mais sofisticadas, demonstrando que é possível atender a diversos públicos com diferentes rendas e propostas.

Phyllis Johnson, presidente da BD Imports, nos Estados Unidos, trouxe a importância de remunerar bem ao produtor “Pagamos caro por nosso café, então por que os produtores não estão sendo devidamente remunerados?”, questionou a americana em sua apresentação. Ela afirmou que, durante os últimos oitos anos, o consumo de café nos Estados Unidos se manteve regular, mas as pessoas estão começando a escolher melhor o tipo de café que querem beber. Ou seja: embora o café no país não esteja crescendo em volume, está crescendo em valor.

Phyllis Johnson, presidente da BD Imports

Nathan Herszkowicz, em sua despedida como diretor-executivo da Associação Brasileira da Indústria de Café (ABIC), trouxe um panorama sobre as razões do consumo de café no Brasil, que conta com 21 milhões de sacas de café, representando 40% da produção nacional, com 4,8% de crescimento de um ano para o outro. Números que mostram a evolução deste consumo e a qualidade dos grãos.

Nathan Herszkowicz, presidente executivo do Sindicafé

Diferentes realidades que nos leva a pensar o quão complexo é o mercado de café. Um produto com diferentes estruturas desde a produção até o consumo, que permite oportunidades de unir as experiências para encontrar soluções para um mercado que só cresce e que tem em países asiáticos a grande aposta de aumento exponencial nos próximos anos. Mas que, para isso, é preciso ter uma remuneração adequada para quem produz, o que vem sendo o maior desafio.

TEXTO Por Mariana Proença, colaborou Natália Camoleze, de Campinas (SP) • FOTO Mariana Proença

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